A base aliada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem intensificado as articulações na busca por postos-chave em superintendências e companhias no Nordeste com orçamentos anuais que chegam a superar R$ 2 bilhões.
Por JOSÉ MATHEUS SANTOS E CATIA SEABRA
Mais de dois meses após a posse de Lula, o Palácio do Planalto não efetivou os novos indicados para os comandos da Codevasf (de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) e da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste). A situação está mais encaminhada para o Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas).
Os três órgãos contam, juntos, com R$ 3,2 bilhões no Orçamento anual de 2023 e são mais disputados do que parte dos ministérios da Esplanada. Além disso, têm alcance expressivo em redutos eleitorais do Nordeste, sob influência de deputados federais e senadores.
Impulsionada por emendas parlamentares, a Codevasf terá um orçamento de R$ 2.266.788.098 em 2023. O órgão é responsável por operacionalizar estruturas prontas na região dos rios São Francisco e Parnaíba, como saneamento, recursos hídricos, irrigação e promoção da agropecuária.
Sob o governo Bolsonaro, a companhia recebeu aportes de recursos das emendas de relator, mecanismo do Congresso Nacional que foi declarado inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
O grupo que controla atualmente a companhia é ligado ao deputado federal Elmar Nascimento (União Brasil-BA), um dos principais aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Esse grupo tem o favoritismo, no momento, para seguir à frente da companhia. Inicialmente, Elmar Nascimento era cotado para assumir o Ministério do Desenvolvimento Regional, mas, em dezembro, teve o nome vetado após virem à tona vídeos no qual o parlamentar xingava Lula no período da campanha eleitoral.
A União Brasil possui três ministérios no governo Lula, mas o grupo de Elmar e de parte da bancada do partido na Câmara não foi contemplado. O Palácio do Planalto espera acenar a essa ala com a manutenção do posto de chefe da Codevasf.
O desafio dentro do partido é a construção da unidade partidária em torno de um nome após a indicação. O presidente nacional da União Brasil, deputado federal Luciano Bivar (PE), tem dito a interlocutores que acredita que o partido ficará com a Codevasf, mas que precisa ter um consenso na indicação, a fim de não perder força junto ao governo Lula na hora do pleito.
Governadores do Nordeste esperam que as chefias estaduais possam ficar com indicados de aliados mais próximos, pois a União Brasil é oposição ao PT em estados como Ceará, Piauí e Bahia. A Codevasf possui 14 superintendências estaduais.
Entre outros argumentos, o núcleo político do governo alega a deputados que a falta de celeridade nas nomeações se deve ao mapeamento dos ocupantes de cargos federais a fim de realizar uma "desbolsonarização".
A lentidão nas nomeações tem desagradado as bancadas do PT na Câmara e no Senado. Os parlamentares petistas apontam risco de demora na execução de ações, o que poderia afetar o desempenho do governo numa região que é reduto eleitoral de Lula.
Uma exceção é o caso do Dnocs, no qual o atual superintendente Fernando Marcondes Leão deve seguir na função. Indicado pelo Avante no governo Bolsonaro, ele também tem o aval de Arthur Lira, um dos fiadores da sua indicação na gestão anterior.
A relação com o Avante, entretanto, ainda não está pacificada porque o partido tem exigido outros cargos, argumentando que, como sigla do deputado federal André Janones (MG), teve papel central na campanha de Lula.
Apesar de ter tido aceno do Planalto, a bancada do Avante acredita que o governo usará votações nas próximas semanas no Congresso para testar a lealdade de deputados federais.
As nove superintendências estaduais do departamento de obras contra a seca também estão na mira. Parlamentares afirmam, sob reserva, que o governo orientou os deputados e senadores da base aliada a se reunirem em conjunto e alinhar indicações para parte do terceiro escalão.
O Dnocs tem um orçamento de R$ 905 milhões em 2023 e é responsável por executar políticas de amenização dos efeitos da seca, desde fornecimento e construção de caixas d'água a irrigação e assistência à população.
Para a Sudene, o favoritismo é para a indicação do PT de Pernambuco. O senador Humberto Costa (PE) indicou ao Planalto o seu ex-assessor Diego Pessoa, atualmente coordenador do Consórcio Nordeste.
A superintendência tem R$ 78 milhões no Orçamento de 2023. Seu conselho deliberativo define prioridades para destinação dos recursos do FNE (Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste), que, para este ano, beiram R$ 35 bilhões.
A ex-deputada federal Marília Arraes (Solidariedade), derrotada no segundo turno para o Governo de Pernambuco, também pleiteou o posto. Por causa do estágio avançado da gravidez, ela deixou de ir a Brasília com frequência para tentar se articular.
Uma ala do PSB tentou emplacar o nome do ex-deputado federal Danilo Cabral (PSB) para a Sudene, mas o PT de Pernambuco não cedeu. O ex-parlamentar está insatisfeito com o seu partido após as eleições. A legenda acredita que é em razão de não ter tido espaço no governo federal.
Já o Banco do Nordeste tem uma disputa menos tensa. O ex-governador de Pernambuco Paulo Câmara, que deixou o PSB, foi convidado por Lula, a despeito do desejo do PT do Ceará.
Paulo Câmara, no entanto, não pode ser nomeado. Ele aguarda uma mudança na Lei das Estatais que poderá ser feita em votação no Senado, reduzindo a quarentena, atualmente em 36 meses, para ex-dirigentes partidários.
O PT do Ceará acredita que, caso não avance a articulação do Senado, possa ficar com a função. Entretanto, os petistas defendem que parte das diretorias fique com o grupo político, que tem três deputados federais no estado, além do senador e ministro da Educação, Camilo Santana, e do governador Elmano de Freitas.
Assim como nos ministérios, o governo não deve entregar de porteira fechada uma estatal do segundo escalão ao mesmo partido ou grupo político. As bancadas nem sempre chegam a consenso para apresentação de seus indicados.
Em Minas, por exemplo, senadores e deputados defendem a permanência do comando da Codevasf. Mas a bancada petista rejeita a proposta. Em casos assim, a Presidência da República é chamada a arbitrar, o que tem atrasado o processo de nomeações.
Segundo aliados, essa demora está levando à inquietação na base, também à espera de liberação de recursos para atendimento de suas emendas. Integrantes do governo temem que parlamentes apresentem suas faturas em votações de interesse do Palácio do Planalto.
RAIO-X
CODEVASF
É responsável por operacionalizar estruturas prontas na região dos rios São Francisco e Parnaíba, como saneamento, recursos hídricos, irrigação e promoção da agropecuária.
Orçamento de 2023: R$ 2,27 bilhões
2.450 servidores em exercício, sendo 790 comissionados entre efetivos e sem vínculo com a administração pública.
DNOCS
Tem como função executar políticas de amenização dos efeitos da seca, desde fornecimento e construção de caixas dágua a irrigação e assistência à população.
Orçamento de 2023: R$ 905,01 milhões
910 servidores em exercício, sendo 210 comissionados entre efetivos e sem vínculo com a administração pública.
SUDENE
Tem como objetivo promover o desenvolvimento e integração por meio de planos de investimentos públicos e privados nas áreas de infraestrutura econômica e social, capacitação de recursos humanos, inovação e difusão tecnológica, além da proteção do semiárido.
Orçamento de 2023: R$ 78,01 milhões
260 servidores em exercício, sendo 85 comissionados entre efetivos e sem vínculo com a administração pública.
Fontes: Portal da Transparência e Lei Orçamentária Anual de 2023