O parlamentar se defendeu na Assembléia Legislativa de São Paulo das acusações de envolvimento com o PCC, recebeu apoio de aliados e não foi questionado nem pela oposição Luiz Moura (PT), esta no centro do furacão desde que participou de uma assembléia de motoristas e cobradores, em Itaquera, na zona leste da capital paulista, em que estavam presentes um assaltante de bancos condenado e, segundo a polícia, 13 integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) - facção que comanda o crime de dentro e fora dos presídios - o deputado estadual Luiz Moura (PT), sinaliza que se tiver que cair, cairá atirando. Essa greve foi um transtorno para os paulistanos, onde os sindicalistas haviam firmado acordo com patrões e motoristas não aceitaram o que foi acordado.
Embora ainda esteja imerso em um “inferno astral”, o deputado Luiz Moura (PT) pode se considerar um vencedor que sobreviveu às intempéries. Aos 43 anos, retirante nordestino quando ainda era bebê, natural de Batalha (AL), ele tinha tudo para engrossar as estatísticas de mortalidade infantil ou dos jovens e adolescentes que são mortos nos embates entre a polícia e criminalidade.
Preso quando ainda era menor por roubo a supermercados em Santa Catarina, no Paraná e no interior paulista, Moura foi condenado a 12 anos e três meses de reclusão, cumpriu um ano e meio, abandonou a vida de presidiário numa colônia penal paranaense, se reapresentou à Justiça, conseguiu a reabilitação como cidadão limpo e, entre 2003 e 2010, antes de entrar na política, tornou-se um homem rico e poderoso.
Seu patrimônio está longe dos R$ 5,1 milhões que declarou ao se eleger deputado estadual, em 2010, mas ainda assim, em valores de 2012 - quando saiu candidato a Prefeitura de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo - não é nada desprezível: é dono de linhas de ônibus, imóveis, postos de gasolina que, no total, chegam R$ 1,1 milhão, uma cifra defasada por não incluir a evolução patrimonial dos últimos dois anos.
Os R$ 4 milhões que desapareceram entre uma e outra declaração de renda para efeito de disputa eleitoral, segundo ele, eram fictícios, ou seja, constavam apenas em notas promissórias ou papéis, que deveriam ser (mas não foram) integralizados como capital numa empresa da qual era sócio, a Happy Play Tour.
“O dinheiro não existia, evaporou porque não havia lastro”, explicou o deputado ao iG, sem atualizar os valores que, segundo amigos, pode não chegar aos R$ 5,1 milhões estimados em 2010, mas passa da metade desse montante. Há detalhes marcantes na trajetória de Moura: ele não fez fortuna na política, não responde a nenhuma acusação de corrupção e, ao contrário do que é comum no atual modelo nada republicano - reprodutor de corrupção -, saiu do crime para entrar na política quando a moda é usar o poder para delinquir.
A trajetória do deputado começou mesmo em 2003, quando ele, como motorista, passou a operar como permissionário na Transcoooper, a cooperativa de transporte de Itaquera, na zona leste da capital paulista, e nem imaginava entrar na política. Dois anos depois é que começa a ser formada a aliança entre seu irmão, o vereador Senival Moura, o líder do clã, com os irmãos Tatto, o deputado estadual Enio Tatto e o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, para organizar o transporte nas regiões pobres e, ao mesmo tempo, erigir um grupo político que dominaria os colégios eleitorais das zonas sul e leste da capital. A ascensão dos Tatto e dos Moura se deu durante a gestão da então prefeita Marta Suplicy (2001 a 2005), ministra da Cultura.
O capital político seria revelado em 2012, quando as famílias Moura e Tatto garantiram a eleição de Fernando Haddad, o segundo “poste” criado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O segredo dos irmãos Moura na política segue uma estratégia simples: todos os recursos que se originam do trabalho e da política são reinvestidos nos mesmos setores, o que garante um esquema empresarial em contínua expansão - com linhas de ônibus e pessoal - e uma máquina de produção de votos azeitada. Ao contrário dos grupos que só se mexem às vésperas de cada eleição, os Tatto e os Moura estão sempre em atividade.
Católico, o deputado fez do seu passado criminoso um exemplo a não ser seguido e, peregrinando por instituições, passou a fazer palestras para ajudar outros jovens que, como ele, se desviaram pelo caminho das drogas e do crime. Em agosto de 2005, o juiz de Gaspar (SC) Sérgio Agenor de Aragão escreveu no despacho que Moura se regenerara, não havia mais registros de delito e poderia ser reabilitado porque demonstrara “bom comportamento tanto público como privado”.
Era um conceito oposto ao que a própria Justiça definira, em 1992, quando ele foi julgado, condenado e apontado como um jovem de personalidade periculosa e mal formada, “inclinada à prática de crimes contra o patrimônio”.
O personagem que mergulhou no crime e passou pelo caótico sistema penitenciário foi apagado. Nos anos seguintes, Moura buscou, efetivamente, o caminho da ressocialização e, voluntariamente, passou a fazer palestras em instituições - prática que ainda exerce nos intervalos entre o exercício do mandato e as aulas de direito em Mogi das Cruzes como quartanista -, além de bancar as despesas de educação e recreação de cinco mil crianças e adolescentes em Guaianazes e Itaquera, suas bases na zona leste.
A regeneração e o trabalho de assistência social foram os principais argumentos que garantiram, nessa quarta-feira (29), o apoio incondicional de toda a bancada do PT na Assembleia Legislativa e dos líderes do PTB e do PSD, respectivamente, Campos Machado e José Bittencourt. Os dois foram à tribuna para testemunhar que Moura, uma raridade num País marcado pela reincidência criminal, é um cidadão limpo e, como político, inocente das acusações de relação com o PCC, a facção que controla o crime de dentro das cadeias e lava parte do dinheiro sujo por meio de laranjas infiltrados no sistema de transporte da periferia da capital.
O deputado ganhou a primeira batalha política na quarta-feira. Falou abertamente sobre o passado criminoso, explicou que participou da reunião com perueiros em que, segundo a polícia, estariam integrantes do PCC, para defender os trabalhadores, e refugou as suspeitas de envolvimento com o crime organizado. Nenhum deputado do PSDB, que queria esfolá-lo para gerar desgaste ao PT, fez qualquer acusação sugerindo que estivesse mentindo.
Mas há ainda obstáculo pela frente. Ele terá de passar pela Comissão de Ética cujos membros se reúnem na próxima terça-feira para tomar uma decisão final. Até lá, por recomendação do partido, Luiz Moura se manterá em silêncio. Se permanecer com o mandato e a filiação no PT, o deputado ainda terá de enfrentar uma disputa interna antes da convenção que decidirá quais os nomes serão aprovados para disputar as vagas na Alesp e na Câmara dos Deputados.
Com informações do IG e da Redação