De acordo com as investigações da Polícia Federal, a quadrilha que atuava no Carf pode ter gerado um prejuízo de R$ 19 bilhões à Receita
O Senado instalou na tarde de ontem uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar suspeitas de manipulação de julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
O conselho, ligado ao Ministério da Fazenda, é a última instância de recursos de processos administrativos que envolvem tributos federais administrados pela Receita Federal. Isso significa que o órgão pode, inclusive, anular multas aplicadas a empresas.
Na primeira reunião, o colegiado elegeu como presidente da mesa o senador Ataídes de Oliveira (PSDB-TO) e, como vice-presidente, o senador Donizeti Nogueira (PT-TO). A relatora escolhida foi a senadora Vanessa Graziottin (PCdoB-AM). O colegiado conta com 11 senadores titulares e 7 suplentes.
No fim de março, a Polícia Federal (PF) deflagrou uma operação para desarticular o suposto esquema criminoso que envolveria ao menos 70 empresas dos ramos bancário, siderúrgico, automobilístico e da construção civil.
De acordo com as investigações da Operação Zelotes, a quadrilha que atuava no Carf pode ter gerado um prejuízo de R$ 19 bilhões à Receita Federal a partir da anulação ou redução indevida de multas aplicadas pelo órgão, dos quais R$ 5,7 bilhões já estão comprovados.
O pedido para criação da CPI, de autoria do senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), aponta a necessidade de apurar as denúncias de que julgamentos do órgão foram manipulados para anular autuações fiscais ou reduzir substancialmente os tributos cobrados das empresas.
PRAZO
A comissão terá prazo de 4 meses (120 dias) para concluir o trabalho e verba de R$ 100 mil, mas o presidente da comissão já mencionou a possível necessidade de revisão dos números. “A princípio, vejo como tempo muito curto, mas o presidente (do Senado) Renan (Calheiros) sempre tem sido sensato e, se necessário for, vai nos conceder mais prazo”, disse. Em seguida, afirmou que pode ser necessário rever o valor da verba.
As investigações da Operação Zelotes apontam que conselheiros suspeitos de integrar o esquema criminoso passavam informações privilegiadas de dentro do Carf para “escritórios de assessoria, consultoria ou advocacia.” Pelo menos 24 conselheiros, ex-conselheiros, advogados e lobistas são investigados pela PF.
Esses escritórios, de acordo com os investigadores, procuravam empresas multadas pela Receita Federal e prometiam controlar o resultado dos julgamentos de recursos.
A Polícia Federal aponta que, para isso, além de promover tráfico de influência, o grupo corrompia conselheiros envolvidos com o julgamento dessas multas e manipulava o andamento dos processos com a venda de pedidos de vista ou alteração da pauta de julgamentos.
Muitas dessas consultorias, ainda conforme as investigações, tinham como sócios conselheiros e ex-conselheiros do Carf. A PF suspeita que, em troca dessas facilidades, empresas multadas pagavam propina. Segundo os investigadores, boa parte dos supostos honorários pagos pelas empresas a título de consultoria era, na verdade, repasse de propina.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu na segunda-feira tornar incompatível o exercício da advocacia com o cargo de conselheiro do Carf. A relatora da CPI do Carf, Vanessa Graziottin, disse que a decisão da OAB é muito importante. "Não é possível que alguém na condição de julgador possa defender uma das partes. Isso é impraticável”, disse.
De acordo com a decisão da entidade, o advogado que tomar posse como conselheiro do órgão ligado à Fazenda terá o registro na OAB suspenso enquanto exercer o mandato, que dura três anos e é prorrogável por mais seis. Além disso, definiu a Ordem, assim que assumir a cadeira no conselho do Carf, o profissional deverá imediatamente se desligar do escritório de advogado em que é sócio ou trabalha.