LIBERDADE DE IMPRENSA E PROTEÇÃO À FONTE: “UM DIREITO BÁSICO, DE CARÁTER CONSTITUCIONAL, ABSOLUTAMENTE INDEVASSÁVEL”

Posted On Quinta, 25 Mai 2017 08:48
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Retirada de sigilo de gravações da delação da JBS mostra falta de cuidado da PGR e da Polícia Federal, afeta liberdade de imprensa e sigilo da fonte

 

Por Edson Rodrigues e Edvaldo Rodrigues

 

Por Edson Rodrigues – “A fonte é o maior tesouro de um jornalista. Quanto mais fontes, maior a credibilidade do profissional”.

 

Quando o decano ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF) interrompe seu cotidiano para declarar que o sigilo da fonte é “um direito básico, de caráter constitucional, absolutamente indevassável”, é porque alguma coisa grave aconteceu.

 

E, realmente, aconteceu.

 

Ao tirar o sigilo da delação da JBS, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, liberou mais quase três mil gravações – legais – realizadas nos dois meses de “ação controlada” em que Joesley Batista montou armadilhas para a alta cúpula do governo Federal. 

 

Diz a Lei, que todas as gravações que não se enquadram no contexto da ação, devem ser destruídas, mas, neste caso, não foi o que aconteceu e muita, mas muita coisa que não tinha nada a ver com a investigação, acabou nas mãos de todo mundo que quis acesso e, como era de se esperar, mão erradas pinçaram – entre quase três mil gravações, ressalte-se – um trecho que forçou a demissão de um jornalista de renome e colocou em xeque o direito de sigilo sobre a “fonte”, ou seja, o sigilo sobre quem revela informações a um determinado jornalista para que uma matéria investigativa seja concretizada.

 

Como dissemos acima, “a fonte é o maior tesouro de um jornalista. Quanto mais fontes, maior a credibilidade do profissional”. Sem fontes, um jornalista não tem sobre o quê escrever e, revelada uma fonte, todas as demais ficam na defensiva, desconfiadas e, consequentemente, a qualidade do jornalismo diminui.

 

Pois, nesta terça (23), o “site de notícias” "BuzzFeed" divulgou uma conversa entre o jornalista Reinaldo Azevedo e Andrea Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves (PSDB), diálogo, ressalte-se, sem qualquer indício de crime, que ficou disponível após a retirada de sigilo de todos os documentos da delação premiada da JBS.

 

A divulgação, porém, levou Azevedo a pedir demissão da revista e provocou protestos de outros jornalistas e da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Questionado sobre o episódio, quando chegava ao STF, o decano ministro do STF e uma das maiores autoridades jurídicas do País, Celso de Mello, citou julgamento da Segunda Turma do STF que reiterou a proteção ao sigilo da fonte: “a minha posição é de que o sigilo da fonte deveria ter uma garantia de ordem constitucional titularizada por qualquer profissional de imprensa e oponível a qualquer pessoa, inclusive às autoridades e ao poder público. É, portanto, um direito básico, de caráter constitucional, absolutamente indevassável”, afirmou o ministro.

 

Feita a lambança, o ministro Edson Fachin, relator da delação da JBS, mandou retirar do processo e pôr sob sigilo os áudios das interceptações telefônicas de investigados no caso, entre eles Aécio e Andrea Neves. Questionado sobre o caso antes da sessão de julgamentos dessa quarta, Fachin não quis se manifestar.

 

INSTITUIÇÕES PROTESTAM

Em nota divulgada nesta quarta, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, também criticou a disponibilização, lembrando que a lei também proíbe a divulgação de conversas de advogados com seus clientes.

 

“Se quebrarmos esse direito – o que vem sendo feito de maneira recorrente – estaremos mutilando de forma irreparável o direito de a sociedade ser informada. Não se pode combater o crime cometendo outro crime”, diz a nota.

 

Em nota, a ABI disse que “considera que a Procuradoria-Geral da República (PGR) violou o sigilo da fonte, assegurado pelo artigo 5º da Constituição Federal”.

 

A ABI acusa o procurador-geral Rodrigo Janot de praticar “intimidação e retaliações a jornalistas”. E diz que espera que “este episódio não se repita e que as investigações prossigam dentro do ordenamento jurídico do país”.

 

A PGR reagiu às críticas. Em nota, afirmou que “não divulgou, não transcreveu, não utilizou como pedido, nem juntou o referido diálogo aos autos”.

 

A PGR disse ainda que as referidas conversas, gravadas pela Polícia Federal (PF), “ainda não deram entrada na PGR, tendo entrada prevista para o dia 24 de maio” (esta quarta-feira).

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes criticou o que chamou de vazamento. Em nota, disse que “a lei 9296 é clara ao vedar uso de gravação que não esteja relacionada com o objeto da investigação”. Para ele, o vazamento da conversa do jornalista Reinaldo Azevedo “é um ataque à liberdade de imprensa e ao direito constitucional de sigilo da fonte”.

 

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, também em nota, disse que “o Supremo tem jurisprudência consolidada de respeitar integralmente o sigilo da fonte”. E que reitera o “seu firme compromisso, de lutar, e agora, como juíza, de garantir o integral respeito a esse direito constitucional”.

 

A PF divulgou nota, dizendo que fez as gravações por decisão judicial. Disse que “somente o juiz do caso pode decidir pela inutilização de áudios que não sejam de interesse da investigação”. A PF também disse que a PGR “teve acesso a todas as mídias produzidas, em sua integra”.

 

REPÚDIO

Não fossem as instituições, o Brasil, hoje, nesta quinta-feira, 25 de maio de 2017, não estaria “funcionando”, ante  à crise política e econômica que atravessa.  Quando todas as mais importantes instituições são unânimes em criticar uma ação, é porque essa ação foi totalmente desmedida.

 

Não podemos olhar e criticar apenas o mais grave, que foi um veículo de comunicação “achar” um áudio, divulgar e colocar xeque a credibilidade de um profissional – e do veículo em que trabalha.  Temos que observar, primeiro, a falta de cuidado da Procuradoria-Geral da República e da Polícia Federal em disponibilizar publicamente as gravações e propiciar essa situação.

 

Nós, de O Paralelo 13, agradecemos a Deus as fontes que tivemos a capacidade de criar – e conservar, o que é mais importante –, de esquerda, de direita, de centro e “do lado de fora” da política, e nos solidarizamos com o jornalista Reinaldo Azevedo, repudiando as duas ações. Primeiro a retirada de sigilo sem a destruição das gravações que não se referiam à delação da JBS e, depois, a atitude canalha do dito “site de notícias”, de divulgar uma conversa privada entre um jornalista e sua fonte, sejam eles quem sejam, e desestabilizar uma instituição, que o relacionamento jornalista/fonte.

 

Atentar, de forma intencional ou casual, contra a ação da imprensa séria, que toma todos os cuidados para agir pautada na verdade, é um atentado a todas as instituições que mantém de pé uma democracia.

 

Quando um veículo de comunicação age contra as regras da própria comunicação, é porque, no mínimo, não merece ser chamado de “veículo de comunicação”. 

 

Mas, e quando a própria Justiça, regada dos elogios mais rasgados por sua atuação na operação Lava Jato e na condução dos processos contra a corrupção no País, age com irresponsabilidade, como aconteceu no caso em questão?  A quem recorremos?

 

O Paralelo 13 vem, por meio deste editorial, garantir às suas fontes a mais completa segurança e compromisso de manter o sigilo necessário para que o povo tocantinense continue a par da verdade sobre o que acontece nos bastidores da política tocantinense, e se solidarizar com o jornalista Reinaldo Azevedo e com suas fontes.

 

Jornalismo se faz com verdade, não com oportunismo, muito menos com leviandade e falta de compromisso com o leitor.