Santa Casa deve R$ 25 milhões a empresa do grupo Andrade Gutierrez pela compra de insumos
Em reportagem o jornal Folha de São mostra a briga nos bastidores dessa crise na saúde publica de São Paulo. Com gestão questionada por Estado e União, entidade filantrópica faz acordo e retoma serviços no pronto-socorro.
Um dia após ter interrompido os atendimentos de urgência e emergência no pronto-socorro, a Santa Casa de São Paulo fez acordo para receber ajuda financeira do Estado e virar alvo de auditoria e, com isso, retomou os serviços na noite desta quarta (23).
A decisão foi anunciada após a crise financeira do maior hospital filantrópico da América Latina ter motivado críticas sobre a gestão da entidade e um bate-boca entre os governos Geraldo Alckmin (PSDB) e Dilma Rousseff (PT).
O pronto-socorro ficou fechado por quase 30 horas --e, nesta quarta, houve interrupções também em consultas, exames e cirurgias eletivas acabaram sendo canceladas.
A Santa Casa diz que a medida é resultado de uma dívida de R$ 50 milhões com fornecedores, que a deixou sem materiais e medicamentos.
A instituição anunciou a retomada do atendimento após a gestão Alckmin decidir liberar R$ 3 milhões de forma emergencial, para pagamento de fornecedores, e se comprometer com a dívida restante, em parcelas.
Os governos estadual e federal questionaram a gestão de recursos pela Santa Casa e terão representantes em uma auditoria exigida pelo Estado para fazer repasses.
``Estamos cobrando a abertura das contas``, afirmou David Uip, secretário estadual da Saúde. ``A Santa Casa recebe, por exemplo, para fazer dez cirurgias e produz sete. Onde estão essas três cirurgias? Não estamos suspeitando de nada, porque gerir um hospital é muito difícil. Estamos dizendo que essa auditoria tem tom colaborativo.``
Após negar inicialmente a oferta de R$ 3 milhões alegando que seria insuficiente, Kalil Rocha Abdalla, provedor da Santa Casa, aceitou a retomada dos serviços ``a contragosto``. Ele nega má gestão. ``Temos certeza da lisura da contabilidade``, disse.
Pouco antes das 22h, três vans de fornecedores chegaram ao hospital e os portões foram reabertos. Primeiro paciente, Daniel, 14, tinha estreitamento de esôfago e precisava de uma endoscopia.
A Santa Casa é gerida com recursos próprios (como doações, verba de hospitais privados que gerencia e aluguel de imóveis) e verbas federais e estaduais, mas não deu detalhes de receitas e despesas.
A entidade critica a defasagem da tabela básica do SUS para remunerar procedimentos médicos --e que não é atualizada há dez anos.
A Promotoria instaurou inquérito para apurar a interrupção no atendimento.
DISPUTA POLÍTICA
A três meses das eleições, a crise na Santa Casa virou alvo de disputa entre os governos Alckmin e Dilma.
O governador tucano criticou os valores do SUS e disse haver subfinanciamento.
``É necessário investir mais na saúde. Aí o governo mais rico, que é o federal, vai diminuindo a sua participação. Como ele diminui? Não corrigindo a tabela [do SUS].``
O ministro da Saúde da gestão Dilma, Arthur Chioro, acusou a gestão Alckmin de tentar ``transferir para o colo do governo federal a responsabilidade`` sobre a crise.
A pasta diz que os recursos às Santas Casas não se limitam à tabela do SUS e questionou uma diferença de R$ 74,7 milhões na verba dada pela União ao hospital por meio do Estado. ``Provavelmente não teríamos essa crise se esse dinheiro tivesse sido integralmente utilizado``, disse Chioro, à noite. Procurado, o Estado não comentou devido ao horário.
Metade da dívida de material hospitalar é com um fornecedor
Santa Casa deve R$ 25 milhões a empresa do grupo Andrade Gutierrez pela compra de insumos
Dívida total do hospital é de R$ 400 mi, sendo a maior parte bancária; parte da receita não tem origem divulgada
A Santa Casa de São Paulo afirma que metade dos R$ 50 milhões que ela deve a fornecedores tem apenas um credor, a empresa Logimed.
Parte do grupo Andrade Gutierrez, a empresa é responsável pela compra e distribuição de remédios e outros materiais hospitalares na Santa Casa desde 2008.
Com sede em São Paulo, a Logimed foi fundada naquele ano e tem como especialidades compra, transporte e fornecimento de insumos.
Segundo um dos coordenadores da Santa Casa, Paulo Antonio Chiavone, o restante da dívida com os fornecedores é distribuído de forma pulverizada entre empresas, cujos nomes não detalhou.
A reportagem entrou em contato com a Logimed para saber se a empresa está disposta a renegociar a dívida, como quer a Santa Casa
Em nota, porém, a empresa afirmou que não comenta ``questões contratuais por respeito aos seus clientes``.
A Santa Casa tem uma dívida total de mais de R$ 400 milhões. A maior parte é bancária --com juros são cobrados R$ 3 milhões por mês
A chapa de oposição, derrotada nas eleições de abril, atacou a gestão financeira do provedor da instituição, o advogado Kalil Rocha Abdalla.
Segundo dados apresentados pelo líder da oposição, José Luiz Setúbal, a dívida em 2008 era de R$ 70 milhões.
Antes do desfecho das eleições, o grupo teria iniciado uma negociação com os principais fornecedores.
O orçamento da entidade é de R$ 1,3 bilhão. Os repasses estaduais e federais somaram R$ 414 milhões em 2013, de acordo com dados da Secretaria de Estado da Saúde. Em 2014, já foram repassados R$ 173 milhões.
A Santa Casa afirmou que o resto da receita vem de doações e de hospitais particulares que administram, mas não detalha os dados
Fontes: NATÁLIA CANCIAN, MARINA GAMA CUBAS, GUSTAVO URIBE, FLAVIA FOREQUE e ARTUR RODRIGUES - Folha de S.Paulo)