Caiado fez as críticas mais duras, acusando o governo de usurpar a atribuição dos governadores; demais participantes elogiaram iniciativa federal, mas falaram que é preciso ir além dos temas tratados na Proposta de Emenda Constitucional
Por Paula Ferreira, Gabriel Hirabahasi, Lavínia Kaucz e Caio Spechoto
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, apresentam nesta quinta-feira, 31, a governadores a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública. A PEC é uma tentativa do governo de tentar minimizar os problemas numa das áreas pior avaliadas da gestão petista. Na reunião realizada no Palácio do Planalto, governadores que apoiam o governo e também os de oposição cobraram ações de combate à criminalidade que vão além do que está previsto na PEC.
O governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, agradeceu o convite, disse que ainda precisará analisar a PEC, mas disse que as ações precisam ir além dela. "Talvez a PEC sozinha não tenha o condão de resolver o problema da segurança pública. Há outros problemas correlatos, e talvez nessa reunião podemos dar um primeiro grande passo, de estabelecer grupo de trabalho e formular uma série de propostas", afirmou.
Tarcísio disse que o Estado se preocupa muito com a "a transposição do ilícito nos negócios lícitos". Ele citou o setor de combustíveis, "um dos preferidos pelo crime organizado para a lavagem do dinheiro".
O governador defendeu uma coordenação melhor das informações produzidas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) com os Grupos de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaecos) nos Estados". Às vezes falta mais acesso às informações que são produzidas", disse.
Tarcísio propôs ainda a criação de linhas de financiamento dentro do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para custear equipamentos de combate ao crime. Além disso, sugeriu a criação de um Sistema Nacional de Controle de Fronteiras.
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, foi mais incisivo. "Isso é uma invasão de poder, usurpação de poder", disse se referindo à PEC do governo. Disse ainda que a PEC parte de uma premissa errada que vai levar a ações erradas. "Ou encaramos o assunto com a seriedade que merece. O Congresso deveria é dar mais autonomia aos estados para legislar os assuntos penais", disse Caiado. "Ou vamos enfrentar o crime para valer ou o crime vai tomar conta do País", acrescentou. E ainda avisou, por exemplo, que não vai botar câmera em policiais.
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, também disse que os problemas de segurança vão além da PEC. Ele pediu que os gastos com segurança fique foram dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Cobrou ainda que seja aprovada legislação para impedir que o preso habitual seja solto em audiências de custódia. Segundo ele, isso tem sido cada vez mais comum.
"Eu gasto R$ 13 bilhões com segurança, R$ 8 bilhões com educação e R$ 7 bilhões com saúde. O gasto com segurança toma todo meu espaço fiscal", complementou.
Castro disse que o debate sobre a PEC da segurança pública "deveria ser um pouco ampliado por questões práticas e urgentes que precisamos tratar para hoje". Ele destacou os problemas da lavagem de dinheiro e da entrada de armas e drogas. "Precisamos urgentemente que a diplomacia brasileira faça uma conversa dura com esses países, inclusive com sanções claras".
"Hoje, 90% das armas apreendidas pela PM e Polícia Civil do Rio de Janeiro foram fabricadas nos EUA, e vendidas para Paraguai, Colômbia e Equador. Nós sabemos de onde essas armas vêm, para onde são vendidas, e nesses países elas perdem o monitoramento", afirmou. Aliado do governo, o governador do Maranhão, Carlos Brandão, elogiou a iniciativa, e afirmou que os problemas de segurança vão além da PEC. "Não podemos encerrar o debate apenas nessa PEC", comentou.
Lewandowksi questiona polícias do DF e do Rio por atuações no 8/1 e no caso Marielle
No início da reunião, o ministro da Justiça disse que a PEC não altera "em uma vírgula" as competências dos Estados e municípios em relação às polícias civis e militares e às guardas municipais. "Não estamos mexendo em uma vírgula no que diz respeito às competências dos Estados para regular suas polícias civis e militares. E também aos prefeitos, não estamos interferindo em absolutamente nada à definição e às competências das guardas municipais", disse o ministro.
Ao falar da PEC e defender a criação de uma nova polícia ostensiva federal, questionou a atuação das polícias do Rio e do Distrito Federal. Primeiro, o ministro Lewandowski disse que o homicídio da vereadora Marielle Franco (Psol) e de seu motorista, Anderson Gomes, só foi solucionado após a Polícia Federal entrar no caso. Criticou a Polícia do Rio de Janeiro por não ter resolvido o caso antes.
"Por 5 anos, me desculpe governador Cláudio Castro, a Polícia do Rio de Janeiro demorou e não elucidou (o crime). A valorosa e combativa Polícia Federal entrou com sete homens e desvendou esse lamentável crime", disse o ministro. Castro, que está presente na reunião reclamou, ao que o ministro da Justiça respondeu: "Mas não é crítica. Estamos colaborando muito proximamente".
Depois, o ministro defendeu que caso houvesse uma Polícia Ostensiva Federal no desenho previsto na PEC da segurança pública, a invasão do 8 de janeiro não aconteceria e ressaltou que a PF identificou "graves falhas" na atuação da Polícia Militar do Distrito Federal no caso.
"A Polícia Ostensiva Federal poderá, conforme se dispuser em lei, exercer policiamento ostensivo na proteção de bens, serviços e instalações federais. Presidente, se tivéssemos em 8 de janeiro de 2022 (ele quis dizer 2023) uma Polícia Ostensiva Federal, não teria ocorrido a invasão nas sedes dos Três Poderes. Nós dependemos da Polícia Militar do DF. Sem nenhuma crítica, mas a PF terminou o inquérito com relação a esse assunto e chegou à conclusão de que houve graves falhas por parte desta honrada e valorosa corporação do Distrito Federal", declarou.