Documento indica subnutrição abaixo de 2,5% e aponta impacto de políticas públicas na reversão do quadro alimentar no país. No mundo, estima-se que 673 mlhões de pesoas enfrentaram a fome no ano passado
Com Estadão
O Brasil voltou a sair do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU), segundo dados divulgados, ontem, no relatório O Estado da Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo 2025, elaborado pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura). O levantamento considera a média de dados entre 2022 e 2024 e indica que o percentual da população em situação de subnutrição ficou abaixo de 2,5%, limite estabelecido pelo organismo internacional para classificar países em condição de fome severa.
A conquista foi anunciada durante a 2ª Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU, realizada em Adis Abeba, capital da Etiópia. O Brasil havia deixado o Mapa da Fome pela primeira vez em 2014, após uma década de políticas públicas voltadas à segurança alimentar. No entanto, voltou a figurar na lista no triênio 2018-2020, em decorrência da descontinuidade de programas sociais e agravamento da pobreza. Em apenas dois anos, o governo conseguiu reverter o cenário, segundo o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias. "Mostramos que, com o Plano Brasil Sem Fome, muito trabalho duro e políticas públicas robustas, foi possível alcançar esse objetivo", afirmou.
Entre os fatores apontados como determinantes para a saída do Mapa da Fome estão o fortalecimento do Bolsa Família, a valorização do salário mínimo, o incentivo à agricultura familiar e a ampliação da alimentação escolar. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), em 2024, das 1,7 milhão de vagas com carteira assinada criadas no país, mais de 98% foram preenchidas por pessoas inscritas no Cadastro Único. Desses, 75% eram beneficiários do Bolsa Família. A melhora nos indicadores também se refletiu na redução da pobreza extrema, que caiu a 4,4% em 2023, e na taxa de desemprego, que atingiu o menor nível desde 2012: 6,6%.
Especialista em políticas públicas, o professor Alexandre Cunha, da Universidade Católica de Brasília, avalia que a retomada de um conjunto de ações integradas foi essencial para o país reverter o quadro. "Não é apenas uma questão de transferência de renda. É preciso políticas de geração de emprego, valorização do salário mínimo, apoio à agricultura familiar e fortalecimento da merenda escolar. A fome no Brasil está muito mais presente no campo do que na cidade. E a agricultura familiar é responsável pela maior parte da produção de alimentos que chega às cidades", explica.
Segundo Cunha, o impacto da pandemia e de cortes em programas sociais durante os anos anteriores comprometeu a estabilidade alimentar da população mais vulnerável. "As crianças que dependiam da merenda escolar foram prejudicadas, e os efeitos da pandemia se somaram à descontinuidade de políticas. Agora, com a retomada e articulação entre União, estados e municípios, foi possível reverter o cenário", acrescenta.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, classificou a saída do Brasil do Mapa da Fome como "a melhor notícia do dia" e disse que a meta do governo é encerrar o mandato, em 2026, com todas as famílias brasileiras bem alimentadas. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais , Gleisi Hoffmann, também celebrou o resultado. "O país não será grande e desenvolvido se parte considerável da população passar fome", afirmou.
Além das ações domésticas, o governo federal tem investido em cooperação internacional. Durante a presidência do G20, em 2024, o Brasil lançou a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que reúne mais de 100 países, instituições financeiras e organizações internacionais. A iniciativa busca promover o intercâmbio de tecnologias e políticas sociais com foco no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030.
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Apesar do avanço, o professor Alexandre Cunha alerta que o cenário ainda exige atenção. "Estamos numa curva ascendente, com melhora contínua, mas é fundamental garantir a continuidade das políticas. Como já vimos no passado, descontinuidades podem nos fazer regredir. A segurança alimentar precisa ser tratada como prioridade de Estado, não apenas de governo", concluiu.
Mundo
O relatório estima que cerca de 673 milhões de pessoas tenham enfrentado a fome no mundo em 2024, o que corresponde a 8,2% da população mundial. O número representa queda em relação aos 8,5% registrados em 2023 e aos 8,7% em 2022. A fome continuou a aumentar na maioria das sub-regiões da África e da Ásia Ocidental. A fome, no entanto, continuou a aumentar na maioria das sub-regiões da África e da Ásia Ocidental, segundo o documento.