Texto que vai ser analisado pela CCJ do Senado abre brecha para aprovação de falhas milionárias na prestação de contas de partidos e aumenta rigidez com institutos de pesquisa
Por Gabriel de Sousa
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado vai começar a discutir nesta terça-feira, 8, a proposta de um novo Código Eleitoral. O texto, que tem 464 páginas, abre brecha para aprovar prestação de contas com falhas milionárias dos partidos. Além disso, o texto aumenta a rigidez com institutos de pesquisa e campanhas eleitorais no ambiente virtual.
Durante as auditorias, que serão coordenadas por servidores da Justiça Eleitoral, as instituições poderão solicitar esclarecimentos. Eventos públicos para testes de segurança também deverão ser ofertados para a população.
Novos prazos de inelegibilidade
O novo código estabelece que o prazo de inelegibilidade passará a ser de oito anos a partir do ano posterior à eleição onde teriam cometido um crime eleitoral e não mais a data do primeiro turno do pleito.
Por exemplo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está inelegível, após decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), até o dia 2 de outubro de 2030, ou seja, oito anos após o primeiro turno de 2022. Se a condenação ocorresse após a aprovação do Código Eleitoral, a punição valeria até 1º de janeiro de 2031.
Desincompatibilização de juízes e militares
Se quiserem se candidatar a cargos públicos, juízes, membros do Ministério Público, policiais federais, rodoviários federais, civis e militares, guardas municipais e membros das Forças Armadas deverão se afastar de seus cargos quatro anos antes da eleição pretendida.
Atualmente, a regra é de que esses servidores públicos devem deixar os cargos entre três a seis meses antes do pleito, dependendo da função exercida.
Para os demais servidores, o Código estabelece que o candidato deve se afastar da função logo após a escolha do nome em convenção partidária.
Crimes eleitorais e cassação de mandato
O código prevê multa para os seguintes crimes eleitorais:
Fraude
Abuso do poder econômico ou político
Uso indevido dos meios de comunicação social
Captação ilícita de sufrágio
Corrupção eleitoral
Condutas vedadas aos agentes públicos
Condutas vedadas na internet
Doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha
O texto também busca preservar os mandatos dos políticos eleitos e estabelece que a cassação deve ocorrer apenas quando for reconhecida "gravidade das circunstâncias", como a possibilidade de influência no resultado da eleição. Os critérios são:
Ocorrência de violação de norma jurídica
Comportamento do candidato beneficiado no contexto da prática ilícita
Presença de alguma forma de violência
Categoria, alcance e intensidade da transgressão apurada
Probabilidade de nexo causal entre a conduta ilícita e o resultado das eleições
Crimes eleitorais na internet
Candidatos vão poder impulsionar conteúdos em redes sociais para a divulgação de pré-campanha, desde que não ultrapasse 10% do limite de gastos para o cargo pretendido.
Outra novidade sobre a campanha digital é que as ordens judiciais para remover conteúdos na internet ocorrerão apenas se forem constatadas violações às regras eleitorais. Entre as condutas políticas estão:
Não informar ao eleitor quando determinada propaganda política utiliza inteligência artificial;
Disseminação de fatos falsos que podem impedir o exercício do voto, deslegitimar o processo eleitoral ou atentar contra a igualdade de condições entre os candidatos;
Divulgar mensagens de ódio contra candidatos, partidos ou coligações com contas falsas, ou anônimas;
Invasão hacker contra perfis de candidatos, partidos ou coligações;
Disparos em massa de conteúdos não solicitados ou não autorizados por usuários sem relação pessoal ou profissional com o candidato, através do uso de recursos de automação;
Cotas para mulheres e negros
O código determina que 30% do valor aplicado pelos partidos nas campanhas deverá ser destinado às candidaturas femininas. Também deverá ser feito uma distribuição proporcional de candidatos negros e mulheres.
A Justiça Eleitoral deverá informar, até o início do prazo de campanha, os valores a serem aplicados nas campanhas de candidatas e também a distribuição proporcional para candidatos negros e mulheres. Os repasses, por sua vez, deverão ser feitos pelas siglas até 30 de agosto.
Violência política contra a mulher
Foi incluído o crime de violência política contra a mulher, configurado em toda ação ou omissão que busque prejudicar o exercício do direito político de uma candidata ou política com mandato eletivo.
A pena será de um a quatro anos de reclusão e multa, agravada em um terço se a violência for cometida contra gestantes, maiores de 60 anos, pessoas com deficiência ou pessoas negras, se ocorrer na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da ofensa.
Assinaturas necessárias para a criação de partidos
Atualmente, é preciso coletar 0,5% dos votos válidos para a última eleição para a Câmara dos Deputados para se criar um partido político. Com o texto, o número será triplicado para 1,5%.
Hoje, um partido político precisa de 965.977 assinaturas para ser criado, considerando os mais de 123 milhões de votos para deputado em 2022. Se o Código for aprovado, esse número passaria para 2.897.933 assinaturas.
Além disso, hoje é preciso ter, em pelo menos um terço dos Estados, 0,1% do eleitorado que votou na última eleição para a Câmara como assinante. No novo projeto, o porcentual sobe para 1%.
Mudança no funcionamento do TSE
Houve também mudanças na funcionalidade do TSE. Agora, a classe dos advogados (dois dos sete ministros) deverão respeitar a presença de ambos os sexos na lista de pretendentes. Não poderá haver membros do Ministério Público, magistrado aposentado e defensor que tenha sido filiado a um partido nos quatro anos anteriores à indicação.
O texto também delimita que as decisões judiciais e administrativas do TSE que modifiquem a jurisprudência da Corte deverão observar a anualidade eleitoral. Ou seja, não vai valer na eleição que seja realizada até um ano da data da vigência, exceto se buscar proteger a elegibilidade de candidatos.
Novo formato de preenchimento de vagas
Se o projeto for aprovado, apenas os partidos que tenham alcançado votação equivalente a 100% do quociente eleitoral poderão participar da segunda fase de distribuição de vagas nas eleições para deputados e vereadores.
Atualmente, todos os partidos que tenham obtido votação igual ou superior a 80% do quociente partidário e que tenham candidatos que alcançaram 20% ou mais do quociente eleitoral podem participar. O relatório também garante a todos os partidos a disputa pela terceira fase de distribuição de vagas.
O quociente eleitoral é calculado dividindo a quantidade de votos válidos para determinado cargo pelo número de vagas para aquele cargo. Já o quociente partidário é feito dividindo a quantidade de votos válidos para determinado partido ou federação pelo quociente eleitoral.