Candidato escolhido por Maia para a Presidência da Câmara tenta consolidar o apoio das legendas progressistas, que desconfiam do perfil governista do parlamentar. Arthur Lira, com respaldo do Planalto, busca atrair dissidentes para construir a vitória
Por Augusto Fernandes - Marina Barbosa
Candidato do bloco liderado por Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a Presidência da Câmara, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) reúne-se, nesta segunda-feira (28/12), com partidos de esquerda para tentar garantir os votos necessários à eleição interna da Casa. O primeiro teste do candidato consiste, sobretudo, em aparar as arestas com o Partido dos Trabalhadores, dono da maior bancada da Câmara e ainda com restrições ao emedebista. Ainda que improvável, não está descartada uma candidatura petista.
A reunião foi convocada a pedido de Maia, que tem bom trânsito com a oposição. O presidente da Câmara quer garantir um sucessor no comando da Casa e, acima de tudo, derrotar o candidato do presidente Jair Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL) — algo que também interessa à esquerda. E, segundo os líderes do PT, PSB, PDT e PCdoB, servirá para que o emedebista “possa apresentar as propostas e compromissos de procedimentos que nortearão sua candidatura à Presidência da Casa”.
Rossi, por sua vez, já tem feito uma série de acenos às siglas de oposição, pois o apoio da esquerda será crucial na eleição da Câmara. Juntos, PT, PSB, PDT, PCdoB e Rede somam 122 votos e podem garantir que o emedebista derrote Lira — com esses partidos, o alcance do “bloco do centro democrático” subiu de 158 para 280 votos, o que dá uma grande vantagem em relação a Lira, que hoje trabalha com 215 votos. Mas, embora tenha anunciado apoio ao candidato de Maia, nem toda a oposição sepultou o desejo de lançar uma candidatura própria. Por isso, Rossi vai intensificar as negociações hoje.
A intenção de ter um nome próprio na disputa pela Presidência da Câmara ecoa, sobretudo, no PT, que tem a maior bancada da Casa, com 53 deputados. O partido resiste em aceitar o nome de Baleia Rossi por conta do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016, já que Rossi votou a favor da destituição da petista e é presidente nacional do MDB, partido do ex-presidente Michel Temer, que assumiu o Palácio do Planalto após a queda de Dilma.
“Estamos no bloco, mas, a partir de agora, nós vamos definir a estratégia que mais possa contribuir com o objetivo prioritário que é impedir que a Câmara e o Senado sejam capturados por Bolsonaro. Se, para viabilizar essa estratégia, a gente tiver que avançar na candidatura própria, talvez isso aconteça. Por isso, nós vamos ouvir Rossi e, depois, vamos voltar a conversar com a bancada”, afirmou o deputado Paulo Pimenta (PT-SP).
Ele contou que ainda não há data, no entanto, para a reunião interna do PT que vai debater o posicionamento que for apresentado por Rossi hoje. “Não temos pressa”, disse Pimenta. Presidente nacional do partido, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) também já avisou que “o PT só vai decidir sua candidatura à Presidência da Câmara ao fim de um debate com os partidos de oposição”.
PSB
Para conquistar a Presidência da Câmara, Baleia Rossi ainda vai precisar enfrentar um grupo de dissidentes do PSB. Cerca de 15 deputados socialistas recusaram o nome indicado por Maia, sob a alegação de que o emedebista é mais governista do que Lira nas votações da Casa. Muitos desses deputados também têm defendido uma candidatura própria, mas já há quem diga que, sem uma terceira opção, votarão em Lira em detrimento de Rossi.
Integrantes desse grupo de dissidentes do PSB, no entanto, contaram ao Correio que não foram convidados para a reunião de hoje. Por isso, continuam cobrando diálogo com a liderança e a presidência do partido, que demonstrou apoio ao candidato de Maia. “Baleia é mais governista do que o próprio Lira. Como se diz independente se os senadores do partido que preside são líderes do governo?”, questiona, por exemplo, o deputado Júlio Delgado (MG).
Uma das líderes de oposição que anunciou apoio ao bloco de Maia e Rossi na semana passada, Perpétua Almeida (PCdoB-AC) admite que “esse processo tem etapas”. “A primeira foi a deliberação de estar no bloco para fazer o enfrentamento à candidatura de Bolsonaro. A segunda fase é as duas partes discutirem as candidaturas. A esquerda está discutindo se vai apresentar o nome ou acolher o nome do centro”, afirmou.
Pautas “retrógradas”
Muitos deputados da oposição acham, contudo, que o tempo da esquerda lançar o próprio candidato pode já ter passado. Também consideram que a aliança com Maia e Rossi pode ser a forma mais eficaz de derrotar Lira e a “pauta retrógrada de Bolsonaro”. Por isso, a conversa de hoje também deve servir para que o grupo meça o apoio de Rossi às pautas que consideram prioritárias no debate legislativo.
Entre as prioridades da oposição, estão a garantia da democracia e da independência das instituições; o olhar crítico a “pautas retrógradas” e a privatizações; e a discussão de pautas sociais e trabalhistas. Deputados de esquerda ainda lembram que, se confirmado o apoio a Rossi, a oposição terá que ocupar alguns dos principais cargos da Casa, como a Secretaria da Mesa ou a vice-presidência, por conta da grande representatividade no bloco.
Em razão de todos esses impasses, Rossi disse que “com humildade, vamos conversar com cada um dos parlamentares para reafirmar o compromisso que assumimos”, que é a “defesa intransigente da democracia”. “Vamos dialogar com todos, especialmente com quem tem divergência. Vou conversar com todos os partidos do campo progressista. (...) O importante é focar na defesa da independência da Câmara”, escreveu o deputado, nas redes sociais, assim que foi definido como candidato da frente construída por Maia.
Ele também já tentou minimizar o impasse em relação ao impeachment de Dilma, dizendo que jamais fez “qualquer declaração de desapreço ou desrespeito” à petista e que votou a favor do impeachment para atender a “um pedido dos meus 208 mil eleitores no pleito de 2014”.
Lira aposta no voto divergente
Como a esquerda ainda parece rachada, mesmo depois de ter anunciado apoio ao bloco de Rodrigo Maia e Baleia Rossi, o Palácio do Planalto aposta em eventuais traições para garantir a eleição de Arthur Lira. A projeção da campanha do candidato de Bolsonaro é de que, se pelo menos 25 deputados dos 280 parlamentares que formam a frente do centro democrático não seguirem a orientação de votar no emedebista, ainda é possível garantir a Presidência da Câmara.
Por enquanto, as legendas que devem apoiar Lira são Avante, Patriota. PL, PP, Pros, PSC, PSD, PTB, Republicanos e Solidariedade, responsáveis por 205 cadeiras na Câmara. Com 10 deputados, o Podemos ainda não oficializou o apoio, mas também deve embarcar no grupo de Lira. Além disso, o deputado considera que o fato de a votação para a Presidência da Câmara ser secreta pode favorecer “traições” que vão beneficiá-lo.
Parte dos votos dissidentes deve vir do PSL, já que o partido ainda conta com um número expressivo de deputados bolsonaristas, 12 dos quais estão, inclusive, suspensos. Se o impasse do PSB não for resolvido, Lira também pode levar alguns votos socialistas, pois deputados como Felipe Carreras (PE) já avisaram que não votarão em Rossi. Até deputados do MDB podem acabar engrossando as traições a favor de Lira, já que o partido é casa de alguns líderes do Executivo, caso dos vice-líderes do governo na Câmara Paulo Azi (DEM-BA) e Lucio Mosquini (MDB-RO), e do vice-líder do governo no Congresso Pedro Lupion (DEM-PR).
Lira está de olho, então, nos possíveis dissidentes para intensificar as negociações. Hoje, por exemplo, o deputado também deve circular por Brasília. Ontem, ele ainda reforçou a disposição para o diálogo nas redes sociais. “Cada deputado representa milhares e até milhões de brasileiros. Dar voz a cada um é respeitar o eleitor na ponta. Isso se faz com diálogo, construindo maioria e fazendo a pauta andar — sem atropelar ou silenciar nenhum colega. Porque quando um presidente impõe sua vontade, o povo fica de lado”, escreveu.
Antes disso, o candidato de Bolsonaro também refutou as críticas de que a sua eleição para a Presidência da Câmara significará a perda da independência da Casa. “A Câmara sempre será autônoma no seu funcionamento”, garantiu.