ANÁLISE POLÍTICA NACIONAL
A semana que se avizinha pode ser uma das mais importantes da história do Brasil. A abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma, mesmo feita de forma hedionda e cheia de oportunismo e politicagem por Eduardo Cunha, deu início a uma corrida de negociações, negociatas e conversas de alcova que nem a grande mídia está conseguindo acompanhar da forma que gostaria.
Por Edson Rodrigues
Enquanto partidos de oposição ao governo se posicionam contra o impeachment, antigos aliados venais se distanciam do Planalto a despeito dos cargos que têm no governo, numa “dança das cadeiras” maluca para definir posicionamentos e dar respostas à opinião pública, que estão deixando os analistas políticos dos principais veículos de comunicação do País sem saber pra quem ligar ou pra que fonte recorrer.
O que era branco, ficou preto, o que era vermelho ficou azul e as cores partidárias vão-se misturando numa paleta de cores tão complexa que nem Picasso saberia a qual nuance recorrer para pintar o “quadro do panorama político brasileiro”.
O Paralelo 13, na busca incessante de deixar seus leitores bem informados destaca neste artigo os principais movimentos dos últimos dias, lembrando sempre ao eleitor que “política é como nuvem. Uma hora está de um jeito e, no momento seguinte, já mudou de forma”.
Então, vamos lá.
EDUARDO CUNHA, O FUNESTO PIVÔ DO IMPEACHMENT
Pela Constituição, coube ao comandante da Câmara dos Deputados aceitar ou negar os pedidos de impedimento apresentados contra o presidente da República. O deputado Eduardo Cunha deu seguimento ao recurso formulado pelo jurista Hélio Bicudo, pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior e pela advogada Janaina Paschoal. Eles alegam que Dilma cometeu crime de responsabilidade ao praticar as chamadas pedaladas fiscais e gastar recursos sem a devida autorização prévia do Congresso. Caberá aos deputados corroborar tais alegações, o que levará à abertura de processo de impeachment contra a petista, ou rechaçá-las, o que resultará no arquivamento do caso. Em tese, será discutida uma questão meramente técnica. Na prática, o impeachment é um processo essencialmente político, que refletirá as convicções de cada parlamentar. Ao fim e ao cabo, são eles que decidirão se Dilma ainda tem condições e autoridade para continuar à frente do cargo para o qual foi eleita com 54 milhões de votos.
Um exemplo do que está por vir no terreno das manipulações pôde ser visto logo nos primeiros minutos após Eduardo Cunha anunciar a admissão do processo de impeachment. O deputado foi chamado de corrupto e chantagista e acusado de agir motivado pelo nada nobre instinto de vingança. Esses argumentos encontram amplo respaldo nos fatos, mas são usados de maneira ardilosa para tentar confundir os brasileiros. Dilma e Cunha são adversários figadais. A presidente disse que não era ladra, numa referência indireta ao fato de o deputado ter sido acusado de embolsar propinas do petrolão. Cunha reagiu, chamando a petista de "mentirosa" por ter declarado que jamais ofereceu a ele um acordo de proteção mútua.
A decisão sobre o futuro da presidente não cabe mais a Eduardo Cunha nem a negociatas de caráter pessoal. A presidente sabe disso e quer que o Congresso analise o seu impedimento o mais rapidamente possível. Os agentes econômicos concordam com esse sentido de urgência. O simples início da tramitação do caso fez a cotação do dólar cair e a Bolsa subir, puxada pela valorização das ações de empresas controladas pelo governo.
Toda essa situação mostra que Dilma está sitiada, acuada principalmente com ações do seu “criador” Lula, que se mostra mais preocupado, agora, em salvar sua tão amada e “ilibada” legenda, o PT.
Essa movimentação interna no PT, muito próxima do “fogo amigo”, indica que dificilmente Dilma permanecerá no poder, pois o apoio de Michel Temer, que a presidente contava como certo, fica cada dia mais longe, uma vez que seu vice-presidente acaba de fechar um acordo com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmim e com os senadores Aécio Neves, José Serra e Aluysio Nunes. Esse acordo inclui a promessa de que, uma vez empossado presidente da República, Teme não se candidataria a uma reeleição, deixando o caminho aberto para o PSDB, finalmente, emplacar seu presidente, ficando o PMDB novamente na situação de coadjuvante do poder e “arrendatário” de cargos e ministérios.
Essa movimentação de Temer mostra que o processo de debandada do PMDB do governo de Dima Rousseff está acelerado e que, mesmo com o monitoramento palaciano sobre a questão, o PMDB já definiu seu posicionamento.
KÁTIA ABREU, A FIEL
A única certeza do Planalto em relação ao PMDB é que a senadora e ministra Kátia Abreu permanecerá como ferrenha defensora do governo de Dilma Rousseff e, talvez, a única interlocutora entre as partes.
Kátia, assim como Marcelo Miranda, representam o Tocantins nesse processo e já manifestaram a sua fidelidade e contrariedade á ação de Cunha, ao impeachment, da maneira como foi colocado. Mas isso não significa que, em o rito do impeachment tendo continuidade, legitimado pela Justiça, ou a ação no TSE apontar para a queda de Dilma, os dois vão fincar o pé no apoio à Dilma.
O posicionamento de Kátia e de Marcelo é perfeito em relação à constituicionalidade e à maturidade política do dois.
Por mais que se tenha pressa em derrubar Dilma, eles estão do lado do respeito à constituição.
Se a situação se mostrar irreversível, eles terão feito sua parte pela democracia e estarão livres para se posicionar de acordo com os rumos da constitucionalidade aplicada ao caso.
AS SEMELHANÇAS COM COLLOR
O cenário do impeachment de Fernando Collor guarda semelhanças com o momento vivido hoje pela presidente Dilma Rousseff. Com a base política em frangalhos, Dilma, assim como Collor, terá de enfrentar um processo de impeachment em meio a uma crise econômica brutal. Em 1992, o ambiente inflamável embalava as manifestações de rua, exatamente como agora. Àquela altura, Collor amargava um índice de aprovação de apenas 9%, o mesmo ostentado por Dilma hoje.
Tal como Dilma e o PT, Collor também se dizia alvo de um golpe, apesar do caráter constitucional do processo. “As manobras para o meu afastamento interessam aos recalcados, complexados e invejosos que formam o sindicato do golpe”, afirmava o então presidente. Líder do PT, José Dirceu assumia postura oposta. “Não se faz impeachment na Câmara e no Senado. Ele acontece na sociedade”, disse o ex-ministro à época num discurso que hoje seria tachado de “golpista” pelos petistas.
Hoje, Dilma alardeia que “não é ladra”, mas há suspeitas de que sua campanha foi irrigada com dinheiro desviado do Petrolão. Mas o que pode derrubá-la é o crime de responsabilidade, fruto das manobras fiscais destinadas a maquiar o orçamento. Responsabilidade também nunca foi um predicado que pudesse ser atribuído a Collor.
A DIVISÃO PARTIDÁRIA
Mais que situação e oposição, o país se divide entre os que desejam e os que não desejam o impeachment de Dilma – e que exercerão pressão sobre o Congresso. Entre os que não querem sua queda estão, claro, os governistas, que desejam continuar no poder. Também grande parte dos oposicionistas – os que apostam numa vitória fácil em 2018, caso o governo mantenha o desempenho desastroso que vem tendo até agora, no segundo mandato de Dilma, com seus baixíssimos índices de popularidade. E também a fatia do setor produtivo que acredita que um impeachment abalaria ainda mais a confiança dos investidores em relação ao Brasil.
Entre os que defendem o impeachment estão os oposicionistas que querem logo assumir o governo, apesar de todos os problemas econômicos e políticos. A fatia do setor produtivo que acha que a falta de confiança no Brasil tem nome e sobrenome, Dilma Rousseff – e que a simples saída da presidente traria os investimentos de volta. E, paradoxalmente, uma fatia do governo que mantém o olho nas eleições de 2018. Eles acham que o impeachment de Dilma geraria uma narrativa conveniente para o próximo pleito, na qual o PT sairia como vítima de uma “conspiração das elites” – e essa narrativa pavimentaria o caminho de Luiz Inácio Lula da Silva de volta ao Planalto.
O país está dividido, e as paixões aflorarão ao longo das próximas semanas. Num momento grave como este, o impeachment repousa nas mãos dos deputados e posteriormente dos senadores, todos supervisionados pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Que eles passem ao largo dessas paixões e decidam com serenidade. Manter a serenidade, neste momento, é também a missão da imprensa. Na edição de ÉPOCA desta semana, a partir da reportagem especial desta semana, você encontrará informação abundante para entender o momento histórico que o país vive. Informação que é essencial para formar opinião e também para melhor monitorar as atitudes dos representantes que – gostemos ou não deles – elegemos democraticamente. Eles têm nas mãos o destino do país.
A OPOSIÇÃO CONTRA O IMPEACHMENT
Partidos de oposição ao governo Dilma Rousseff no Congresso Nacional, a Rede Sustentabilidade e o PSOL não apoiarão o pedido impeachment acolhido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A decisão tem um peso simbólico, já que, juntas, as duas siglas somam apenas dez deputados – ao todo a Casa é composta por 513 parlamentares.
Já o PSB, que conta com 36 deputados federais e indicará quatro integrantes para a comissão que avaliará o impedimento, deve definir sua posição na segunda-feira. A maioria da cúpula do partido e os governadores rechaçam a iniciativa. A posição do líder da bancada, Fernando Bezerra Filho (PE), porém, ainda é uma incógnita. Caberá a ele a palavra final sobre os quatro nomes que representarão o PSB na comissão.
INGERÊNCIA DA JUSTIÇA
O presidente do TSE, Dias Tofolli, está indignado com os deputados do PT que anunciaram ter desistido depois que souberam que o relator do processo, no STF, seria o ministro Gilmar Mendes. Os deputados petistas Wadih Damous (RJ), Paulo Teixeira (SP) e Paulo Pimenta (RS) tentaram desistir da ação que protocolaram no Supremo, quando o processo já tinha sido sorteado para a relatoria do ministro Gilmar Mendes.
“ É um desrespeito aos ministro do STF, ao próprio STF e ao Pode Judiciário Brasileiro”, condenou Tofolli.
Na sua avaliação, essa prática, de acionar o STF desde que quem ficar com a relatoria seja determinado ministro "é muito triste". Para Tofolli é preciso acabar com essa visão que os ministros do Tribunal decidem politicamente, pois ela é tomada tendo como base as leis e a Constituição.
“A parte não pode escolher o juiz. Tem que acabar com isso”, completou.
APOIO OPORTUNISTA E TROCA DE “ALVO”
Dirigentes dos partidos de oposição se reuniram com o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB). Nela, a oposição teria se comprometido a votar a favor de Cunha no Conselho de Ética.
“O nosso foco é a Dilma. O nosso foco não é o Eduardo Cunha”, afirmou Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), prefeito de Salvador, conforme relato de um aliado do presidente da Casa.
Os líderes da oposição foram cumprimentá-lo pela decisão de aceitar o pedido de abertura de um processo de impeachment. Nessa conversa foi fechado um acordo pelo qual os partidos de oposição ficarão em silêncio e se abster de fazer discursos contra Cunha. Mas o presidente do PSDB, Aécio Neves, de olho na opinião pública, deu entrevista para dizer que o impeachment não muda a posição dos tucanos no Conselho de Ética.
Um dos presentes relatou que estavam nesse encontro os líderes Carlos Sampaio (PSDDB), Mendonça Filho (DEM), Rubens Bueno (PPS) e Paulinho da Força (Solidariedade). Eles avaliam que com o impechment a situação de Cunha vai melhorar.
“ Ele deveria visitar umas padarias para testar sua popularidade”, incentivou Paulinho.
A próxima etapa da campanha da oposição pelo impeachment será pressionar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB). Depende dele, manter o Congresso em funcionamento e garantir a contagem dos prazos (sessões). Os aliados de Cunha acreditam que Renan não vai assumir esse ônus. Por isso, apostam que ele vai suspender o recesso.
“ Essa decisão não é exclusiva do presidente da Câmara. Ela tem que ser adotada em conjunto com o presidente do Senado”, declarou Cunha em entrevista.
O PT TENTA SE SALVAR ISOLANDO DILMA
Primeiro foi Delcídio Amaral. Agora foi a vez de Cunha. Senadores e parcela dos deputados estão irados com o presidente da sigla, Rui Falcão. O comando petista está de olho na sobrevivência. O Planalto quer a governabilidade. A esquerda petista quer voltar a ter poder. Seus dirigentes estão na ofensiva, atribuem a crise interna à maioria. E sustentam que o PT e o governo Dilma precisam separar o joio do trigo.
“Não é de esquerda a tese segundo a qual, enquanto não restaurar-se a moralidade, locupletar-se é permitido”
Apesar de contar com uma certa maioria no papel, o governo Dilma enfrenta enormes resistências no Congresso. Tem aprovado a duras penas projetos relevantes. E, na reta final do ano, corre contra o tempo para garantir o funcionamento de sua gestão. Por isso, Dilma disse frase surpreendente, ontem, na reunião com líderes. “A gente está igual aos EUA, o Congresso americano parou o país”, afirmou Dilma. Ela fez referência à maioria do Partido Republicano contra o democrata Barack Obama. Os analistas dizem que o atual Congresso americano foi o que menos legislou na História. Por lá, governar com minoria não é um drama. Foi o que ocorreu nos mandatos de Ronald Reagan e Bill Clinton.
A manifestação de Rui Falcão, presidente do PT, deixou Eduardo Cunha, presidente da Câmara, apreensivo. Ele contava com o PT para sobreviver. Aos seus aliados, comentou que não tem dúvidas que Falcão estava a serviço do Planalto.
Os petistas avaliam que o presidente do PT, Rui Falcão, busca estabelecer algumas diferenças entre a sigla e o governo Dilma. Não era o partido que queria preservar Delcídio Amaral nem é quem quer salvar Eduardo Cunha. Os petistas alegam que têm pouca influência no governo e que a máquina está, na maioria dos postos-chave, com o PMDB.
POSSIBILIDADE DE RENÚNCIA
A vontade do PT, para evitar constrangimento, que o senador Delcídio Amaral renuncie ao mandato não é novidade. No governo FH, ACM (PFL) e Jader Barbalho (PMDB) renunciaram aos seus mandatos. O atual presidente da Casa, Renan Calheiros, já abriu mão de presidir o Senado para não ter seu mandato cassado.
Na reunião com a presidente Dilma, o relator Ricardo Barros pediu ajuda para resolver os pepinos do Orçamento. O líder do PMDB, Eunício Oliveira, interferiu: “Cada dia com sua agonia. Hoje, vamos nos concentrar na meta fiscal”.
Na Esplanada, ministros petistas dizem que o PT no Senado não tem condições de exigir nada. Mas eles levaram. Ricardo Berzoini deixou a escolha do novo líder do governo para 2016. O líder no Congresso, o petista José Pimentel, vai acumular. Enquanto isso, ninguém fala em renúncia.
TEMER SE POSICIONA DE FORMA TAXATIVA
A perspectiva de poder tornou o vice-presidente Michel Temer um personagem paradoxal. Ele se recusa a participar de qualquer articulação anti-impeachment. Simultaneamente, assegura: “Nesta situação tensa que existe no momento, não quero praticar deslealdade institucional. Isso eu jamais praticaria.”
Beneficiário direto do eventual impedimento de Dilma Rousseff, Temer se esquiva de tomar parte dos esforços para barrar o processo contra a presidente sob duas alegações: 1) esse tipo de atividade não se insere nas atribuições constitucionais do vice-presidente; 2) como o PMDB está dividido sobre a matéria, não poderia, como presidente da legenda, assumir a posição de um dos lados.
Submetido a uma espécie de degredo político, esquecido em seu gabinete no edifício anexo do Planalto, Temer foi subitamente revalorizado. Neste sábado (5), de passagem por Recife, Dilma dirigiu ao número dois do governo uma cobrança disfarçada de afago: “Espero integral confiança do Michel Temer e tenho certeza que ele a dará. Conheço o Temer como político, como pessoa e como grande constitucionalista.''
Como político, Temer fareja a possibilidade de encerrar uma carreira de três décadas sentado na poltrona de presidente da República. Como pessoa, Temer se envaidece com a possibilidade de ascensão. E parece nutrir uma preferência por substituir Dilma em vez de ajudá-la. Como constitucionalista, Temer enxerga no impeachment uma ferramenta prevista na Constituição, não um golpe.
“Seja sob o império da presidente Dilma ou de qualquer um que chegue ao poder, é preciso reunificar o país”, diz Temer. “Precisamos de uma aboluta pacificação nacional. Todas as mentalidades partidárias deveriam se unir. Seja agora, sob o império da presidente, ou sob qualquer outro império, tem que haver uma coalizão nacional. Até acho que, se a presidente Dilma fizesse essa coalizão nacional, com todos os partidos, o país sairia desse embaraço em que se encontra.”
Temer costuma realçar que o impedimento não é o único risco que ronda o Palácio do Planalto. “Tem também os processos do TSE, que podem cassar a chapa”, afirma, numa referência às ações que correm no Tribunal Superior Eleitoral, tendo como alvo a chapa de 2014, composta por Dilma e Temer. A cassação da chapa ocorrerá se for acolhida a denúncia do PSDB de que o comitê de campanha da presidente abusou do poder político e econômico, borrifando na caixa registradora da campanha verbas sujas da Petrobras.
Temer se equipa para sustentar no TSE a tese jurídica segundo a qual as contas de campanha de Dilma e a sua contabilidade eleitoral deveriam ser apreciadas separadamente. Alega-se que as verbas provenientes de propinas extraídas de negócios com a Petrobras não chegaram às contas de campanha do vice-presidente.
PRESSA NO IMPEACHMENT PARA NÃO SANGRAR
A estratégia do governo de propor o cancelamento do recesso parlamentar, apressando a tramitação do processo do impeachment, tem a ver com a contabilidade de votos pró-Dilma na Câmara. O tempo joga contra ela: quanto mais a comissão processante demorar para fazer seu trabalho, menos chances a presidente tem de manter-se no cargo. O governo ficará “sangrando” até a definição do impeachment.