Fontes no Supremo não descartam que o ministro Celso de Mello autorize a Polícia Federal a cumprir mandados de busca e apreensão na sede do Executivo
Diego Escosteguy e da Redação
Após surgirem mais informações de que o Planalto destruiu o vídeo da reunião ministerial citada por Sergio Moro e sobrevir a constrangedora marcha do presidente Jair Bolsonaro ao Supremo, num “nítido ato intimidatório”, o ministro Celso de Mello resolveu ignorar os pedidos de reconsideração da Advocacia-Geral da União. Aguarda a entrega da cópia integral da gravação no prazo de 72 horas, originalmente estabelecido na noite de terça. A Presidência tem, portanto, até o final desta sexta para enviar o vídeo – completo, ressalte-se mais uma vez – ao decano.
Se Bolsonaro descumprir esse prazo, estará sujeito ao crime de desobediência judicial e à possibilidade concreta de ser alvo de medidas cautelares, como busca e apreensão no Planalto e mesmo prisão preventiva dos responsáveis pela gravação.
O ministro, assim, recusa-se a jogar o jogo de Bolsonaro. Põe pressão no presidente ao mesmo tempo que o presidente põe pressão no Supremo. Bolsonaro não só protagonizou um ato desrespeitoso e de afronta institucional ao tribunal, como quase todos os ministros avaliam, como, em seguida, disse à imprensa que a corte “tem parte de responsabilidade nisso aí”, numa referência à desastrosa gestão governamental do combate à pandemia. Ao mesmo tempo, seguiam os vazamentos na imprensa de que o governo, “por acidente”, teria perdido uma gravação que o próprio presidente disse que estava sendo legendada para divulgação ao público.
Diante desse contexto, o ministro, que estava pronto para decidir acerca do primeiro pedido da AGU, resolveu ignorar também o segundo, ontem. No primeiro, a AGU apenas pedia que o ministro reconsiderasse a entrega do vídeo, por conter possivelmente “assuntos sensíveis”. No segundo, pediu para entregar somente os trechos da gravação que tenham pertinência à investigação – ou seja, o próprio investigado definiria o que entregar. A defesa de Moro pediu, ato contínuo, que o vídeo fosse entregue na íntegra.
Celso de Mello analisará os três pedidos somente quando receber a íntegra da gravação. Assim, a decisão será apenas acerca da publicidade integral do vídeo ou não. O ministro, ao ver tudo que foi dito na reunião, pode acolher o sigilo de alguma parte que, de fato, em sua avaliação, contenha assuntos reservados e de Segurança Nacional. Em face das circunstâncias e da gravidade do inquérito, assim como da decisão já tomada de tocar essa investigação à luz do sol, é preciso haver elementos fortes na gravação para impedir sua divulgação e análise pela PGR e PF. Falas constrangedoras não contam como “assuntos sensíveis”.
Numa situação relativamente normal, presumiria-se que, diante dos pedidos feitos pela AGU, a íntegra da gravação existe. Mas não se enxerga qualquer boa-fé do presidente na lida com o Supremo – ainda mais em face de um inquérito no qual ele é formalmente investigado. O que havia de dúvida esvaiu-se com a pantomima da marcha ao vivo de Bolsonaro com empresários à Presidência do tribunal.
O ministro não descarta, portanto, que a gravação tenha sido destruída e que a AGU esteja, obliquamente, escondendo esse fato. Somente a entrega da íntegra do vídeo pode esclarecer tudo e permitir a Celso tomar uma decisão restrita à extensão da publicidade a ser conferida à gravação.
Batendo na porta
A Presidência tem até o fim desta sexta-feira (8/5) para cumprir a determinação do ministro Celso de Mello e entregar a íntegra do vídeo gravado durante a reunião do dia 22 de abril, no Palácio do Planalto. Dois pedidos da Advocacia Geral da União (AGU) tentam suspender a entrega do material ou enviar à Corte um vídeo editado.
De acordo com uma fonte no Supremo, a decisão de momento do magistrado é ignorar esses pedidos e deixar o prazo vencer. Caso a AGU não envie o vídeo, Celso de Mello pode solicitar que a Polícia Federal vá até o Planalto recolher o arquivo da gravação, se preciso, com a apreensão de computadores, pen drives e fitas de vídeo.
A operação seria realizada no arquivos da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), onde se avalia que está armazenado conteúdo que foi registrado para posterior divulgação, e por isso, não teria caráter de sigilo.
Existem dois pedidos para que o vídeo seja entregue na íntegra, um dos advogados do ex-ministro Sergio Moro e outro do advogado Ricardo Bretanha Schmidt.
Em depoimento, Moro detalha a pressão sofrida por mudanças na PF
As imagens se referem à reunião entre Moro, Bolsonaro e demais ministros do governo. No encontro, de acordo com o ex-ministro da Justiça, o presidente pediu acesso a relatórios de inteligência policial e exigiu a troca na superintendência da PF no Rio, ameaçando demitir Moro se a determinação não fosse cumprida.