Novato no Supremo Tribunal Federal, o ministro Nunes Marques deve selar o destino do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no habeas corpus que discute se o ex-juiz Sérgio Moro agiu com parcialidade ao condenar o petista na ação do triplex do Guarujá.
Por Rafael Moraes Moura
O julgamento é acompanhado por aliados do presidente Jair Bolsonaro, responsável por indicar Marques à Corte, pois uma vitória de Lula abre a possibilidade para uma volta do petista à disputa eleitoral de 2022. Segundo o Estadão apurou, a Segunda Turma do STF deve retomar a análise da ação neste semestre.
A discussão, iniciada em dezembro de 2018, ganhou força após hackers divulgarem mensagens privadas trocadas por Moro e integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Na semana passada, uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski, integrante da Segunda Turma, garantiu à defesa de Lula acesso à íntegra do material obtido pelos criminosos virtuais.
O objetivo de Lula é fazer um pente-fino nas mensagens para tentar reforçar a acusação de que Moro o via como um "inimigo" ao condená-lo a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro envolvendo o imóvel.
Foi com base nessa condenação, confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), que o petista foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa. Inelegível, ele teve o registro de candidatura negado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2018, o que obrigou o PT a substituí-lo por Fernando Haddad na cabeça da chapa.
Para a defesa do ex-presidente, uma decisão favorável no Supremo - e a consequente anulação da condenação - pode tornar Lula elegível novamente, afastando empecilhos jurídicos a uma eventual candidatura à Presidência em 2022. Bolsonaro pretende tentar a reeleição.
Se a Segunda Turma, formada por cinco dos 11 ministros do STF, concordar com a tese de que Moro foi parcial ao sentenciar Lula no caso do triplex, a condenação deve ser derrubada, fazendo o processo voltar à estaca zero. Uma decisão nesse sentido poderia respingar em outro caso, o do sítio de Atibaia, no qual Lula também foi condenado em segunda instância, na avaliação da criminalista Raquel Scalcon, professora de Direito Penal da FGV São Paulo.
"A suspeição não se dá em um processo apenas, mas na relação com o réu. A questão da parcialidade não é em qual processo, mas com qual réu, no caso o ex-presidente Lula. Há uma contaminação (na ação do sítio), porque atos processuais importantes foram proferidos por Moro", afirmou Raquel.
Votos
A defesa de Lula pediu ao ministro Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma, "prioridade" no julgamento sobre a suspeição de Moro. Em dezembro de 2018, Gilmar pediu vista (mais tempo para análise), interrompendo o exame do caso depois que dois colegas já tinham votado contra as pretensões do petista.
O relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin, e a ministra Cármen Lúcia rejeitaram o habeas corpus. Ainda faltam três votos: de Gilmar, Lewandowski e Marques. As mensagens obtidas pelos hackers foram divulgadas pelo site The Intercept Brasil meses depois do início do julgamento na Corte.
Gilmar e Lewandowski são da ala garantista do STF, críticos aos métodos de investigação da Lava Jato. Em um julgamento em agosto do ano passado, os dois atacaram Moro e indicaram que votarão pela suspeição do então juiz.
Na ocasião, a Segunda Turma analisou um outro pedido de Lula, para que a delação do ex-ministro Antonio Palocci fosse excluída da ação penal que mira o Instituto Lula. Gilmar e Lewandowski afirmaram que há indicativos de que Moro quebrou a imparcialidade e violou o sistema acusatório ao incluir a delação de Palocci na investigação e torná-la pública a seis dias da eleição de 2018.
Como Gilmar e Lewandowski já sinalizaram o voto pela suspeição de Moro, a definição do placar deve ficar com Nunes Marques. Em julgamentos e decisões individuais, Marques tem proferido votos alinhados a interesses do Planalto e da classe política. Ele também já se uniu a Gilmar e a Lewandowski para impor reveses à Lava Jato na Segunda Turma. Com o voto dele, por exemplo, o colegiado manteve a decisão de retirar a delação de Palocci da ação penal sobre o Instituto Lula.
'Unanimidade'
Moro afirmou ao Estadão que o TRF-4 e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmaram, "sempre por unanimidade", a condenação imposta a Lula no caso do triplex do Guarujá, "não havendo qualquer vício nela". O gabinete de Nunes Marques e a assessoria de Lula foram procurados, mas não se manifestaram.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.