O Aviso de Moro

Posted On Domingo, 03 Abril 2022 05:55
Avalie este item
(0 votos)

Por Cristovam Buarque*

 

Qualquer observador lúcido da política percebe a possibilidade de vitória eleitoral do atual presidente e tem consciência das consequências perigosas desta reeleição para o futuro. Desta vez a eleição não será apenas dele como pessoa física, mas dele como pessoa jurídica: propósitos e estilos de seu governo. Apesar disto, todos se comportam como os personagens teatrais: guiados por um roteiro que leva ao final trágico, que não se deseja.

 

Apesar de alertas do ex-presidente Lula, os militantes do PT passam a impressão de que a eleição está ganha, de que os erros, malfeitos e falta de bom senso do Bolsonaro são tão gritantes, que a maioria não votará nele. Esquecem que, de um lado, há dezenas de milhões que veem estes erros como acertos e por isto votam nele com convicção de que estão elegendo o melhor para o Brasil. De outro lado, há dezenas de milhões que rejeitam Bolsonaro, mas ainda preferem os erros dele aos erros do PT. O que o PT acha erro do Bolsonaro, os eleitores dele consideram acertos, e o que o PT vê como seus acertos, muitos veem como erros. Até mesmo o Lula, apesar de sua sensibilidade, algumas vezes fala tão para dentro de seu grupo, ao ponto de defender posições que alienam eleitores. O PT parece não entender que ninguém é eleito apenas com os votos de seus correligionários. A democracia exige ampliar apoio para além de suas fronteiras. Com um discurso fechado, dificilmente se ganha e se ganhar dificilmente governa um país com a complexidade de nosso Brasil.

 

Além do risco de reeleger o governo Bolsonaro por causa do “salto alto” e do isolamento do PT, os demais opositores ao Bolsonaro facilitam esta reeleição ao se deixarem guiar por um antipetismo que anula o antibolsonarismo. A soma destes dois comportamentos, pode induzir o voto nulo em uma quantidade que provoque um resultado que não se deseja. Ou dizem não desejar. Não têm vontade de reeleger Bolsonaro, mas não têm vontade de eleger o Lula.

 

Os discursos da chamada “terceira via” levam os eleitores que não desejam a continuação do Bolsonaro a não aceitarem a volta do Lula.

 

A própria “terceira via” é sobretudo um “terceiro muro” para barrar a eleição de Lula, construído com tijolos de antipetismo. O PT precisa reconhecer que estes tijolos estão entranhados no sentimento de dezenas de milhões de eleitores. Justo ou não, há um sentimento de que houve corrupção, aparelhamento, manipulação. Lula e o PT serão responsáveis pela derrota se não forem capazes de dissolver este sentimento dos eleitores, mas os demais líderes opositores ao Bolsonaro também serão responsáveis se continuarem deixando-se guiar pelo antipetismo e consolidando o “terceiro muro”.

 

Se as próximas pesquisas indicarem que os eleitores de Moro optaram por Bolsonaro, ficará claro que a “terceira via” pode ser mais bolsonarista do que lulista. Afinal, em 2018, seus atuais candidatos votaram no Bolsonaro ou se omitiram durante o processo eleitoral. Foi uma opção grave, porque se sabia quem era a pessoa física de Bolsonaro, agora seu governo tem alma, e ela está disputando continuar. Todos que desejam evitar esta tragédia, e dar os passos necessários à reunificação, recuperação e reconstrução do Brasil precisam derrubar impedir esta continuação. Para isto, o primeiro passo é derrubar o muro do antipetismo e construir uma estrada para o futuro, sem arrogância nem preconceitos, com discurso e comportamento de unidade pelo Brasil.

 

Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador*