O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, nesta 5ª feira (8.abr.2021), manter o decreto do Estado de São Paulo que proibiu cultos e missas na pandemia. A Corte definiu que Estados e municípios podem adotar restrições para as atividades religiosas. A questão havia sido alvo de decisões divergentes de ministros.
Com Agências
O julgamento começou na 4ª feira (7.abr), com o voto do relator da ação, ministro Gilmar Mendes, a favor de deixar Estados e municípios decidirem sobre cultos. Disse que a Constituição não defende um “direito fundamental à morte”. “Ainda que qualquer vocação íntima possa levar à escolha individual de entregar a vida pela religião, a Constituição não parece tutelar um direito fundamental à morte”, afirmou.
Também votaram por manter a possibilidade de restrições às atividades religiosas os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Luiz Fux, presidente do STF.
Votaram a favor da liberação de cultos e missas os ministros Nunes Marques e Dias Toffoli.
A ação em debate foi proposta pelo PSD, que pediu a inconstitucionalidade do decreto paulista.
Na 2ª feira (5.abr), Gilmar Mendes determinou, em decisão individual, que o decreto de São Paulo deveria continuar valendo. No sábado (3.abr), o ministro Nunes Marques havia liberado as atividades religiosas presenciais em todo país, em ação proposta pela Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos). O processo de Nunes Marque não foi tema da sessão do STF.
Julgamento
O 1º ministro a se manifestar o voto foi Nunes Marques, que votou pela inconstitucionalidade do trecho do decreto que proibiu cultos em São Paulo na pandemia. Propôs que o mesmo entendimento seja aplicado a todos Estados e municípios, para que não restrinjam atividades religiosas presenciais.
Disse que a covid é “cruelmente mortal”, e que não está negando a ciência. Defendeu o funcionamento das igrejas e templos, desde que sigam a limitação de 25% de público.
“Ao tratar cultos como serviços não essenciais, Estados e municípios podem, por via indireta, eliminar cultos religiosos, suprimindo aspectos absolutamente essenciais da religião, que é a realização de reuniões entre os fiéis para celebração de seus cultos e crenças”, declarou.
Nunes Marques citou o papel de alento espiritual das igrejas para a saúde mental das pessoas e que as igrejas não são casas em que “as portas podem se fechar sem consequências”. “Há também a carência material. As igrejas desenvolvem importantes trabalhos assistenciais em comunidades carentes. Durante a pandemia esses trabalhos são importantíssimos”. Declarou que, nas igrejas, “o pequenino é recebido como autoridade”.
O ministro rebateu críticas que recebeu depois da sua decisão que liberou cultos. “Me chama atenção o fato de que vivemos uma das maiores crises dos direitos individuais e coletivos dos últimos 100 anos. Criou-se uma atmosfera de intolerância. Não se pode falar dos direitos das pessoas porque isso é taxado de negacionismo. Até quando direitos individuais podem ser restringidos e em alguns casos, eliminados?”
O ministro disse que 21 Estados e o Distrito Federal já permitiam as atividades religiosas presenciais, no momento de sua decisão. “Em momento algum, mesmo convicto de estar protegendo a Constituição, eu fiz remando contra o bom senso dos gestores brasileiros. Simplesmente 85% dos Estados e 75% das capitais já autorizavam cultos presenciais”.
Também disse que os protocolos sanitários que estipulou no despacho, para permitir o recebimento de público em igrejas e templos, foram mais restritivos que decretos estaduais.
O ministro Alexandre de Moraes disse que o poder público não pode ser “conivente” com dogmas ou preceitos religiosos. Afirmou que o Estado “não pode se abaixar para os dogmas, colocando em risco a sua própria laicidade e, consequentemente, colocando em risco a efetividade dos demais direitos fundamentais, como o direito à vida”.
“Não há nada de preconceituoso e inconstitucional nos decretos que, embasados em dados científicos, restringem temporariamente os cultos religiosos, assim como outras atividades”.
Edson Fachin disse que a pandemia é a maior tragédia sanitária da história do Brasil. “Não se trata de proibição absoluta e permanente. Não se trata também de estabelecer uma preferência entre atividades religiosas, e entre atividades religiosas e seculares”.
Para o ministro Roberto Barroso, o país se atrasou em incentivar o uso de máscara, em fomentar o distanciamento social e em comprar vacinas. “Estamos pagando esse atraso com vidas. E, em triste ironia, muitos dos negacionistas já deixaram essa vida, vítimas da pandemia”.
A ministra Cármen Lúcia foi quem decidiu o placar do julgamento. Foi a 8ª a votar. “O artigo 196 da Constituição estabelece expressamente que a saúde é direito de todos, mas é dever do Estado”, declarou.
O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que o direito à vida, à saúde e à segurança devem prevalecer sobre o direito à liberdade de culto. Segundo o ministro, a presença de público nas igrejas deve ser “pontual e temporariamente limitada, até que nos livremos desta terrível pandemia que assola o país e o mundo”.
Segundo o ministro Marco Aurélio, “o Supremo não governa. Quem governa é o Executivo”. “O Executivo atuou, a tempo e modo, quanto ao isolamento, como ao fechamento de certos setores”.
O presidente da Corte, ministro Luiz Fux, disse que em determinadas circunstâncias excepcionais, admitem-se medidas excepcionais. “Nessas 24h faleceram 4.249 seres humanos, brasileiros, batendo recorde desde o início da pandemia. É muito importante que tenhamos a visão da realidade”, declarou.