Brics querem ser contraponto ao Ocidente, expandir, mas sem dividir poder com novos membros

Posted On Sexta, 25 Agosto 2023 04:44
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 Líderes dos países do Brics posam para foto oficial em Joanesburgo Líderes dos países do Brics posam para foto oficial em Joanesburgo

Grupo ganhou importância geopolítica em meio às tensões entre China e EUA e à guerra na Ucrânia. Em relação ao tamanho econômico, Brasil tem uma influência desproporcional – mas a China é quem manda no grêmio.Fazia tempo que um encontro do Brics não chamava tanta atenção quanto este 15º, transcorrido esta semana em Joanesburgo. Representantes de 40 países compareceram, segundo os relatos: além dos cinco membros – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –, dezenas de outros que aspiram a ingressar. E ainda os países africanos convidados pelo anfitrião.

 

Por Alexander Busch*

 

A atenção dispensada deve-se sobretudo ao fato de o Brics, sob a liderança – daria para dizer também a pressão – da China, estar se transformando cada vez mais num fórum antiocidental. Se depender de Pequim, o Brics deverá se tornar um fórum institucional antagônico ao G7, dominado pelas democracias ocidentais.

 

Diante das tensões geopolíticas entre a China e os Estados Unidos, mas também do ataque da Rússia à Ucrânia, é importante para a Europa e para os Estados Unidos observar como o Sul Global se posiciona no Brics.

 

Pois o grupo dos países do Brics está diante de uma nova fase de desenvolvimento. Eles são cada vez menos o clube dos países de crescimento econômico acelerado. É verdade que o percentual do grupo no PIB mundial passou de 8% para 26% desde 2001, quando o banco de investimento Goldman Sachs criou a sigla – então ainda BRIC, sem o S da África do Sul – para um fundo de investimento.

 

Só que esse sucesso econômico se deveu sobretudo à China, que produz hoje mais do que as quatro outras economias da sigla somadas.

 

Se Brasil, Rússia e África do Sul cresceram, em média, menos de 1% nos últimos dez anos, China e Índia cresceram em média 6% ao ano.

 

Assim, o novo tema que une os países do Brics é a transformação global: os governos do grupo exigem nada menos do que uma nova ordem global num mundo "pós-ocidental".

 

É essa nova narrativa que une esse grupo heterogêneo: a China, como potência global emergente, quer reunir o maior número possível de países em torno de si para criar um polo antagônico aos Estados Unidos. A Rússia pode, com o Brics, contornar seu isolamento internacional depois do seu ataque à Ucrânia. Já para a Índia, o Brasil e a África do Sul – e também para outros países interessados – o formato oferece a possibilidade de se apresentar como neutro num mundo geopoliticamente dividido.

 

Mesmo assim, os demais países-membros, exceto a isolada Rússia, não fazem automaticamente causa comum com a China. Eles são globalmente conectados, tanto política como economicamente, e não querem nem arriscar suas relações com o Ocidente nem trocar estas por uma dependência da China.

 

Por isso esses três países se opuseram, em Joanesburgo, à admissão de novos membros. Concordaram apenas em estabelecer diretrizes e princípios para a expansão do bloco. Com isso, esses três países ganham tempo para tentar controlar o processo. Um grupo maior reduziria a importância política deles.

 

Pois, na verdade, no Brics, sobretudo Brasil e África do Sul estão jogando numa liga muito elevada se for levado em conta o tamanho das economias. Se países ricos, como a Arábia Saudita, ou grandes, como a Indonésia, forem aceitos, então os dois países-membros menores claramente perderiam influência.

 

Também por isso novos membros deverão ser aceitos apenas com direito restrito de voto no Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), como é chamado o banco de desenvolvimento do Brics.

 

Mas a China conseguiu o que queria: Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Argentina vão aderir ao grupo a partir do início de 2024.

 

Assim, a China mostrou que é quem manda no Brics. Conclusão: o Sul Global também terá de se habituar ao fato de que, entre eles, uma potência mundial é quem dá as cartas.

 

*Há mais de 30 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.