MP estabelece que agentes públicos só podem ser responsabilizados se houver comprovação de 'erro grosseiro' ou 'dolo' em ações. Para especialistas, MP é 'obscura' e 'autoritária'.
Com G1
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgará nesta quarta-feira (20) ações contrárias à medida provisória (MP) editada pelo presidente Jair Bolsonaro que isenta de punição decisões tomadas por agentes públicos no combate à pandemia do coronavírus.
A MP foi editada no último dia 14, e seis ações contra a medida foram apresentadas ao STF. O relator das ações é o ministro Luís Roberto Barroso, que decidiu nesta terça (19) levar o tema diretamente para o plenário, para que os 11 ministros do Supremo possam
analisar o caso.
Quando a MP foi editada, especialistas consideraram o conteúdo "obscuro" e "autoritário". O ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, por exemplo, chegou a dizer que o ato foi "desnecessário".
A MP já está em vigor. Isso porque medidas provisórias têm força de lei assim que publicadas no "Diário Oficial da União". Precisam, no entanto, de aprovação pelo Congresso Nacional para se tornar leis em definitivo.
Se o STF mantiver a MP, ou seja, rejeitar as ações, o conteúdo permanecerá em vigor. Se os ministros decidirem suspender o ato de Bolsonaro, a medida, então, deixará de vigorar.
O que prevê a MP
A MP diz que os agentes públicos só poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados, direta ou indiretamente, com as medidas de:
enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia da Covid-19;
combate aos efeitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia da Covid-19.
Segundo o texto, além do caso de erro grosseiro ou dolo, a responsabilização pela opinião técnica do agente público poderá se dar em caso de conluio, quando há uma combinação ou cumplicidade de mais de uma pessoa para promover um ato maléfico.
Argumentos
O governo alega que, em razão da pandemia, o agente público está diante da necessidade de tomar medidas que geram impacto fiscal "extraordinário" para as futuras gerações. Afirma ainda que, em situações normais, essas medidas não seriam tomadas.
"O agente público, hoje, para salvaguardar vidas e combater os efeitos econômicos e fiscais da população brasileira se vê diante de medidas que terão impactos fiscais extraordinários para as futuras gerações, de compra de equipamentos por preços que, em situação normal, não se julgaria ideal, de flexibilizações na interpretação de regras orçamentárias que antes pareciam indiscutíveis, dentre outras", disse o governo na justificativa.
A MP classifica como "erro grosseiro": ação ou omissão com alto grau de negligência, imprudência ou imperícia.
No entanto, ressalva que, na análise do ato do agente público, deverá ser levada em conta uma série de fatores não previstos fora do contexto da pandemia.
A legislação
A legislação brasileira já prevê situações em que o agente público pode ser isento de responsabilização em caso de não comprovação de culpa intencional, de conluio ou de erro grosseiro.
No entanto, a MP amplia para o contexto da pandemia do novo coronavírus os aspectos que devem ser analisados ao se avaliar se houve erro grosseiro.
Com a medida provisória, passa a ser necessário levar em conta os seguintes elementos antes de se responsabilizar um agente público:
Obstáculos e dificuldades reais do agente;
Complexidade da matéria e das atribuições do agente;
Incompletude de informações na situação de emergência ou urgência;
Circunstâncias práticas que podem limitar, impor ou condicionar a ação ou omissão do agente público;
Incerteza sobre medidas mais adequadas para enfrentar pandemia e as eventuais consequências.