“Vamos devagar com o andor, que o santo é de barro.”
Por Edson Rodrigues e Edivaldo Rodrigues
O cenário político do Tocantins voltou a se incendiar. O afastamento do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos), determinado por unanimidade pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), completa, no próximo dia 3 de novembro, dois meses tempo suficiente para transformar o tabuleiro político do Estado e abrir uma disputa de bastidores que envolve Brasília, o Palácio Araguaia e a Assembleia Legislativa.
Nos corredores do poder, a palavra impeachment já não é mais um sussurro, mas um termo recorrente nas conversas reservadas. E o epicentro dessa tensão está nas mãos do presidente da Assembleia, deputado Amélio Cayres (Republicanos), a quem caberá decidir o destino de três pedidos de impeachment já protocolados contra o governador afastado.
AS ORIGENS DO AFASTAMENTO

Wanderlei Barbosa foi afastado em meio a uma investigação complexa, conduzida pela Polícia Federal, que apura supostos desvios de recursos públicos provenientes de emendas parlamentares impositivas destinadas à compra de cestas básicas durante o auge da pandemia da Covid-19. Os recursos, segundo o inquérito, teriam sido direcionados a prefeituras e entidades ligadas a aliados políticos, com suspeitas de superfaturamento e favorecimento.

O relator do caso no STJ, ministro Mário Campbell, entendeu que havia indícios suficientes para determinar o afastamento temporário do governador por 180 dias, argumentando que sua permanência no cargo poderia interferir nas investigações.
O processo tem mais de duas mil páginas e envolve 16 deputados estaduais, servidores e ex-auxiliares do governo. Três operações da Polícia Federal foram deflagradas ao longo das apurações uma delas com mandados de busca e apreensão na residência oficial do governador, em seu gabinete no Palácio Araguaia e em uma propriedade rural pertencente à família Barbosa.
Apesar do impacto político, a defesa do governador afastado sustenta que não há provas diretas que vinculem Wanderlei a atos ilícitos. “O nome dele aparece em menções, mas não em decisões. Não há assinaturas, autorizações ou ordens do governador em nenhum documento irregular”, diz um advogado ligado ao caso.
O CLIMA NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA

Desde o afastamento, a Assembleia Legislativa vive dias de incerteza e paralisia. Sessões são frequentemente suspensas por falta de quórum, e o ambiente entre os deputados mistura cautela e cálculo político. A tensão aumentou com a chegada dos pedidos de impeachment, todos endereçados ao presidente Amélio Cayres, que, por regimento, é o único com autoridade para decidir se dará andamento ou arquivará os requerimentos.
O regimento interno da Casa determina que, para que um pedido seja levado à deliberação, ele precisa ter pelo menos 16 assinaturas de parlamentares. Essa coleta de apoios se tornou a nova moeda política nos bastidores.
Fontes do Observatório Político afirmam que há três grupos distintos na Assembleia: Os que defendem o retorno de Wanderlei, acreditando que o afastamento foi precipitado e que ele deve reassumir o cargo para concluir o mandato; Os que pregam a neutralidade, aguardando uma definição do STJ e do STF antes de qualquer movimento. Os que desejam o impeachment, apostando que a crise abre espaço para reorganizar o poder no Estado, especialmente com vistas às eleições de 2026.

Amélio Cayres, experiente e discreto, tem mantido silêncio público sobre o assunto, mas internamente é visto como o fiel da balança. Sua decisão, de abrir ou não o processo será decisivo para o futuro político de Wanderlei Barbosa e para a estabilidade do governo interino de Laurez Moreira (PSD).
A ESTRATÉGIA DE BRASÍLIA
Enquanto o Tocantins ferve, Brasília se transformou no quartel-general de Wanderlei Barbosa. Instalado na capital federal, o governador afastado tem dedicado as últimas semanas a reuniões políticas e estratégicas com aliados e advogados.

Senadores Edaurdo Gomes e Dorinha Seabra
Fontes próximas ao governador relatam que ele conta com o apoio firme do senador Eduardo Gomes (PL), vice-presidente do Senado Federal, e da senadora Professora Dorinha (União Brasil), além de um grupo de juristas que tenta agilizar a tramitação do processo no STJ. A meta é levar o caso à Segunda Turma e obter uma decisão colegiada favorável ao seu retorno.
Nos bastidores, o grupo acredita que a pressão política contrária perdeu força, e que Wanderlei poderá reassumir o governo antes do fim do prazo de 180 dias. Contudo, há quem defenda uma estratégia mais cautelosa, que inclua a preparação de uma campanha ao Senado Federal em 2026, como alternativa para reconstruir sua trajetória política e preservar capital eleitoral.
A HIPÓTESE DA RENÚNCIA: DESCARTADA

Um membro da família de Wanderlei Barbosa afirmou ao Observatório Político que a renúncia está totalmente descartada. “Ele não renuncia de jeito nenhum. Está confiante na reversão da decisão e quer limpar seu nome”, garantiu.
Um veterano político ouvido pela reportagem, com longa convivência com o avô de Wanderlei, o lendário João Cumprido, de Porto Nacional, fez uma análise pragmática da situação: “Wanderlei não pode agir com o coração, nem ouvir os que perderam cargos e agora tentam empurrá-lo para decisões precipitadas. O STF não vai determinar a volta dele, apenas analisar se o processo seguiu o rito correto. Se houver erro, o caso volta ao Pleno. A pressa é inimiga da reconstrução.”
Para esse interlocutor, Wanderlei deveria refletir sobre o futuro e apostar em um projeto político nacional. “Ele tem apelo popular, tem história e pode se eleger senador com folga. Brigar para voltar ao governo agora seria governar baleado nas duas pernas. Melhor mirar em um mandato de oito anos no Senado e defender o legado da sua gestão.”
LAUREZ CONDUZ O GOVERNO COM FIRMEZA

No Tocantins, o governador interino Laurez Moreira vem mantendo uma postura institucional, marcada pela serenidade e pela responsabilidade administrativa diante do cenário de transição. Ex-prefeito de Gurupi e vice-governador até pouco tempo, Laurez assumiu o comando do Estado com o compromisso de dar continuidade à gestão, mas com os ajustes necessários para garantir equilíbrio e transparência.
Importante destacar que, durante o governo de Wanderlei Barbosa, Laurez foi praticamente isolado dentro do Palácio Araguaia, sem espaço político nem administrativo para contribuir com a condução do Executivo, o que torna injusta qualquer tentativa de atribuir-lhe responsabilidades por problemas herdados. Ainda assim, ao assumir o governo, ele tem adotado uma postura firme e propositiva, sem recorrer a ataques pessoais, mas deixando clara a herança pesada que recebeu, especialmente na área da saúde, onde as dívidas ultrapassam R$ 500 milhões.
Mesmo diante desse quadro, Laurez não se deixou abater e vem articulando junto ao governo federal, a ministros e a autoridades nacionais a liberação de recursos e programas que ajudem a reequilibrar as finanças estaduais. Sua atuação demonstra serenidade e senso de dever público, mantendo o Estado em funcionamento e preparando o terreno para colocar o Tocantins de volta nos trilhos. A confiança é de que, no prazo de 180 dias, período em que deve permanecer à frente do Executivo, conseguirá estabilizar as contas e restabelecer a credibilidade administrativa do governo.
O TABULEIRO POLÍTICO PARA 2026
O afastamento de Wanderlei Barbosa redesenhou completamente o tabuleiro político para as eleições de 2026. Até agosto, o governador liderava as articulações para uma aliança entre Republicanos, União Brasil e parte do PL, com o objetivo de eleger uma base robusta de deputados e garantir sua reeleição.

Com a crise, esse projeto ficou em suspenso. O governador interino Laurez Moreira tenta consolidar sua imagem de gestor equilibrado, enquanto outros nomes como Ronaldo Dimas (Podemos), Cinthia Ribeiro (PSDB) e Vicentinho Alves (PP) voltam a aparecer como possíveis candidatos ao Palácio Araguaia.
A indefinição sobre o futuro de Wanderlei mantém todos em compasso de espera. Cada passo dado por Brasília ou pela Assembleia Legislativa é acompanhado com lupa por deputados, prefeitos e lideranças regionais.
SEGURANÇA JURÍDICA

Diante do impasse político e jurídico que se instalou no Tocantins, a classe política, o setor empresarial e o agronegócio adotaram uma postura de cautela, evitando se posicionar publicamente até que haja uma definição clara sobre o futuro do governo. O clima é de incerteza e ninguém quer se comprometer diante de um quadro tão instável, em que a decisão sobre a permanência ou não do governador interino Laurez Moreira pode ser tanto política quanto jurídica.
Enquanto isso, o Estado segue sendo exposto negativamente nos principais veículos de comunicação do país, com sua imagem abalada e a governabilidade comprometida. Essa indefinição prolongada tem custado caro ao Tocantins, que precisa urgentemente de uma decisão firme por parte da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, seja para confirmar Laurez no cargo pelos próximos 180 dias, seja para determinar o retorno do titular. O que não se pode admitir é a continuidade desse limbo institucional, que paralisa investimentos, enfraquece a confiança e agrava o desgaste da administração pública.
É inadmissível que o mais jovem Estado brasileiro, dono de terras férteis, abundância de água e grande potencial produtivo, siga à deriva política, vendo a sucessão de governadores afastados antes do fim de seus mandatos e a classe dirigente transformando a gestão pública em palco de disputas e escândalos. O Tocantins precisa, com urgência, de rumo, estabilidade e respeito à sua população.
O julgamento que se aproxima pode definir não apenas o destino de um governador, mas o equilíbrio entre os poderes no Tocantins. A prudência, como dizem os antigos, é o melhor conselheiro. E neste momento, mais do que nunca, vale o velho ditado que ecoa nos bastidores de Porto Nacional:
“Vamos devagar com o andor, que o santo é de barro.”
O Observatório Político de O Paralelo 13 seguirá acompanhando, com exclusividade, cada movimento em Brasília e no Tocantins, para manter seus leitores bem informados sobre o processo que pode redefinir o futuro político do Estado.