Em entrevista ao Valor, Covas disse que não é realista esperar uma rápida aceleração no número de pessoas vacinadas nos próximos meses
Com Valor Economico Globo
À frente do Instituto Butantan, maior fabricante de vacinas contra covid-19 do Brasil, o médico Dimas Covas avalia que o ritmo de mortes diárias provocadas pela doença continuará avançando (Foto: Reprodução)
À frente do Instituto Butantan, maior fabricante de vacinas contra covid-19 do Brasil, o médico Dimas Covas avalia que o ritmo de mortes diárias provocadas pela doença continuará avançando e vê com certo ceticismo as expectativas do Ministério da Saúde sobre aquisição de vacinas de diversos laboratórios até o fim do ano.
Em entrevista ao Valor, Covas disse que não é realista esperar uma rápida aceleração no número de pessoas vacinadas nos próximos meses. Pelos seus cálculos, até julho o que o país deverá conseguir é vacinar a faixa da população mais vulnerável à doença.
“Com o pé no chão, até o meio do ano você vai ter uma vacinação provavelmente de quem tem mais de 60 anos e provavelmente pode avançar um pouco mais na faixa dos 50 anos, incluindo também outros profissionais em risco”, disse ele. “É isso que nós teremos até o meio do ano. Estamos falando de 40 ou 50 milhões de pessoas. E 100 milhões de doses de vacinas.”
O ministério tem dois contratos com o Butantan: um para aquisição de 46 milhões de doses da Coronavac (previsto para ser finalizado este mês) e outro, de 54 milhões, previsto para agosto. A vacina, desenvolvida em parceria com o laboratório chinês Sinovac, é produzida na fábrica do instituto em São Paulo, mas depende de insumo fabricado pela Sinovac na China.
E essa é uma das preocupações de Covas. Ainda que a Sinovac se prepare para inaugurar uma nova planta na China em maio e com isso aumentar sua capacidade de exportação de insumos, a demanda pela substância na própria China está muito aquecida. O risco é que a empresa tenha de dar preferência à demanda chinesa e não à brasileira.
Na entrevista, Covas classificou como otimista demais a perspectiva do ministério sobre a quantidade de vacinas que conseguirá adquirir de diversos laboratórios até o fim do ano. Em meados de março, poucos dias antes de deixar o posto de ministro da Saúde, Eduardo Pazuello falou em mais 500 milhões de doses – sendo que pouco mais de 400 milhões já estariam garantidas.
“Não adianta hoje ministério falar que precisa, precisa, precisa de vacina. O ministério está tendo dificuldade de arrumar vacinas e não é só a do Butantan, está com dificuldades em relação a todas as vacinas exatamente por isso, todo mundo já se comprometeu, todos têm seus compromissos e estão cuidando de manter esses compromissos. Avançar nisso é muito difícil porque a demanda mundial é muito grande”, disse Dimas.
Outra das preocupações do médico é que essa dificuldade de fazer acelerar a disponibilidade de vacinas contra covid-19 se dá num momento trágico para o Brasil de rápida disseminação da nova variante e do avanço das mortes, que ultrapassaram a marca de 330 mil.
“Estamos num momento em que a velocidade de transmissão ainda é muito alta. Abril vai ser o mês dramático para o Brasil. Os próximos 15 dias serão muito dramáticos”, disse.
“Cruzamos a casa dos 2 mil [mortos por dia], já passamos da casa dos 3 mil, estamos indo para os 4 mil e vamos chegar a 5 mil mortes por dia.”
Além de vacinas, é urgente, disse ele, uma política ampla e coordenada nacionalmente para que as pessoas realmente fiquem em casa.
“Eu não posso, por princípio, dizer que é impossível, ‘eu não vou fazer porque é impossível, porque não vai ter adesão’. Eu, então, estou admitindo que vamos continuar tendo esse número de casos, de internações e de óbitos.”