PROIBIÇÃO DE FINANCIAMENTO EMPRESARIAL E FALTA DE FISCALIZAÇÃO CRIAM “CAIXA- DOIS SELETIVO” EM 2016

Posted On Terça, 12 Janeiro 2016 08:16
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Por Edson Rodrigues

 

A proibição de financiamento empresarial e a fixação de limites de gasto nas campanhas eleitorais, as eleições municipais de 2016 vão ocorrer num terreno incerto. Em tese - repetimos, em tese – os políticos utilizarão apenas os recursos do Fundo Partidário e aqueles provenientes de pessoas físicas.

O problema é que nessa equação, a conta não fecha.  Sem dinheiro, a cultura de gastos estratosféricos nas campanhas políticas tende a criar uma forma mais velada de caixa-dois.  O caixa-dois seletivo.  

No pleito de 2012, por exemplo, prefeitos e vereadores gastaram pouco mais de R$ 3,5 bilhões. Neste ano, os 32 partidos terão R$ 867 milhões, provenientes do fundo, para investir. Legalmente, só há uma saída: redução de gastos e campanhas mais modestas. Mas os políticos estariam dispostos? Há quem aposte todas as fichas no caixa-dois seletivo. Outros acreditam que o Brasil está dando o mais importante passo para cortar uma das principais raízes da corrupção: o financiamento privado.

 

ATUAIS GESTORES E O FIM DA REELEIÇÃO

Outro ingrediente cai como uma bomba nas eleições municipais deste ano.  Será a última vez que prefeitos poderão se reeleger.  Isso cria dois grupos de prefeitos com mandato:  os que trabalharam e têm crédito com a população de suas cidades e aqueles que nada fizeram, estão com a popularidade em baixa e teriam poucas chances de reeleição.

A questão é que os dois grupos de prefeitos têm em mãos a mesma ferramenta:  a máquina pública.  Sem os recursos que faltarão para fechar o caixa dos gastos na campanha, a máquina pública vira o principal “financiador de votos” das campanhas, o que transforma o próximo pleito em um dos mais perigosos de todos os tempos para as prefeituras, pois, no afã de se reelegerem, muitos gestores podem comprometer os orçamentos de suas cidades por anos e anos adiante.

 

FISCALIZAÇÃO:  UM PROBLEMA DA CRISE

Mas é nesse ponto, caros leitores, que o aquele problema do fim do financiamento empresarial às eleições vira, definitivamente, um abola de neve.  Sem recursos legais, apelando para o “caixa-dois seletivo” e colocando a máquina administrativa à serviço da coleta de votos, quem fiscalizará isso tudo para tentar coibir as fraudes?

A crise que assola o Brasil comprometeu os orçamentos de todos os órgãos que poderiam – e deveriam agir – na fiscalização do processo eleitoral.  Com menos recursos e menos material humano, a fiscalização, claro, será menos rigorosa.  E aí?  Quem vai fiscalizar o processo eleitoral municipal?

O Brasil tem mais de cinco mil municípios.  O Tocantins, 139.  Só aqui, serão mais de três mil candidatos a vereador e 300 candidatos à prefeito.  Como fiscalizar tantas possibilidades de corrupção?

Em matéria publicada na edição dominical, o Correio Braziliense tenta dar algumas idéias sobre o que pode acontecer.

O cientista político e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) acredita que os gastos das campanhas eleitorais não vão ser reduzidos. “Para mim é claro que tende a aumentar os recursos não contabilizados, o chamado caixa dois”, afirma. A conta dele é simples. O Fundo Partidário não cobre nem 15% dos gastos totais de uma campanha. Some-se a isso o descrédito da população, o que acarreta a baixa doação de pessoas físicas. “Mesmo o PT, que sempre foi historicamente o partido mais organizado em relação à militância, terá dificuldades de angariar doações dos seus militantes. O descrédito é muito grande”, atesta.

A aposta de cientistas políticos e magistrados ouvidos pelo Correio é de que o país viverá também o pleito mais judicializado da história da democracia brasileira por permitir que adversários, a qualquer sinal de gasto do opositor fora do padrão estabelecido, acionem a Justiça Eleitoral.

Um marqueteiro ouvido reservadamente pelo Correio, com mais de 15 anos de serviços prestados a vários partidos brasileiros, foi categórico ao dizer que o dinheiro aparecerá de qualquer forma porque não há como se mudar do dia para a noite uma cultura de campanha política no país. Ele acredita que os marqueteiros podem até baratear o seu “passe” diante do novo cenário, no entanto, há toda uma engrenagem por trás que não permite um custo muito baixo.

Questionado se as recentes operações, sobretudo a Lava-Jato, não funcionaria como um freio ético significativo para barrar o caixa dois, o professor Carlos Melo diz que é muito cedo para se mudar uma prática enraizada na política brasileira. “Isso pode ocorrer se tivermos uma continuidade de investigações e punições ao longo dos anos. Não se faz isso com uma única amostra de uma eleição. Para se falar em mudança cultural, precisamos antes de um esforço cultural grande que só se consolida com o passar do tempo. É precoce dizer que uma operação já é suficiente pra mudar esta realidade”, opina.

O jurista José Paulo Cavalcanti Filho acredita que o caixa dois será fortalecido nas eleições deste ano. “Alguém tem dúvida disso? Alguns já têm o dinheiro guardado. Já fizeram caixa. É ilusão achar que os candidatos não vão fazer uma campanha milionária. Na prática, não muda nada. Os orçamentos apresentados à Justiça Eleitoral sempre foram uma peça de ficção. Todo mundo sabe. Agora, tudo será diferente?”, questiona.

Pelas novas regras, os candidatos não podem mais receber doações diretamente. Os recursos terão que ser repassados aos partidos. As legendas se encarregam de estabelecer critérios para a distribuição dos recursos. A legislação só permite que pessoas físicas doem até 10% da renda bruta do ano anterior. Em julho, o Tribunal Superior Eleitoral vai definir o limite oficial de gastos. No primeiro turno da eleição de prefeito, foi convencionado que o teto será 70% do valor da campanha mais cara onde o pleito terminou no primeiro turno e 50% do gasto total onde houve segundo turno.

No Tocantins, a participação do governador Marcelo Miranda poderá ser crucial para salvar candidaturas e recandidaturas moribundas, já que, com a pouca verba disponível, aumenta a importância de um bom relacionamento com o governo estadual e o poder da “caneta”, na liberação de convênios e nomeações de lideranças que podem trazer votos aos candidatos ungidos.

Tudo feito na legalidade e nos parâmetros definidos pela nova lei eleitoral, mas, sem dúvida, uma vantagem que não estará disponível para todos.

Certamente, uma história a ser acompanhada de perto pela opinião pública.

 Porto Nacional, janeiro de 2016.  Artigo 0007