O ex-governador do Tocantins Mauro Carlesse (PL) se manifestou sobre matéria do Estadão que citava inquéritos da Polícia Federal que o colocam sob suspeita de aparelhar a estrutura de Segurança Pública do Estado para supostamente barrar investigações contra seu grupo político
Do Estadão Conteúdo
As suspeitas da PF de que o ex-governador do teria aparelhado a estrutura de Segurança Pública do Estado para blindar ele próprio e seus aliados de investigações, foram ampliadas a partir do material apreendido nas Operações Éris e Hygea.
As ações, abertas simultaneamente em novembro do ano passado, foram as primeiras etapas ostensivas da investigação que atinge o ex-governador e deram novo impulso ao trabalho da PF. Carlesse renunciou ao cargo na semana passada, em meio aos inquéritos que o colocaram no centro de um escândalo de corrupção, na tentativa de escapar de um processo de impeachment.
"Em relação à matéria publicada pelo jornal "O Estado de São Paulo" e reproduzida por outros veículos de comunicação, o ex-governador do Tocantins, Mauro Carlesse, vem a público novamente negar as acusações provenientes de um relatório "parcial" da Polícia Federal, como a própria matéria relata. Ou seja, um trabalho inconcluso, divulgado novamente de maneira seletiva, em um processo sigiloso. O que comprova a intenção deste novo vazamento não ser a de elucidar os fatos, mas sim, de denegrir a imagem do ex-governador Mauro Carlesse e criar uma narrativa visando influenciar a opinião pública, objetivando resultados políticos", inicia a nota enviada à reportagem .
"A gestão do governador Mauro Carlesse no Governo do Tocantins, foi a que mais investiu em Segurança Pública na história do Estado. Equipando a Polícia Civil com novas delegacias em vários municípios, tendo implementado, inclusive, a cidade da Polícia Civil, em Palmas. Novas armas, viaturas, equipamentos, tecnologia, cursos. Enfim, todo o apoio necessário para o que trabalho de investigação e inteligência fossem executados a contento dos profissionais e que pudessem atender as necessidades da população."
"Na gestão Carlesse foi criada a Diretoria de Combate à Corrupção (DRACCO), mais equipada e dotada de toda autonomia para executar suas funções. Durante o governo Carlese nenhuma investigação teve qualquer interferência da gestão, sendo que nunca houve troca de presidência de inquéritos e as devidas denúncias foram oferecidas à Justiça, de acordo com as investigações."
"Em relação ao Núcleo de Inteligência do Detran, o mesmo foi implementado para combater a corrupção em um órgão muito visado por quadrilhas especializadas em clonagem de veículos e outros delitos ligados à documentação de carros e obtenção de carteiras de habilitação. Durante a gestão Carlesse, as investigações do Núcleo de Inteligência, em parceria com o Gaeco do Ministério Público do Tocantins, combateram tais crimes, resultando em diversas operações com prisões, até mesmo de servidores do órgão, suspeitos de integrarem os esquemas criminosos, de acordo com as investigações."
"Muito diferente do afirmado na reportagem com base no relatório 'parcial', sobre perseguição a adversários políticos, uma vez que as ilações divulgadas não se comprovam ao serem confrontadas com fatos ocorridos no período. Por fim, o ex-governador Mauro Carlesse lamenta o uso político dessa investigação e o vazamento seletivo dos relatórios ainda inconclusos. Na legislação brasileira, quem faz acusações precisa apresentar provas, o que até o momento não tem ocorrido em relação à gestão Mauro Carlesse à frente do Governo do Tocantins. Mas sim, o uso sistêmico de parte da imprensa para reportar afirmações desprovidas de documentação verídica, que sustentem tais ilações", finaliza o texto.
Relatório
O Estadão teve acesso ao relatório parcial do caso, enviado em dezembro do ano passado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que a Polícia Federal expõe o conteúdo obtido nos documentos e celulares confiscados para reafirmar que o sistema de interceptação telefônica e o aparato de inteligência da Secretaria de Segurança Pública foi usado de 'maneira aparentemente criminosa, com a finalidade de blindar os membros da organização criminosa e dos integrantes do seu grupo político'.
"Era patente o interesse em acompanhar as investigações da Polícia Civil do Tocantins relacionadas aos crimes contra a administração pública do Estado", diz um trecho do documento assinado pelos delegados federais Duílio Cardoso, Tiago dos Santos Souza e Mauro Frenando Knewitz.
A partir das conversas obtidas e de depoimentos colhidos após a deflagração das operações, os delegados apontaram duas estratégias principais que seriam usadas pelo grupo político do ex-governador para se proteger de investigações: o monitoramento constante dos trabalhos da Polícia Civil; e o uso do sistema de interceptações telefônicas, que ficava subordinado à Secretaria de Segurança Pública, para verificar se seus celulares estavam sendo grampeados.
"Acompanhamento dos monitoramentos telefônicos em curso em Tocantins com o propósito de se identificar a existência de inquéritos policiais que possam atingir membros da ORCRIM e demais integrantes do grupo político de Mauro Carlesse, vazamento de informações sobre possíveis investigações em desfavor de integrantes do governo estadual e monitoramento de adversários políticos era algo corriqueiro", escrevem os delegados.
A PF encontrou diversos pedidos do ex-secretário de Segurança do Estado, Cristiano Barbosa Sampaio, ao então diretor de Inteligência e Estratégia da pasta, Ênio Walcacer de Oliveira Filho, para consultar números de telefone ligados a Mauro Carlesse e a outros membros do governo, como o então secretário-chefe da Casa Civil Rolf Vidal. Atualmente, Sampaio ocupa o cargo de coordenador-geral de pesquisa e inovação da Diretoria de Políticas de Segurança Pública no Ministério da Justiça.
O deputado estadual Olyntho Neto (PSDB) também teria sido beneficiado pela aparelhagem do sistema. Segundo os investigadores, ele influenciava nomeações para funções comissionadas na Secretaria de Segurança Pública e remoções na Polícia Civil.
De acordo com o relatório, os delegados de Polícia Civil responsáveis por investigações sensíveis ao grupo político de Mauro Carlesse eram considerados "opositores da alta cúpula do governo" e passaram a ser perseguidos, inclusive por meio da Corregedoria da corporação.
Como mostrou o Estadão, o ex-governador passou a indicar aliados para postos-chave no sistema de Segurança Pública do Tocantins ao mesmo tempo em que promovia mudanças no regramento que dispõe sobre a movimentação funcional de delegados, através de decretos, portarias e emendas constitucionais, tudo com o objetivo de obstruir as apurações em curso, segundo a PF.
O material apreendido também permitiu que a Polícia Federal pudesse aprofundar a linha de investigação sobre o possível uso do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) para produzir investigações paralelas e ilegais contra adversários políticos. A PF trabalha com a suspeita de que o governador tenha montado um núcleo de inteligência no órgão para municiar dossiês contra seus opositores. O controle ficaria ao cargo do sobrinho dele, Claudinei Quaresemin, apontam as mensagens acessadas pela Polícia Federal.
Outras defesas
A reportagem entrou em contato com o gabinete do deputado estadual Olyntho Neto e aguarda resposta. O espaço está aberto para manifestação.
Os advogados José Eduardo Cardozo e Pedro Bernardes Neto, que representam o ex-secretário Cristiano Barbosa Sampaio, se manifestaram por meio de nota.
"O atual momento processual apresenta conclusões preliminares por parte da investigação, que não condizem com a realidade. Nesse contexto, a defesa tem a convicção de que, ao final do processo, todas as acusações serão desconstruídas e restará demonstrado que o Del. Cristiano Barbosa, cuja atuação profissional sempre foi marcada pela distinção e ética, não praticou qualquer ato ilícito."
Fonte: Estadão Conteúdo