Deputados descontentes ou que vislumbrem melhores oportunidades em outra legenda terão 'janela' entre 3 de março e 1º de abril para trocar de partido sem risco de perder mandato.
Por Marcela Mattos, g1
Os anúncios de pelo menos 11 pré-candidaturas à Presidência da República aceleraram as negociações para troca de partidos entre deputados federais que tentarão a reeleição — a entrada de novos candidatos na corrida pelo Palácio do Planalto influencia a posição política dos partidos e as alianças para formação dos palanques estaduais.
Deputados que não se sentirem contemplados com o novo projeto político das siglas às quais estejam filiados ou que vislumbrarem melhores oportunidades em outras legendas terão 30 dias – entre 3 de março e 1º de abril – para trocar de partido. É a chamada "janela partidária".
Nesse intervalo, a Justiça Eleitoral autoriza a troca de legenda sem que os parlamentares percam o mandato. São os 30 dias que antecedem a data-limite de filiação. A partir de 2 de abril, quem ainda não estiver filiado a um partido não pode mais ser candidato nas eleições 2022.
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Mudanças de partido também são autorizadas em caso de “mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário” e “grave discriminação política pessoal”.
A proximidade da abertura da janela partidária inaugura também uma fase de negociações e barganhas políticas.
Para os partidos, é interessante receber mais candidatos com chance de vencer porque o fundo partidário – recurso público destinado a custear as despesas das legendas – é calculado com base no tamanho das bancadas da Câmara após a eleição.
Os deputados, por outro lado, conseguem negociar cargos em diretórios, posições de destaque dentro do partido e investimento nas próprias campanhas em troca da migração partidária. Na mesa de negociações, há também fatores ideológicos e políticos.
Parlamentares também apontam que o fim das coligações – uniões temporárias entre diferentes partidos para somar tempo de televisão e recursos de campanha – tornou a mudança de sigla uma “questão de sobrevivência”, principalmente para candidatos de partidos menores.
Entre Moro e Bolsonaro
Atualmente com 43 deputados, o PL espera ver a bancada crescer após a filiação ao partido do presidente Jair Bolsonaro no partido.
“Com a vinda do presidente, acredito que nós poderemos partir para a disputa das eleições com mais 15 a 20 deputados que poderão vir. São deputados não só do PSL, mas também de outras legendas que estão fazendo contato e conversando num estágio avançado”, disse ao g1 o líder do PL na Câmara, deputado Wellington Roberto (PB).
Como consequência das eleições e das mudanças na janela partidária, o líder do PL projeta uma eleição de 70 deputados da sigla em outubro – um número que, na composição atual da Câmara, daria ao partido a maior bancada da Casa. "Não estou jogando pedra na lua, estou com o pé no chão", afirmou Roberto.
A filiação de Bolsonaro ao PL também trouxe baixas ao partido. O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (AM), anunciou a saída da legenda por se opor ao presidente da República.
É esperado que outros deputados do PL acompanhem Ramos. Para o líder da legenda, porém, o balanço será “extremamente positivo”.
O Podemos, hoje com 11 deputados, também deve passar por mudanças após o ingresso do ex-juiz Sergio Moro. Os deputados Diego Garcia (PR) e José Medeiros (MT), aliados do presidente Bolsonaro, devem deixar a legenda.
“O partido se reuniu e a gente tem tido essas conversas. Agora, óbvio que, caso o Moro saia candidato a presidente, eu tenho realmente que procurar outra sigla. Eu tenho que puxar o carro, porque não tem como ser candidato ao Senado tendo um candidato a presidente do mesmo partido. Eu teria de ir para algum partido da base do presidente Bolsonaro”, afirmou ao g1 o deputado José Medeiros.
Nos bastidores, fala-se que deputados do Norte e do Nordeste também podem deixar o Podemos.
Há a expectativa, por outro lado, da chegada de novos deputados. Na última quarta-feira (26), integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) assinaram a filiação ao Podemos para apoiar a campanha de Moro. Entre eles estava o deputado Kim Kataguiri, atualmente no DEM.
A deputada Renata Abreu (SP), presidente do Podemos, disse em nota que o saldo da janela partidária deve ser positivo entre quem sai e quem entra.
“Trata-se de uma acomodação normal. Alguns nomes já são de nosso conhecimento que têm alinhamento com outras candidaturas, isso é esperado. Mas, com certeza, o partido ganhará muito em qualidade, além de quantidade, com a chegada de novas lideranças”, afirmou Renata.
Desde a desfiliação de Jair Bolsonaro, em novembro de 2019, o PSL espera a saída de deputados que se elegeram na esteira da campanha do presidente.
Cerca de 20 deputados bolsonaristas – entre os quais Eduardo Bolsonaro (SP), Carla Zambelli (SP) e Bia Kicis (DF) – devem aproveitar a janela partidária deste ano.
Partidos do chamado Centrão, como PTB, PL, Republicanos e PP, mantêm conversas com os parlamentares e tentam atraí-los para as legendas.
Como uma solução para não desidratar, o PSL se uniu ao DEM em um processo de fusão partidária, formando o União Brasil. A expectativa de dirigentes da nova legenda é que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) avalize a fusão no próximo mês.
Se confirmada, resultará na soma das bancadas dos dois partidos – um total de 81 deputados -, tornando o União Brasil a maior legenda da Câmara. Por carregar os recursos financeiros do DEM e do PSL, o partido também deve passar o ser o que mais receberá verbas do fundo partidário e eleitoral.
Nas articulações para a formação da nova legenda, o DEM também espera a saída dos deputados licenciados Onyx Lorenzoni (RS) e Tereza Cristina (MS), ambos ministros do governo Bolsonaro.
“Eu acho que o Onyx está mais próximo de seguir com o PL, e a Tereza tem uma situação local que ela tem refletido. A gente não tem excluído nenhum diálogo e está com a porta aberta, construindo”, afirmou o líder do DEM, deputado Efraim Filho (PB).
O parlamentar reconhece que, como diversos partidos estão em negociação para atrair deputados, as definições sobre a formação final do União Brasil devem acontecer já nas vésperas do fechamento da janela partidária.
Segundo Efraim Filho, em um primeiro momento, a principal meta do União Brasil será a formação de uma ampla bancada do Congresso.
“A segunda meta serão os governos estaduais e a terceira etapa será a cena nacional. Nós queremos construir um partido primeiro para voltar com a maior bancada do Congresso, entre Câmara e Senado. Segundo, eleger o maior número de governadores no Brasil e como terceiro, aí sim, entraria a construção da cena nacional”, disse Efraim.
Para a disputa ao Planalto, o União Brasil e o Podemos mantêm conversas sobre uma possível aliança em torno da candidatura de Moro – até este fim de semana, o cenário se mantinha indefinido.
Federações
Também está em negociação a criação de federações partidárias, modelo pelo qual duas ou mais legendas se unem por um período de pelo menos quatro anos.
Partidos de esquerda – PT, PSB, PV e PCdoB – tentam se federalizar para a próxima eleição com o objetivo de apoiar a campanha e um eventual governo do ex-presidente Lula.
“A gente tem de pensar numa federação. E não é só partidária, mas engloba a construção de uma frente mais ampla que possa eleger o Lula e sustentar o futuro governo”, disse o líder do PT, deputado Bohn Gass (RS).
De outro lado do espectro político, o PSDB também estuda a possibilidade de uma federação. O partido rachou no ano passado durante as prévias que definiram o governador de São Paulo, João Doria, como pré-candidato.
Nos bastidores, a legenda é apontada como uma das que podem sofrer consideráveis baixas durante a janela partidária em decorrência das divergências internas.
Na última quinta-feira (27), a Executiva da legenda aprovou o avanço das negociações com o Cidadania para a formação da federação.
“Temos um levantamento preliminar que indica que a federação é bem-vinda. Precisamos avançar no regramento para essa convivência. O Cidadania tem sido parceiro importante do PSDB e há convergência política tanto nas eleições quanto no Legislativo”, destacou o presidente do PSDB, Bruno Araújo.
Doria também se manifestou sobre o assunto e, em uma rede social, cumprimentou os presidentes do Cidadania pela “ótima decisão” de criar a federação entre os partidos.
Em resposta, o senador Alessandro Vieira (SE), pré-candidato à Presidência pelo Cidadania, disse que os presidentes partidários não têm poder para decidir sobre a federação e ressaltou que as discussões ainda estão no início.
“A união do centro democrático é urgente, mas ignorar que política se faz com paciência e respeito não ajuda”, disse.