Pacheco vê estimulo de Bolsonaro em ataques e diz que sua candidatura representa democracia

Posted On Domingo, 29 Janeiro 2023 06:28
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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirma que o conjunto de ações antidemocráticas, que teve como ápice o ato golpista de 8 de janeiro e a descoberta de uma minuta para decretar estado de defesa, mostra que houve preparação para uma ruptura institucional.

 

POR RENATO MACHADO E THAÍSA OLIVEIRA

 

"Eu considero que essa posição firme do Senado em defesa da democracia é o grande legado que o Senado deixa para essa quadra histórica e triste do Brasil, em que houve a pretensão concreta da ruptura institucional e da implantação de uma ditadura", afirma em entrevista à Folha.

 

O senador diz não querer ser leviano de fazer acusações concretas contra Jair Bolsonaro (PL), mas diz que o ex-presidente estimulou a divisão da sociedade brasileira em diversos momentos e foi, no mínimo, incapaz de conter o extremismo de seus apoiadores.

 

"Foram comportamentos evitáveis para um presidente da República e que podem ter sim estimulado essa divisão no Brasil, a ponto de se ter o extremismo que culminou no ato de 8 de janeiro."

 

Candidato para mais dois anos na presidência do Senado contra o bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN), Pacheco evita associar o adversário aos atos golpistas, mas afirma que é sua candidatura à reeleição que "representa a defesa do Estado de Direito e da democracia".

 

Folha - Como o sr. soube o que estava acontecendo naquele 8 de janeiro e em que momento teve dimensão da gravidade?

 

Rodrigo Pacheco - Eu estava em viagem de férias, já estava atento e monitorando, em razão do trabalho da Polícia Legislativa, que anteviu uma manifestação e algumas afirmações de que poderia haver invasão. No domingo, eu recebi um comunicado do nosso diretor-geral [da polícia] dizendo que estavam na iminência de invadir o prédio. Imediatamente telefonei para o governador Ibaneis Rocha indagando providências. Ele disse que estava buscando fazer a reação devida e com todas as tropas nas ruas.

 

Eu então organizei imediatamente meu retorno ao Brasil porque desde o primeiro momento, quando recebi as primeiras imagens, já vi a gravidade do fato. No dia anterior, eu encaminhei uma mensagem ao governador dizendo da nossa preocupação. E ele me respondeu que todas as tropas estariam nas ruas, que ficaria tudo sob controle, para que eu ficasse tranquilo. Por isso a minha convicção de que o governador, nesse episódio todo, pode ter sido induzido a erro.

 

Folha - Nesse momento, o sr. achava que era um movimento de arruaça ou um golpe?

 

Rodrigo Pacheco - Ambos. Evidentemente que, além da arruaça, da depredação, da invasão, do atentado ao prédio físico e à moral dos Poderes, era um atentado à nação brasileira. E evidentemente os desdobramentos daquilo que nunca antes tinha sido visto poderiam ser inimagináveis. Naquele instante nós não afastamos nenhuma possibilidade.

 

Folha - O sr. sempre evitou confrontar Bolsonaro por suas falas antidemocráticas, dizendo que preferia combater o discurso ao personagem. Agora que conhecemos na prática o impacto da retórica do ex-presidente, acha que errou?

 

Rodrigo Pacheco - Numa atuação, qualquer que seja, e no meu caso como presidente do Senado, há erros e acertos. Mas o que eu afirmo sempre é que todas as minhas ações, acertadas ou não, foram pautadas na boa intenção. Eu sempre preguei a pacificação, o equilíbrio entre os Poderes. E a minha postura sempre reativa ao discurso e a ideias antidemocráticas foi no sentido de não permitir que elas se disseminassem no Brasil.

 

No caso de um chefe de Poder, cuja obrigação é se relacionar bem com os demais chefes de Poderes, considero que temos que nos posicionar em relação às ideias e às ações, e não levar para um campo de críticas pessoais. Isso poderia descambar para coisas piores, inclusive agravar a situação de animosidade que já existia.

 

E havia, de fato, e se comprova hoje isso, um sentimento muito verdadeiro, concreto, real, que não estava no campo das bravatas em relação a atos antidemocráticos e à perspectiva de uma ruptura institucional no Brasil. Tanto que até uma minuta de golpe de Estado foi encontrada. Isso é revelador de que, para além da cogitação, houve de algum modo a preparação para uma ruptura institucional.

 

Folha - E qual é o papel do ex-presidente nisso?

 

Rodrigo Pacheco - Jair Bolsonaro, presidente da República, líder de um segmento de direita, e infelizmente não foi capaz de conter o extremismo desse movimento dele, [que foi] capaz de fazer coisas como [as que] aconteceram no dia 8 de janeiro. Eu não vou ter a leviandade de afirmar alguma responsabilidade direta sobre os atos, porque isso depende de uma apuração.

 

Mas, em termos de movimento político, o presidente Jair Bolsonaro foi incapaz de conter o radicalismo, o extremismo daqueles que o admiram. E esse era o papel de um grande líder político que se impunha: conter espírito antidemocrático, conter ações antidemocráticas e esse radicalismo que se vê hoje, raivoso, com bastante ódio, desrespeito às instituições e às pessoas.

 

Folha - O sr. fala em não conter o radicalismo, o que passa a ideia de passividade, e não de ação. Acha que ele não influenciou o movimento que resultou em 8 de janeiro?

 

Rodrigo Pacheco - Eu considero que o presidente Jair Bolsonaro não foi capaz de conter a exaltação, o radicalismo, o extremismo de grupos, de adeptos seus. E, em alguns momentos, o comportamento dele na Presidência da República estimulou a divisão e a separação da sociedade brasileira, quando, por exemplo, agrediu o Supremo Tribunal Federal, os seus ministros.

 

Então foram comportamentos evitáveis para um presidente da República e que podem ter sim estimulado essa divisão no Brasil, a ponto de se ter o extremismo que culminou no ato de 8 de janeiro.

 

Folha - O sr. vai disputar a presidência do Senado com um ex-ministro do governo Bolsonaro. Que papel teve Rogério Marinho nesse contexto de radicalização e extremismo?

 

Rodrigo Pacheco - Eu prefiro falar da minha imagem, do meu propósito. A minha candidatura é a que representa a defesa do Estado de Direito e o fortalecimento da democracia no país. É a candidatura que acredita nas urnas eletrônicas, na ciência, que respeita os pares, que busca a união do país, que busca respeitar as demais instituições, que busca estabelecer limites através da legislação e não do revanchismo, da retaliação a outro Poder.

 

E esses personagens da política que foram criados nos últimos anos a partir desse extremismo de direita, que são personagens sem compromisso com resultados, com solução, e só querem angariar likes em rede social, encontrarão seguramente o seu caminho: vão ser desmascarados, alguns até presos, porque atacam a democracia e o Estado de Direito.

 

Folha - No calor do 8 de janeiro, governistas conseguiram assinaturas para uma CPI, mas agora se deram conta de que pode atrapalhar o início do governo Lula. O que o sr. vai fazer?

 

Rodrigo Pacheco - Se há um fato que justificaria uma CPI é esse atentado contra a democracia para se identificar quem financiou, colaborou, agiu diretamente ou indiretamente. Eu considero que há fato determinado, que é um fato robusto, de grande magnitude, que justificaria uma CPI, de modo que, havendo número de assinaturas suficientes, há absolutamente a pertinência da comissão.

 

Se, sob o ponto de vista político, houver a conclusão de que uma CPI no início de um governo talvez não seja um bom caminho, essa é uma construção política que terá que ser feita não pelo presidente do Senado, mas por todos os líderes.

 

Folha - Ou seja, se o governo quiser matar a CPI, ele que retire assinaturas e que não dependa do sr. para segurar a instalação.

 

Rodrigo Pacheco - Ou retirem as assinaturas ou, eventualmente lido [o requerimento], não haja indicação de membros para a comissão. E aí há a opção de não se instalar, que é uma opção política, legítima e que já aconteceu diversas vezes. Mas eu considero que, da forma como está, não há o que eu possa fazer. Não cabe ao presidente do Senado fazer esse juízo de se evitar a CPI.

 

Folha - O que considera a principal marca da gestão do sr.?

 

Rodrigo Pacheco - A maior obra do Senado nesses últimos dois anos foi a defesa da democracia, das instituições brasileiras, de o Senado não ter se permitido aderir a um discurso de questionamento da Justiça Eleitoral, das urnas eletrônicas. De termos afirmado a todo instante que o resultado da urna seria respeitado e que, no dia 1º de janeiro, o presidente eleito, quem fosse, seria empossado.

 

Eu considero que essa posição firme do Senado em defesa da democracia é o grande legado que o Senado deixa para essa quadra histórica e triste do Brasil, em que houve a pretensão concreta da ruptura institucional e da implantação de uma ditadura no Brasil. Inclusive com ação concreta, que foi a aprovação da Lei do Estado de Direito, em substituição à Lei de Segurança Nacional, que permite que hoje esses criminosos que invadiram o Congresso não sejam enquadrados apenas em crime de dano ou coisa que o valha.

 

Folha - Como será a relação do Senado com o governo, considerando que o PSD é da base e um dos principais aliados do sr. em MG, Alexandre Silveira, é ministro?

 

Rodrigo Pacheco - Eu espero que seja uma relação de harmonia, de respeito, mas de independência entre os Poderes. O presidente buscará ter a base necessária no Senado para aprovação das matérias e, dentro dessa base, nós vamos construir as soluções para o país. Mas algo que é do meu perfil, que é do meu temperamento, que é o respeito a todos.

 

Então evidentemente que, assim como foi nessa legislatura, eu respeitarei muito também a oposição. Haverá tratamento uniforme a todos os senadores. O papel do presidente do Senado não pode ser o de base de governo ou de líder de governo. Tampouco pode ser de líder de oposição. Eu devo arbitrar e ser o magistrado das soluções do país. Então, tudo aquilo que vier do Executivo como algo possível e provável para a melhora da qualidade de vida das pessoas, nós vamos fazer de bom grado.

 

Folha - Essa arbitragem e essa diplomacia muitas vezes foram confundidas com falta de posicionamento, ficar em cima do muro?

 

Rodrigo Pacheco - Eu acho que, em todos os temas, eu tive posições. Às vezes não eram as posições esperadas. Ou com a forma que se esperava que fosse. Mas aí eu não posso fazer [nada], é impossível agradar a todo mundo. Mas eu sempre tive as minhas posições, e elas sempre foram norteadas na defesa do Poder Legislativo e na defesa do Senado. Nós vamos manter nossas posições.

 

E esse jeito, que alguns dizem que é o jeito mineiro, você está dizendo que é um jeito diplomático, esse jeito vai continuar porque esse é o meu perfil, esse é o meu temperamento, esse é o meu jeito. E não é em cima do muro. Às vezes a gente tem que estar acima do muro e buscar a solução, e não jogar gasolina na fogueira, jogar água na fervura é melhor.

 

Folha - O sr. chegou a anunciar um plano para aprovar a reforma tributária em seis meses, o que não ocorreu. Por que a situação agora é diferente?

 

Rodrigo Pacheco - Porque agora nós temos uma manifestação concreta do governo federal de que quer fazer a reforma tributária. As PECs do Congresso nunca tiveram apoio explícito no governo anterior. E é fundamental em reforma tributária se ter o apoio explícito e a clareza do que se quer por parte do Executivo, que é o Poder responsável pela arrecadação. O Poder Legislativo é obviamente quem decide, mas isso precisa ser feito a quatro mãos com o Poder Executivo.

 

RAIO-X

 

Rodrigo Pacheco, 46 - Nascido em Porto Velho (RO), mas criado em Passos (MG), Rodrigo Pacheco (PSD) é o atual presidente do Senado e busca a reeleição em 1º de fevereiro. Advogado criminalista, foi eleito deputado federal em 2014 e presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara. Foi eleito em 2018 para o Senado, onde se tornou líder da bancada do DEM, seu antigo partido