General Lêonidas Pires Gonçalves, ministro do Exército à época, é visto como o personagem que sinalizou a saída, pela Constituição em vigor, para a indecisão sobre quem assumiria o governo no lugar de Tancredo Neves
Do Correio Braziliense
O general Leônidas Pires Gonçalves é apontado por aqueles que estavam no Hospital de Base, na antessala da internação de Tancredo Neves, como o homem que mostrou o caminho a seguir sobre quem assumiria o comando do país com a impossibilidade do presidente eleito. Testemunhas oculares, em depoimento a historiadores, garantem que partiu dele a afirmação de que, pela Constituição, a interinidade do governo deveria ser passada ao vice-presidente José Sarney, e não ao presidente da Câmara dos Deputados, Ulysses Guimarães. O ministro João Leitão de Abreu e os juristas Affonso Arinos, Paulo Brossard e Miguel Reale reforçaram o que o militar dissera.
Gaúcho de Cruz Alta, estava à frente do III Exército (RS) quando recebeu o convite para assumir o ministério. Conforme frisa o jornalista Elio Gaspari, em A Ditadura acabada, Leônidas compunha — com Francisco Dornelles, na Fazenda; José Hugo Castello Branco, no Gabinete Civil; e Fernando Lyra, na Justiça — o eixo que “realmente contava” dos três que Tancredo estabeleceu para o governo. Nesse “primeiro time”, prestigiava-se os militares (e mantinha-se com eles o canal aberto) via Leônidas; escalava-se dois homens de total confiança (Dornelles e José Hugo) para postos-chave; e trazia-se para o centro das decisões os autênticos do MDB — por meio de Lyra.
O susto
Isso tudo esteve a ponto de ruir com a internação de Tancredo. Em depoimento ao programa Memória Política, da TV Câmara, Leônidas relata o episódio sobre a dúvida a respeito de quem tomaria posse em 15 de março de 1985. “(A posse de Sarney) tem muitos pais, mas me considero o mais legítimo deles. Porque, se fizerem um exame de DNA, verão que é o meu. Considero-me dono daquele episódio”, salientou, na entrevista de 2001.
É o general quem relata: “Tinha sido convidado para ministro e estava havendo um jantar, para mim, na Academia de Tênis. Quando toca o telefone, era o general Ivan (de Souza Mendes, escolhido por Tancredo para chefiar o Serviço Nacional de Informação/SNI). (...) Quando começou a falar, perguntei: ‘O que está acontecendo? Tua voz está horrorosa’. ‘Leônidas, o presidente está no hospital e não tem condições de assumir amanhã’. (...) Peguei o carro e me mandei para lá (...). Cheguei a uma sala onde estava um grupo de homens reunidos — o Ulysses Guimarães, o (presidente do Senado, José) Fragelli, o Sarney (...). Quando cheguei ao centro, me dei conta de qual era a discussão: quem iria assumir. (...) Disse assim: ‘Mas, qual é a dúvida? Os artigos 76 e 77 da Constituição de 1969 são bem claros: quem assume é o Sarney.’ E foi o que se decidiu. Dizem que foi o (ministro do Gabinete Civil, João) Leitão (de Abreu), que foi não sei quem… Coisa nenhuma. Ninguém discutiu. Imediatamente, foi tomada a decisão. Esse episódio
(...) é ratificado pelo Ulysses”.
Leônidas, porém, dá a entender que pairava, ainda assim, a dúvida sobre ser Sarney o interino. Segundo o general, formaram-se três grupos de pessoas que tomaram destinos diferentes. O dele seguiu para a residência de Leitão de Abreu, na Granja do Ipê.
“Quando ia entrando no automóvel, chegou um senhor que, docemente, me perguntou: ‘Poderia ir com o senhor, general?’ Estávamos indo para a casa do ministro Leitão, o presidente do Senado, que era o Fragelli; Ulysses, que era o presidente da Câmara; e eu. Olhei para os dois e não disseram nada. ‘Pode sim.’ Ele disse: ‘Sou o senador Fernando Henrique Cardoso.’ Fomos juntos. Quando chegamos lá, disse a ele qual era a finalidade daquela missão”, lembra.