A SOMATÓRIA DAS PENAS POSSÍVEIS DOS PRINCIPAIS POLÍTICOS DENUNCIADOS NA LAVA JATO, A LIBERAÇÃO DOS DOCUMENTOS RESTIDOS NA SUÍÇA, UM RECADO DO PAPA AO PRESIDENTE MICHEL TEMER E O RELATO DE UMA BRASILEIRA ESCRAVIZADA SEXUALMENTE NA ESPANHA, DOMINAM OS

Posted On Segunda, 24 Abril 2017 00:20
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2.527 anos de prisão

Para réus, denunciados e investigados pela Lava Jato, o emprego da lógica matemático-penal é como o tempo: implacável. Senão vejamos: se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fosse condenado por todos os crimes pelos quais é acusado na Justiça, ficaria de 519 a até incríveis 1.795 anos na cadeia. Usando o mesmo critério, o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL), poderia amargar até 247 anos na prisão. Sua pena mínima seria de 60 anos. Já o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não ficaria menos do que 39 anos no cárcere, podendo alcançar 170. Um grupo multipartidário de cinco expoentes políticos analisados por ISTOÉ não registra cifras menos assustadoras. Somadas, suas penas podem variar de 678 anos a fenomenais 2.527 anos no xilindró.

 

Claro que o cálculo é hipotético pois, no Brasil, ninguém fica mais de 30 anos na prisão. Mas o turbilhão Odebrecht aumentou em muito o tamanho do risco jurídico-emocional que corrói a classe política, cujo encalço é vigiado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. O levantamento feito pela reportagem de ISTOÉ inclui o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB), um dos principais auxiliares do presidente Michel Temer. Se implicado por todos os crimes, Padilha, correria o risco de pegar uma pena de 67 anos. O mesmo cálculo se aplica ao ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab (PSD), e ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O ex-ministro e ex-governador José Serra (PSDB-SP), por sua vez, poderia ser condenado a uma pena máxima de 89 anos de detenção. O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), entre 5 e 25 anos.

 

O presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Roberto Veloso, lembra que são os magistrados, e não os procuradores, quem definirão se os políticos são culpados ou não e qual o tamanho da pena proporcional ao crime que eles realmente cometeram. O levantamento, baseado em inquéritos policiais e denúncias do Ministério Público, mostra que, quanto mais maduros estão os processos, maiores sãos os riscos de temporadas mais longas na prisão. Como Lula tem mais ações penais que os outros, está bem à frente dos colegas. O cálculo não considerou todas as investigações do petista e de Renan, ambos com mais de dez procedimentos criminais na Justiça, mas apenas as denúncias ou os inquéritos derivados das delações da Odebrecht.

 

O cálculo é hipotético pois, no Brasil, ninguém fica mais de 30 anos na prisão, mas mostra como a classe política está corroída

Os demais políticos do grupo só não estão com risco igual ou maior que o de Lula, Renan e Jucá porque seus processos ainda não estão tão amadurecidos. Explica-se: na fase de inquérito, a polícia e o Ministério Público e a polícia não detalham a totalidade de crimes supostamente cometidos como acontece quando chega-se à fase da denúncia. Os crimes apontados são basicamente corrupção passiva e lavagem de dinheiro (ver quadro). Investigadores da Lava Jato têm dito nas delações da Odebrecht que nunca aceitariam a “desculpa” da empreiteira de que houve “apenas caixa 2”, uma saída honrosa aventada pelo presidente do grupo, Marcelo Odebrecht, no início das negociações, mas rejeitada desde então. Para eles, trata-se de um esquema de corrupção generalizada, que utiliza vários estratagemas de lavagem, inclusive doações de campanha feitas à margem do sistema ou registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A artimanha que hoje une petistas, tucanos e peemedebistas já foi usada pelo PT em meio ao escândalo do mensalão no passado. Como se sabe, naufragou.

 

O “recado” do Papa Francisco ao Brasil

O Papa Francisco enviou carta ao presidente Temer, anunciando que não poderá comparecer às celebrações dos 300 anos da aparição de Nossa Senhora Aparecida, comemorados este ano.

Não foi apenas uma carta de recusa a convite formulado.

 

O Papa mandou um “recado” ao governo brasileiro.

No texto papal, a propósito da atual crise nacional lê-se: “não corresponde à Igreja nem ao papa dar uma receita concreta para resolver algo tão complexo“.

 

Todavia, o “recado” explícito está na recomendação (ou conselho”), de que na hora de tantas reformas (sobretudo a trabalhista e previdenciária) não é possível “deixar de pensar em tantas pessoas, sobretudo nos mais pobres, que muitas vezes se veem completamente abandonados e costumam ser aqueles que pagam o preço mais amargo e dilacerante de algumas soluções fáceis e superficiais para crises que vão muito além da esfera meramente financeira”.

 

Trocando em miúdos, o Papa avalizou o manifesto dos bispos brasileiros, divulgado em março passado, que ao final cita o Pontífice:

 

“a economia que promove a exclusão e a desigualdade social é comprometida com a morte: “Essa economia mata!” (Evangelho da Alegria 53)”.

 

O Papa Francisco deixou claro que o “mercado” e as “exigências econômico-financeiras” não são um fim em si mesmo, ao declarar que “não podemos confiar mais nas forças cegas e na mão e invisível do mercado".

O presidente Temer tem negociado e aprovado alguns recuos nas reformas, aliás, todas elas absolutamente necessárias.

 

Não se discute, portanto, a prioridade dessas reformas, mas o fato de que elas terão de ser “graduais” e “possíveis”, sempre em respeito à dignidade humana.

 

Não há debate ou preocupação com as receitas da Previdência e somente o aspecto econômico é analisado.

 

Por tais razões, o centro da discussão congressual não deveria ser apenas os números do déficit financeiro realmente existente, mas levar em consideração às fontes de recursos já criadas (e desviadas, até para mercado de capitais – no caso dos fundos de pensão), todas elas destinadas ao financiamento da saúde, previdência e assistência social (Constituição Federal - Título VII, "Da Ordem Social", Capítulo II - art. 195).

 

A COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) é no Brasil um dos impostos de maior arrecadação, atrás apenas do Imposto de Renda

 

Onde anda esse dinheiro das “contribuições sociais”, que não chega à previdência?

 

O que se faz de objetivo para a cobrança rigorosa dos devedores da previdência e a eliminação por inteiro das desonerações, concedidas sem exigência de contrapartidas (só em 2015 cerca de R$ 170 bilhões), que somente aumentaram o déficit e aprofundaram o desemprego?

 

Onde anda a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, o único dos sete previstos na Constituição, ainda sem regulamentação e que renderia no mínimo 100 bilhões de reais?

 

Esse imposto já existe em todos os países desenvolvidos e democráticos do mundo.

 

É justo que no Brasil, em hora de ajuste fiscal, um grupo de quase 100 mil pessoas, fique sem pagar nada de imposto de renda pessoa física, por auferirem ganhos de lucros e dividendos de empresas (lei 9.249/95), totalizando mais de 100 bilhões por ano?

 

Nos Estados Unidos, o país do capitalismo, esses contribuintes não são isentos.

 

Talvez pela falta de resposta às indagações no ar, o Papa tenha deixado claro nas entrelinhas do seu “recado”, que nas reformas em curso, se alguém tiver de pagar preço mais amargo e dilacerante, sejam aqueles que têm “mais” e não os que têm “menos”, ou “quase nada”.

 

Esquecer a ótica humana e social das reformas será transformar-se em “cabo eleitoral” eficiente para a volta ao poder, daqueles que, com a linguagem do populismo inconsequente, colocaram o Brasil no abismo em que se encontra.

 

A nossa opção é por uma verdadeira economia livre de mercado, que privilegie a inovação e o empreendedorismo, realmente distanciado do “capitalismo de amigos” e que seja o meio e não o fim do desenvolvimento sonhado.

 

A ótica defendida neste artigo, que leva em conta não apenas os números frios das estatísticas de planilhas econômicas, em nada se opõe a modernidade de aprovação de uma reforma da previdência, ajustada a nossa realidade demográfica para torná-la sustentável e excludente de privilégios.

 

Para o bom entendedor, o recado de Francisco foi dado.

Será que os militantes de facções políticas, do tipo “Psol da direita”, irão passar a chamar o Papa Francisco de “agitador” ou até de “comunista”????

 

Documentos da Odebrecht guardados na Suíça chegam ao Brasil

Uma cópia do servidor com 2 milhões de páginas de documentos, e-mails e provas de transações bancárias das atividades suspeitas da Odebrecht já está em Brasília. Os dados guardados pela construtora na Suíça passam atualmente por uma “preparação” para que possam ser usados pelos procuradores da Operação Lava Jato e pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

 

O conteúdo é tratado pelos procuradores da força-tarefa como uma espécie de “caixa-preta da República” de todos os pagamentos de propinas pela construtora pelo mundo. Entre as informações contidas no servidor estão, segundo os delatores e investigadores, os registros de pagamentos para a campanha de Dilma Rousseff e Michel Temer, em 2010.

 

Os dados vão ajudar no cruzamento de informações com os inquéritos abertos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) relacionados às delações premiadas de executivos e ex-executivos da Odebrecht.

Comprovantes

A expectativa da Procuradoria-Geral da República (PGR) é de obter comprovantes de pagamentos, tabelas de transferências e extratos bancários. As defesas de políticos investigados têm minimizado o conteúdo das acusações.

 

Até agora, há registro de mil relações bancárias ligadas à Odebrecht em contas na Suíça, com o bloqueio de US$ 1 bilhão. Pelas movimentações da construtora, US$ 635 milhões passaram pelas contas secretas.

 

“Fui com uma mala cheia de sonhos”: Assim brasileiras são transformadas em escravas sexuais na Espanha

Carla levou uma semana para ser informada de que não trabalharia como babá. Nem com idosos. Tampouco faria faxinas, como lhe haviam dito. Não. Teria que se prostituir. Comunicaram isso sem meias palavras. Intimidaram-na. Ameaçaram fazer mal à sua família. E ela tinha motivos para acreditar. Muitos. Tinham, sob algum pretexto, retirado seu passaporte brasileiro assim que aterrissou na Espanha, e ela agora estava num país desconhecido, à mercê de pessoas que antes acreditava que iriam ajudá-la. “Eu estava fazendo faculdade, fiquei sem trabalho e uma amiga me ofereceu a possibilidade de vir trabalhar no serviço doméstico durante seis meses para juntar um pouco de dinheiro. Achei que seria um período duro, mas que superaria. Quando cheguei, a realidade era bem diferente. Nunca acreditei que isso poderia me acontecer. Eu achava que tudo aquilo que se contava sobre mulheres enganadas era mentira”, diz, com o semblante carregado. Tinha 23 anos.

 

A brasileira ficou por algumas semanas em um apartamento de Madri frequentado por homens que queriam sexo em troca de dinheiro. Depois, em Portugal. Em Sevilha (também na Espanha). E de volta à capital espanhola. Sempre em apartamentos, como muitas das mulheres extracomunitárias sem documentos. Quanto mais afastado da vista pública, melhor. “Não podia sair sozinha. Controlavam tudo. É o que as redes fazem até te adestrarem. Até estarem seguros de que você não irá fugir. Você fica aterrorizada”, frisa Carla (nome fictício, como todas as mulheres que falam nessa reportagem para proteger sua identidade). Esteve nessa situação por mais de um ano. “Vim com uma mala cheia de sonhos e caí em um buraco do qual não acreditava que existisse saída”, diz alisando o rabo de cavalo que prende seus cachos escuros. Ela encontrou.

 

"Eu achava que tudo aquilo que se contava sobre mulheres enganadas era mentira"

Carla, uma mulher séria, eloquente, com voz grave e que tem sotaque suave quando fala espanhol, hoje ajuda outras mulheres a escaparem das máfias. É agente social na organização especializada APRAMP e uma das mediadoras que ajudam a identificar as vítimas dessa chaga e que as acompanham para que possam refazer suas vidas. “Somos sobreviventes do tráfico sexual e contamos a elas que se nós conseguimos sair, elas também conseguem”, diz. São 12 na equipe. Existem romenas, brasileiras, paraguaias, nigerianas e dominicanas; as principais nacionalidades das mulheres que chegam à Espanha para serem exploradas sexualmente, de acordo com os dados das autoridades. Quando conseguem sair da rede criminosa que as trouxe começa sua recuperação. E o processo, conta Carla, é duríssimo. “É preciso recuperar hábitos perdidos. É preciso voltar a aprender quase tudo, porque quando nos trazem nos anulam completamente como pessoas, física, psicológica e economicamente”, diz a mediadora.

 

Tempos depois de escapar da máfia que a escravizou, quando estava preparada, Carla contou tudo a sua família. “É parte do que sou agora. Não tenho vergonha”, diz. A brasileira lembra como se fosse ontem o dia em que conseguiu fugir. O dia de seu “resgate”. Uma mediadora da APRAMP, como ela é hoje, procurava indícios de que era uma vítima de tráfico sexual e um dia falou com ela. “Ela me disse que eu poderia ter uma vida diferente, que não precisaria estar ali. Recebi um número de telefone para emergências ativo 24 horas e um dia, em que havia recebido uma tremenda surra e acreditava que a próxima iria me matar, liguei para que me resgatassem. Não é fácil porque você está ali por sete ou oito meses, deixa de acreditar em você mesma e nas pessoas. E quando vê que aparece outra pessoa com promessas pensa que não irá cumpri-las. Mas eu estava tão desesperada. Chegou um determinado momento de minha vida em que eu havia esquecido meu nome, os motivos pelos que vim. Não aguentava mais”, conta.

 

Brasileiras, romenas, paraguaias, nigerianas e dominicanas: essas são as principais nacionalidades das vítimas de tráfico sexual na Espanha

 

A APRAMP ativou seu dispositivo de resgate e Carla foi levada a um apartamento protegido onde começou a terapia psicológica e onde recebeu a oferta de apoio legal. Na Espanha, diz Rocío Nieto, presidenta da organização que ajudou Carla, a assistência às vítimas de tráfico sexual está majoritariamente nas mãos de organizações como a sua e o Projeto Esperança, com apartamentos em 15 cidades aos quais chegam as mulheres que estavam sob custódia das forças de segurança e onde recebem cuidados médicos, aulas de espanhol, oficinas. Isso se forem identificadas como vítimas de tráfico sexual, algo que nem sempre acontece. Essa falha no sistema permitiu que mulheres nessa situação fossem detidas nas ruas e internadas nos CIE, como denuncia uma investigação da Women’s Link Worldwide e como alertou a Defensoria Pública. E que recebessem multas por “exibição obscena do corpo” por prostituírem-se nas ruas.

 

Carla foi identificada como vítima de tráfico sexual. Uma vez a salvo começou a fazer cursos para manter-se ocupada e ter uma formação para conseguir trabalhar. Estudou para ser auxiliar de geriatria e cuidou por um tempo de uma idosa que hoje considera como parte de sua família. Quando teve condições, começou a formação como agente social para se tornar mediadora.

 

Enquanto a brasileira conta sua história na sede de Madri, em um dos bairros com mais prostituição de rua, sete sobreviventes fazem um exercício de relaxamento no quarto ao lado. Em outra salinha, três jovens nigerianas com o cabelo penteado em dezenas de coques feitos com trancinhas, pintam um desenho. Na entrada, outras costuram vários vestidos em um dos cursos que a organização – que colabora com empresas como a Reale e com associações de costureiras e confecções – iniciou. Carla ajusta o colete, olha seu telefone e sai do local. Poucos metros depois começa a falar com as mulheres que esperam por clientes na rua. Cumprimenta cada uma. Entrega seu cartão a duas delas e segue seu caminho. Espera que alguma delas ligue, como ela o fez. E que voltem a viver.