A Polícia Federal, instituição com maior credibilidade junto à população brasileira, se rebela contra o seu diretor-geral, nomeado por Temer e que deu declarações que colocam em dúvida a confiabilidade da corporação. Indignados, delegados se rebelaram e publicaram documento em que Afirmam que não vão ceder às pressões políticas. A saída de Segóvia foi pedida pelo senador Randolfe Rodrigues.
Enquanto isso, após a violência exacerbada que tomou conta do estado do Rio de Janeiro nos últimos dias, o presidente Michel Temer resolveu decretar intervenção militar no estado. Forças Armadas vão passar a atuar com poder de polícia e comando afirma que consequências serão “inéditas”.
'CRISE DE CONFIANÇA' EM SEGOVIA É 'GRAVE' E VAI DEMORAR A PASSAR, DIZ PRESIDENTE DE ASSOCIAÇÃO DE DELEGADOS
O presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), Edvandir Felix de Paiva, afirmou nesta quinta-feira (15) que a "grave crise de confiança" gerada pelas recentes declarações do diretor-geral da PF, FernandoSegovia, vai "demorar a passar".
Para o delegado, serão necessárias ações concretas para encerrar o mal-estar gerado dentro da corporação.
O presidente da ADPF informou que a associação apoia o memorando elaborado por delegados que atuam no Supremo Tribunal Federal (STF), em que afirmam que não admitirão interferências no trabalho realizado nas investigações, incluindo a que envolve o presidente Michel Temer.
"Considero extremamente salutar a carta dos delegados da GInq [Grupo de Inquérito]. É uma demonstração de força da PF como instituição", destacou Edvandir.
O diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal, Eugenio Riccas, elaborou resposta ao memorando dos delegados e afirmou que é dever da PF inserir, inclusive nos autos, qualquer tentativa de pressão que ameace a imparcialidade e a liberdade de atuação dos policiais.
RANDOLFE PEDE SAÍDA DE SEGÓVIA
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) entrou com uma ação na Justiça na qual pede a saída de Fernando Segovia do cargo de diretor geral da Polícia Federal (PF). O pedido foi feito na quarta-feira, na 22ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF), por meio de uma ação popular.
Além de citar a recente entrevista concedida por Segovia à agência de notícias Reuters, na qual o diretor indicou que a tendência é que as investigações contra o presidente Michel Temer sobre o Decreto dos Portos sejam arquivadas, o senador afirma que a nomeação por Temer e a permanência de Segovia no cargo configuram “ofensa à moralidade administrativa” e “desvio de finalidade”.
Randolfe argumenta que Temer nomeou Segovia “sob intensa suspeição a propósito de suas intenções nessa alteração de comando” da Polícia Federal. “Tal suspeição fundada se deu em razão de a cúpula do governo já não disfarçar sua insatisfação com o curso das investigações da chamada ‘operação Lava Jato’, chegando o seu líder no Senado a manifestar a intenção de ‘estancar a sangria’ e de fazer ‘um grande acordo nacional’”, disse o senador, referindo-se às declarações ditas entre o senador Romero Jucá (MDB-RR) e ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.
Fora da agenda. No pedido feito à Justiça, o senador Randolfe Rodrigues lembrou que o presidente da República, Michel Temer, recebeu Fernando Segovia em “agendas não públicas”.
INVESTIGAÇÕES VÃO AVANÇAR, DOA A QUEM DOER', DIZ DELEGADO DA PF
Em uma resposta a integrantes do Grupo de Inquéritos do Supremo Tribunal Federal (Ginq-STF), o delegado Eugênio Ricas, Diretor de Investigações e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal, afirma que "os policiais não podem ser afastar" dos princípios que norteiam o trabalho da corporação. Em um despacho emitido nesta quinta-feira (15), Eugênio afirma que "as investigações vão avançar, doa a quem doer".
O documento ocorre após delegados que integram o Ginq, que atuam nos processos envolvendo autoridades no STF, informarem, por meio de memorando, que vão denunciar "qualquer tipo de interferência em seu trabalho". A crise na corporação teve início após o diretor-geral da PF, Fernando Segóvia conceder uma entrevista à agência Reuters fazendo referência ao suposto arquivamento do inquérito contra o presidente Michel Temer.
No despacho, o delegado Eugênio concorda com as alegações do colegas. "Os dispositivos legais citados são muito mais que prerrogativas, são mandamentos legais, dos quais, em nenhuma hipótese, nós, policiais federais, podemos nos afastar... As investigações vão avançar, doa a quem doer", ressalta.
PEC QUE DÁ AUTONOMIA À PF MOFA HÁ NOVE ANOS NA CÂMARA
As declarações do diretor geral da Polícia Federal (PF), Fernando Segovia, na última semana, apontando a tendência de arquivamento das investigações sobre o presidente Michel Temer (MDB) referente ao Decreto dos Portos, reavivaram em parte da corporação o desejo de que o projeto que dá autonomia funcional, administrativa e orçamentária à PF volte à pauta no Congresso. O texto, arquivado duas vezes anteriormente, no entanto, parece não ser de interesse dos parlamentares, já que tramita há nove anos na Câmara dos Deputados.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pelo então deputado federal e ex-secretário de Saúde de Minas Gerais Alexandre Silveira (PPS), prevê a inclusão na Constituição de um artigo que garanta a autonomia funcional e administrativa da PF, nos moldes do Ministério Público. A partir dessa possibilidade, a instituição ganharia independência para elaborar sua proposta orçamentária. Os detalhes das normas desses novos “poderes” para o órgão, porém, dependeria de lei complementar.
Alvo de críticas e de divergências dentro da própria corporação, a proposição vem sendo adiada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. De acordo com o presidente do colegiado, Rodrigo Pacheco (MDB-MG), pelo fato de o tema ser polêmico, é preciso se construir um acordo entre os parlamentares antes da votação.
“Eu tinha me comprometido a colocar essa proposta em pauta novamente e coloquei. No entanto, junto com essa matéria, estávamos discutindo também outra PEC que, pretende criar uma polícia única nos Estados e extinguir as atuais polícias militares. Ambas são polêmicas, por isso, por decisão dos próprios deputados, foi retirado de pauta para construir um acordo de aprovação da admissibilidade da proposta”, destacou. “Houve um desinteresse também deles (dos parlamentares), alguns eram contrários por conta de o texto definir uma autonomia indefinida”, acrescentou Pacheco.
O relator da proposição na CCJ, deputado João Campos (PRB-GO), apresentou parecer favorável à aprovação da PEC argumentando que o Ministério Público e a Defensoria Pública já possuem a mesma autonomia pleiteada pela PF. O parlamentar, contudo, culpa Pacheco por colocar duas matérias complexas em pauta.
“Temos diversas variáveis, tem que se ver o momento adequado e as articulações de cada época, mas essa estratégia foi para inviabilizar a votação, não existe acordo entre as duas propostas. A questão da PM é muito mais delicada, já a questão da PF é um passo decisivo para aperfeiçoamento do Estado democrático de direito no Brasil, é uma medida importantíssima para o enfrentamento da criminalidade”, pontuou.
MILITARES SE PREPARAM PARA OPERAÇÃO INÉDITA COM INTERVENÇÃO NO RIO
Os comandantes militares foram avisados no início da madrugada de uma ação inédita - pelo menos desde a Constituição de 1988 - para a caserna. Com o decreto de Michel Temer, na prática, o chefe do Rio de Janeiro agora é o general Walter Souza Braga Neto, do comando militar do Leste. O homem, responsável pela segurança da Olimpíada de 2016, terá ascendência sobre o próprio governador do estado, Luiz Fernando Pezão.
Neste momento, a cúpula do Exército está reunida em Brasília e, em linha com Braga Neto, a partir de viva-voz, tentará traçar as primeiras ações efetivas para a segurança do Rio de Janeiro. Os detalhes do planejamento serão definidos portanto a partir de agora. Por mais que a situação calamitosa do Rio de Janeiro fosse evidente, mesmo os militares de alta patente foram surpreendidos com a intervenção nos moldes que se desenha.
“Mesmo no passado recente, em operações no Espírito Santo, o governador e o secretário de Segurança mantiveram o controle. Agora é diferente”, disse um militar da cúpula da Forças Armadas ao Correio. Ele se refere à transferência do controle da segurança no estado capixaba para as Forças Armadas ocorrida em fevereiro do ano passado. Mas, mesmo naquele momento, o governador em exercício César Colnago deixou claro que a ação militar seria coordenada em conjunto com a secretária de segurança.
Desta vez, no Rio de Janeiro, as circunstâncias são diferentes. O chefe da operação será um militar. Toda a segurança do Rio ficará à espera das ordens de Braga Neto. É algo tão inédito que ninguém ainda consegue prever a repercussão.