O decreto é inconstitucional, mas, enquanto a sociedade discute os aspectos jurídicos, o presidente ganha espaço
Por Ricardo Rangel
Mais uma vez Jair Bolsonaro aponta para a lua, e mais uma vez a sociedade se perde discutindo o dedo.
Estamos engajados em uma discussão jurídica que pouco interessa. É claro que o decreto representa desvio de finalidade, claro que é inconstitucional, e claro que, mesmo que não fosse, não suspenderia a inelegibilidade do deputado criminoso. E é claro que é crime de responsabilidade — em um país verdadeiramente democrático, o pedido de impeachment de Bolsonaro já estaria tramitando.
Mas nada disso é especialmente importante — ainda que o absurdo da vez seja mais absurdo do que os anteriores, o crescendo é mais do mesmo, e o próximo absurdo deve ser ainda mais absurdo.
O que é importante é que, mais uma vez, o capitão conseguiu ditar a pauta: estamos todos discutindo Jair Bolsonaro e seu decreto — impressionante, por sinal, a quantidade de supostos democratas fazendo ressalvas à condenação de quem incitou a destruição da democracia — e multiplicando o volume de notícias, verdadeiras ou fake, sobre o presidente.
Mais uma vez, seja qual for o resultado da briga com o STF, Bolsonaro já venceu essa batalha.
Se o Supremo derrubar seu decreto absurdo, Bolsonaro posará de coitadinho, de vítima de uma suposta “ditadura do Judiciário”, de paladino solitário na luta pela liberdade de expressão blá-blá-blá. E incendiará as redes com isso.