Próximo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Roberto Barroso usou o tempo livre da passagem por Lisboa, onde participou do Fórum Jurídico promovido pelo instituto ligado ao também ministro Gilmar Mendes, para confraternizar com o delator e dono do grupo JBS Joesley Batista no terraço de um dos hotéis mais badalados da capital portuguesa, o Tivoli.
Do Portal Migalhas
O encontro, registrado em um vídeo obtido pela equipe da coluna, ocorreu na noite do dia 26, na véspera de Barroso participar de um debate sobre um marco regulatório para as plataformas de internet.
No vídeo, o ministro aparece em roda de conversa com Joesley, ao lado do DJ. Joesley está com um copo na mão e Barroso, de braços cruzados. Também participava do papo o advogado Miguel Matos, editor do portal jurídico Migalhas.
O vídeo não mostra toda a conversa, mas, segundo relatos obtidos pela equipe da coluna, o papo durou alguns poucos minutos.
Naquela mesma noite, o ministro já havia marcado presença no jantar promovido pelo banco BTG no restaurante Eleven. Barroso assume a presidência do STF a partir de 28 de setembro, com a aposentadoria de Rosa Weber.
O irmão de Joesley, Wesley Batista, não aparece no vídeo, mas também estava no terraço do Tivoli.
Os dois empresários fizeram acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR), validado pelo próprio STF em junho de 2017. Nos relatos, Joesley disse ter pago propina ao então presidente Michel Temer e ao então senador Aécio Neves, que foram denunciados pelo MP.
Na época, a J&F também fechou com MP um acordo de leniência que prevê o pagamento de multa de R$ 10,3 bilhões ao longo de 25 anos por seu envolvimento em casos de corrupção. Agora, o grupo quer rever o acordo e diminuir o valor.
Nos dias em que durou o fórum, os irmãos Batista circularam pelas palestras e por eventos da programação paralela – como o coquetel de boas vindas promovido pelo grupo empresarial Esfera, de que são patrocinadores.
Eles aproveitaram esse coquetel para se aproximar do também ministro do Supremo André Mendonça, com quem tiraram uma foto em que aparecem sorridentes.
Mendonça é o relator de um processo de interesse do grupo J&F: a ação movida por partidos da base do governo Lula para suspender as indenizações e multas impostas em acordos de leniência celebrados entre o Estado e empresas investigadas pela Operação Lava-Jato.
No último dia 25, Mendonça deu um prazo de 10 dias para que a Presidência da República, o Congresso e o Ministério Público Federal se manifestem no caso.
Em Lisboa, os irmãos Batista ainda fizeram questão de assistir ao painel sobre “Defesa da democracia e liberdades fundamentais”, a poucos metros do principal palestrante – Michel Temer, delatado por eles em 2017.
A presença dos delatores no auditório provocou constrangimento entre aliados de Temer e organizadores do fórum, mas nem por isso eles mudaram de lugar.
Outros empresários também circularam por eventos paralelos ao fórum de Lisboa – como o banqueiro André Esteves, anfitrião de um jantar restrito para empresários e políticos e um coquetel para centenas de pessoas em um restaurante à beira do rio Tejo
Barroso participou ativamente dos eventos do BTG. No jantar, em que estavam os ministros Gilmar Mendes e Mendonça, também estiveram o empresário Rubens Ometto, do grupo Cosan, o presidente do conselho de administração do Bradesco, Luiz Trabuco Cappi, e o presidente da Câmara, Arthur Lira.
Na noite em que Barroso esteve no terraço do Tivoli ocorreram vários encontros paralelos de participantes do fórum – como uma confraternização promovida pelo advogado criminalista Carlos de Almeida Castro, o Kakay.
Kakay contou à equipe da coluna que reservou duas mesas no terraço do hotel para comemorar o aniversário de uma sócia, mas disse não ter convidado nem os Batista e nem Barroso.
“Foi chegando gente, mas não para encontrar comigo. O Tivoli é um lugar onde as pessoas vão. A festa foi até de madrugada. Eu conheço todo mundo em Portugal.”
Na manhã seguinte, Barroso compôs a mesa de debates “Responsabilidade das plataformas por conteúdos ilícitos e riscos sistêmicos”, ao lado do deputado federal e relator do PL das Fake News, Orlando Silva (PCdoB-SP), da juíza federal Caroline Tauk e dos professores Ricardo Campos e Clara Keller.
O ministro do STF foi indagado pela coluna sobre o teor da conversa com Joesley, e ainda se achava apropriado manter contato com alguém que tem interesses a serem julgados pela instituição que ele vai chefiar a partir de setembro.
Barroso respondeu por meio da assessoria de imprensa da Corte. Disse que não conhecia nem Joesley e nem Wesley Batista, mas “ao ser abordado no referido evento, apenas cumprimentou” o empresário. “Não houve conversa; apenas uma troca breve de palavras entre pessoas civilizadas.”
Há duas semanas, o ministro se envolveu em um episódio polêmico ao dizer, em um evento da União Nacional dos Estudantes (UNE), que “nós derrotamos o bolsonarismo”. Depois, afirmou que na verdade buscava se referir ao “extremismo golpista”.
Questionado sobre o encontro com Barroso no Tivoli, Joesley enviou uma nota por meio de sua assessoria de imprensa em que afirma que “eventos com a participação de empresários, autoridades e universidades são uma forma transparente e legítima de se fomentar discussões públicas”. Os irmãos dizem que não patrocinaram a festa no terraço do Tivoli, onde "cumprimentaram diversos convidados, como empresários, jornalistas e autoridades”.
Confira abaixo a íntegra da nota enviada pela assessoria dos irmãos Joesley e Wesley Batista:
Eventos com a participação de empresários, autoridades e universidades são uma forma transparente e legítima de se fomentar discussões públicas. Os empresários Wesley e Joesley Batista são acionistas controladores de um grupo empresarial que gera 270 mil empregos, sendo 160 mil no Brasil, em 20 Estados. Participaram de eventos aos quais foram convidados, a exemplo do que foi promovido pela FGV em Lisboa. Não patrocinaram o evento mencionado, cumprimentaram diversos convidados, como empresários, jornalistas e autoridades.