No caminho de Eduardo Bolsonaro para ser embaixador nos EUA está: STF, voto secreto e renúncia

Posted On Sexta, 12 Julho 2019 04:42
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Donald Trump, Eduardo e Jair Bolsonaro na reunião do G-20, no Japão, no mês passado: deputado é quase um chanceler informal. Donald Trump, Eduardo e Jair Bolsonaro na reunião do G-20, no Japão, no mês passado: deputado é quase um chanceler informal. Foto: Reprodução/Instagram Eduardo Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro disse nesta quinta-feira (11) que seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL do Rio, "está no radar" para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos – o convite, inclusive, já teria sido feito. "No meu entender, poderia ser uma pessoa adequada e daria conta em Washington”, declarou Bolsonaro, após solenidade de posse do novo diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

 

Por Leonardo Desideri

 

Embora inusitada, a possível indicação de um filho do presidente da República, que nunca exerceu cargo de diplomata, para o posto de embaixador dos Estados Unidos não é expressamente proibida pela Constituição, ainda que possa haver controvérsia no STF sobre a questão – o ministro Marco Aurélio Mello diz que o caso se enquadra na definição de nepotismo.

 

A Lei nº 11.440, que aborda a nomeação para cargos públicos exercidos no exterior, diz inicialmente que "Chefes de Missão Diplomática Permanente serão escolhidos dentre os Ministros de Primeira Classe ou (…) dentre os Ministros de Segunda Classe", isto é, entre diplomatas de carreira.

No entanto, logo em seguida, abre uma exceção: "poderá ser designado para exercer a função de Chefe de Missão Diplomática Permanente brasileiro nato, não pertencente aos quadros do Ministério das Relações Exteriores, maior de 35 anos, de reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao País".

 

Por ter acabado de completar 35 anos (nasceu no dia 10 de julho de 1984), o terceiro filho de Jair Bolsonaro tem a idade mínima exigida para o cargo de embaixador. Portanto, já poderia ser indicado para o posto, que está vago desde abril. O embaixador Sérgio Amaral, que liderava a embaixada de Washington até então, foi removido do cargo, sob a alegação do presidente Bolsonaro de que a imagem do Brasil estava ruim no exterior.

 

Sinais, fortes sinais

Há vários sinais de que a indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador tem sido pavimentada há meses. Em primeiro lugar, ele tem acompanhado o pai em diversas viagens diplomáticas, pelo que tem sido chamado na mídia de "chanceler informal" do presidente. Usando seu inglês fluente, estabeleceu contato com diversas lideranças estrangeiras, acompanhado ou não do pai, em viagens a países como Estados Unidos, Hungria, Itália, Chile e Suíça.

 

Além disso, desde 13 de março, Eduardo é presidente da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. Pelo próprio cargo que exerce, boa parte de suas declarações públicas têm sido sobre a política externa do Brasil.

 

O forte alinhamento com as ideias do atual presidente dos EUA, Donald Trump, e, em especial, a afinidade com suas estratégias de política externa são outro sinal de que Eduardo não é um nome improvável para a embaixada dos EUA. Foi o deputado quem primeiro cogitou, em novembro do ano passado, a possibilidade de o Brasil se alinhar aos Estados Unidos no reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel.

 

Em seguida, viajou aos EUA para visitar Steve Bannon, ex-estrategista da campanha de Trump. Em outra viagem aos Estados Unidos, em fevereiro deste ano, participou de uma festa organizada por apoiadores de Trump. No mês seguinte, na reunião de Bolsonaro com o presidente dos EUA, foi Eduardo quem esteve presente com o pai na sala, em vez do Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.

 

Votação no Senado

Nesse momento, a indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador depende só da vontade do pai. O presidente da República deve encaminhar um nome indicado pelo Itamaraty à Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado, que aprova ou rejeita o nome em votação secreta. Depois, o nome ainda tem que ser aprovado por maioria simples pelo plenário do Senado, em outra votação secreta.

 

Pesa a favor de Eduardo Bolsonaro o fato de que o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da CRE, tem boa relação com o presidente. Trad acompanhou Bolsonaro na comitiva que visitou Trump em março. Em entrevista à Folha de S.Paulo nesta quinta, o senador criticou os colegas que acusam o presidente da República de nepotismo.

 

"Viajei com eles para os Estados Unidos. Notei lá uma desenvoltura bastante firme dele [Eduardo]. Alguns eventos, ele mesmo que organizou. Para mim, ele vai surpreender e vai desempenhar com muito êxito esta nova missão desde que tudo possa ser superado e preenchido", afirmou.

 

Há risco de nepotismo?

A sugestão de nepotismo é o grande entrave para a indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador. Ainda que não haja uma proibição expressa na Constituição impedindo o presidente de indicar o filho para o cargo, o impacto na opinião pública e a forte oposição que enfrentará no Senado por conta do parentesco com o indicado podem fazer Bolsonaro mudar de ideia.

 

Além disso, o nome de Eduardo precisará ser aprovado no Senado, o que, ultimamente, parece pouco favorável a seu pai. Recentemente, a Casa derrubou o decreto de porte de armas de Bolsonaro por 47 votos a 28. "É um escândalo total. Tenha certeza que o governo Bolsonaro terá o primeiro caso de rejeição de embaixador. É um caso flagrante de nepotismo que não pode ser aceito", disse o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que é membro da CRE.

 

Rodrigues disse que ingressará com uma ação no Supremo Tribunal Federal caso ocorra a indicação. Se isso ocorrer, tudo pode se complicar. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro Marco Aurélio Mello disse que uma eventual indicação do deputado Eduardo Bolsonaro para a embaixada americana é um “péssimo” exemplo” e um “tiro no pé”, podendo ser enquadrada como nepotismo.

 

Jurisprudência

Em fevereiro de 2017, Marco Aurélio deu liminar suspendendo a nomeação de Marcelo Hodge Crivella para o cargo de secretário-chefe da Casa Civil da gestão do pai dele, Marcelo Crivella (PRB), na Prefeitura do Rio, por entender que se tratava de nepotismo.

 

Uma súmula vinculante do STF estabelece que viola a Constituição Federal a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, “inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas”.

 

"Se for da vontade do presidente, eu aceito"

Em coletiva de imprensa nesta quinta, Eduardo Bolsonaro admitiu que pode ser alvo de críticas, mas acredita que há um entendimento do STF que, em casos análogos a esse, não configuraria uma nomeação ilegal.

 

"A possibilidade pode ocorrer, mas a primeira análise que fizemos aqui é que não se enquadraria nisso. Seria uma indicação igual como de um presidente indicar um ministro. Estaria fora da súmula vinculante. Fora da questão do nepotismo", disse.

 

Para Eduardo Bolsonaro, a indicação de um filho do presidente para o cargo de embaixador vai ser bem vista pelo governo americano. Ele disse que tem todas as credenciais para assumir o cargo, apesar de não ser um diplomata de carreira.

 

"Se for da vontade do presidente e ele realmente me entregar essa função de maneira oficial, eu aceitaria", afirmou Eduardo, que terá de renunciar ao cargo de deputado federal."