Com otimismo e confiança na candidatura do senador Rodrigo Pacheco ao cargo de presidente da República em 2022, Gilberto Kassab, presidente do Partido Social Democrático (PSD), falou com exclusividade ao Correio sobre o que se desenha para o plano de governo. Kassab, que é ex-prefeito de São Paulo, ex-deputado federal e ex-ministro, adiantou que educação e saúde terão prioridade na pauta do PSD.
Por Denise Rothenburg / Taísa Medeiros
No último levantamento da Ipespe, divulgado na sexta-feira (14/1), o pré-candidato do PSD aparece com apenas 1% das intenções de voto. O cenário não preocupa Kassab: "Na minha campanha eleitoral para prefeito de São Paulo, no mês de junho eu tinha 3%, e eu ganhei as eleições do Geraldo Alckmin e da Marta Suplicy. Hoje, com os meios de comunicação ágeis, com as redes sociais, nós conseguimos mandar uma proposta a todo o Brasil em um espaço muito curto de tempo", argumenta.
Quanto à possível candidatura de Alckmin como vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Kassab afirma que seria "leviandade comentar sem saber as circunstâncias", e, por isso, prefere aguardar as cenas dos próximos capítulos. Apesar disso, garantiu que não há vaga no PSD para que Alckmin entre como candidato a vice com Lula. Confira a entrevista:
No início do ano passado, nós iniciamos um projeto de levar à Presidência do Senado uma pessoa muito qualificada, que é o senador Rodrigo Pacheco. Ele ganhou a eleição do Senado, depois com o tempo acabou aceitando o convite do PSD. Depois da sua filiação, nós fizemos um grande encontro nacional do partido, onde abraçou a candidatura. Acredito que, até março, nós teremos um momento adequado para a manifestação dele. Eu tenho muita confiança de que ele acabe aceitando o convite.
Quanto às candidaturas de governador, é evidente que não dá para aguardar até março. Nós nos antecipamos, como qualquer partido. Nós temos um bom encaminhamento para as candidaturas a governador em, aproximadamente, 12 estados. Nós teremos bons candidatos em Santa Catarina, no Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Sergipe, Maranhão, Maceió, Mato Grosso do Sul… A partir de abril, com as pré-candidaturas, inicia-se a pré-campanha, a formação das chapas para deputado federal, deputado estadual, e, com isso, vamos nos consolidar como um dos grandes partidos do Brasil.
O senhor desistiu de Geraldo Alckmin como candidato em São Paulo? Ele vai mesmo ser vice do Lula?
O Geraldo Alckmin iniciou dizendo que seria candidato a governador, e nós acolhemos a sua candidatura, qualquer que fosse o partido. Em um determinado momento, ele nos procurou, desistindo de ser candidato a governador, o que eu entendo. Não existe nenhuma mágoa, nenhuma restrição à conduta. A partir desse momento, nós voltamos a procurar discutir os melhores nomes para nos representar, e estamos nessa fase.
Mas já saiu por aí que o senhor vai colocar como candidato um prefeito que hoje é do PSDB? Já está fechado isso? Um prefeito ali da região do ABC?
Não tem essa definição. Nós estamos levantando alguns nomes, que tem perfil para ser governador, pela formação, experiência política: Elias Paiva, Ricardo Patah, Guilherme Campos, Walter Rocha, Marco Bertagnolli, e alguns outros. O que as pessoas têm me perguntado, caso se filiem novos quadros, como o prefeito de São José dos Campos, o Felício, que inclusive era para ser filiado no último dia, mas por conta de covid, acabou não se filiando. Seja o prefeito de Santo André, o ex-prefeito de Santos, é evidente que se tiver o ok deles poderemos avaliar também o nome. Hoje, o que temos de concreto, são os que já estão no PSD, e que é certo que estarão vindo para o partido, são os colegas de São José dos Campos.
E como o senhor avalia essa decisão de Geraldo Alckmin de dizer que não será candidato a governador, que pelo que o senhor está contando, ele já disse. E aparecer como candidato a vice de Lula?
É difícil fazer uma análise quando a gente não conhece as circunstâncias. Então, eu prefiro aguardar um pouquinho para ver o que é essa circunstância, se ela vai se concretizar, o que envolve… Para, depois, me manifestar em relação ao acerto ou não da aliança. Eu não tenho o conhecimento necessário dos detalhes da conversa, que, talvez perante a opinião pública, não é definitivo, eu vejo pelas manifestações que é um desejo de alguns, de ambas as partes. Vamos aguardar, porque falar que tem ou não tem sentido sem entender o que está sendo discutido é até leviandade.
O senhor vê perspectiva dessa união dar certo, uma vez que já tem um grupo do PT com manifesto correndo contra a colocação de Geraldo Alckmin como vice numa chapa com Lula?
Eu sou contra a coligação nas eleições. Trabalhei para que a gente acabasse com as coligações nas eleições proporcionais. E se a gente tivesse acabado com as coligações nas eleições majoritárias, a gente não estaria vivendo esse processo. Nós estaríamos discutindo propostas de governo, compromisso com a nação. Hoje, você só tem jogo de palavras, as pessoas prometendo isso ou aquilo, e ninguém examinando com profundidade a questão das contas públicas, como vamos zelar pelas contas públicas, a questão da saúde, como vamos investir, mas, por outro lado, acompanhar com fiscalização mais rigorosa. Essa pandemia mostrou que o SUS é fundamental, a saúde pública é fundamental. Nós temos que falar de informatizar a rede. Como pode num país dessa dimensão a rede pública não estar informatizada? Tem algo por trás... Seria tão fácil, é uma questão só de investimento. Na educação, nós tivemos, com essa pandemia, uma clara evidência de quanto nós estamos mal no ensino público. Nós vimos as crianças que estão no ensino público ficarem paralisadas dois anos, ao passo que as crianças do ensino particular não tiveram em nenhum momento a interrupção dos seus estudos. Aumentou o distanciamento social. É isso que a gente precisava ficar discutindo, não discutindo se vão apoiar fulano ou ciclano. Não é isso que o brasileiro quer saber, ele quer saber quando nós vamos melhorar o Brasil.
Aproveito essa sua colocação para questionar o projeto de governo que será apresentado pelo PSD aos brasileiros. Nas últimas entrevistas, o senhor comentou que haverá destaque especial para a educação e a saúde. Isso procede?
Já se consolidou no partido a tese de se privilegiar a questão da saúde e da educação, foi convidado para compor como coordenador de um plano de governo para o agronegócio e agricultura, o ex-ministro Roberto Rodrigues, que aceitou. Isso não quer dizer que ele irá votar em Rodrigo Pacheco, vamos deixar claro. Se outros candidatos quiserem dele o mesmo empenho, ele terá, mas o Rodrigo tem no Roberto Rodrigues uma relação de muita confiança. Com muita calma, vamos construindo o resto do plano de governo. Na economia, ele também gosta de ouvir o Armínio Fraga, também não significa que o Armínio tá com o Rodrigo, mas ele lê muito os textos do Armínio, e é uma referência para ele.
Eles já conversaram?
Estiveram juntos poucas vezes e estarão outras vezes, sem nenhum compromisso do Armínio Fraga com a pré-candidatura ou com a candidatura.
Está consolidado: a gente pode dizer que Rodrigo Pacheco vai ser candidato? Ou isso ainda pode mudar?
Não podemos considerar consolidado porque ele ainda não deu o seu ok. E eu dou razão a ele, é presidente do Senado, tem muitas responsabilidades, não percebi nenhuma tensão no partido em relação a sua candidatura, então, ele tem que avaliar com muita calma. Eu sou daqueles que torce e trabalha para que ele aceite, e, com muita calma, eu imagino que ao longo do mês de março ele vai se definir. Eu tenho uma confiança muito grande que a definição será pelo aceitamento.
E dá tempo de ele subir nas pesquisas e quebrar essa polarização? Ou algum outro candidato o senhor acredita que possa quebrar essa polarização?
Na minha campanha para eleição para prefeito de São Paulo, no mês de junho, eu tinha 3%, e eu ganhei as eleições do Geraldo Alckmin e da Marta Suplicy. Hoje, com os meios de comunicação ágeis, com as redes sociais, nós conseguimos mandar uma mensagem,uma proposta a todo o Brasil em um espaço muito curto de tempo. Eu não vejo nenhum problema e nenhuma necessidade de antecipar o calendário.
Voltando a falar de Alckmin, é seguro dizer, então, que ele não tem vaga no PSD para ser candidato a vice?
A franqueza é muito importante. Nós não vamos deixar uma pessoa do gabarito de Geraldo Alckmin se filiar sonhando com algo que possa não acontecer. Nós temos, no PSD, quadros muito valorosos, que, se por acaso tivesse uma aliança, seriam apresentados para ser o vice, caso tivesse essa aliança. Faço isso de uma maneira muito respeitosa, ele é muito qualificado, mas não vejo a menor chance dele ser vice do Lula pelo PSD.
E se o Alckmin quiser voltar? E ser candidato a governador? Aceita ele de volta?
Se ele tiver um projeto definido. Se já tivermos candidato a essa altura, fica difícil, mas impossível nunca é. Mas tudo será feito com respeito a um projeto que tenha sido colocado com apoio do partido.
Pacheco está vindo aí meio espremido entre o centrão, que faz parte do grupo que ajudou a eleger (e que já está) com Bolsonaro, e a oposição está com Lula. Como vai ser essa atração de partidos? O senhor vislumbra alianças para Rodrigo Pacheco?
Nesse momento, o partido está muito bem estruturado. Nós, a partir do momento que o Rodrigo der o ok ao convite do partido, ele terá uma rede aqui dentro muito importante, e vai ter a disposição dele os meios de comunicação e as redes sociais para levar a sua mensagem, o que levará ele, a ser muito conhecido em pouco tempo, e mais do que ele ser conhecido, as suas propostas serem conhecidas. Ele é muito bem preparado, talentoso, tem tudo para conquistar a confiança do eleitor, como ele conquistou quando foi candidato a deputado federal, como conquistou quando foi candidato a senador, e não será diferente como candidato a presidente.
E como vê a candidatura de João Doria, o senhor que já trabalhou no governo dele, que já esteve mais ao lado do PSDB? Como vê o PSDB hoje e essa pré-candidatura? Há possibilidade de união entre ele e Pacheco num primeiro turno?
Não. O Pacheco vai até o fim, eu espero, e eu acredito que realmente o João Doria está em campanha desde que assumiu a Prefeitura de São Paulo. E depois se elegeu como governador, e não está decolando com uma campanha intensa de praticamente seis anos. Ele está com dificuldades. É uma situação distinta, porque o Rodrigo nem começou a pré-campanha, nem disse ainda se vai aceitar ser candidato.
Em relação ao ex-juiz Sergio Moro, como o senhor vê a candidatura dele?
Assim como o João Doria, ele já está em campanha. Está com um número um pouco mais elevado, acho que a sua pré-candidatura colocada nesse momento atrapalhou um pouco os planos do Doria, porque ele ocupou um espaço que poderia ser do Doria, mas temos que aguardar as próximas semanas para ver se crescerá ou seguirá estagnado.
Em relação a essa união no primeiro turno, o senhor vê perspectiva? A união entre esses candidatos chamados de terceira via?
Acho difícil, e é compreensível. Já são poucos candidatos.
Como vê a candidatura de Bolsonaro? O senhor chegou a dizer que não acreditava na ida do presidente ao 2º turno. Continua pensando assim ou essa sua avaliação já mudou?
Continuo dizendo que se um dos dois não estiver no segundo turno, provavelmente, será o Bolsonaro. Diante das pesquisas, é a avaliação política que faço e da conduta do presidente.
E o senhor criticou o “chute no balde” que ele deu nos tetos de gastos para que pudesse fazer medidas eleitoreiras. Como está vendo o Auxílio Brasil? É uma medida eleitoreira? O brasileiro percebe isso?
Não, o Auxílio Brasil não é uma medida eleitoreira. O governo tem obrigação de colocar à disposição dos menos favorecidos esse recurso, que é do governo. O que eu vejo com muita preocupação, é o descontrole das contas públicas. Não há controle nenhum das contas públicas, o teto de gastos foi para o espaço. Veja se tem sentido, no decorrer do orçamento, o governo mudar de mãos, tirar da economia, para colocar na Casa Civil. São critérios diferentes, pessoas diferentes, cadê a lógica? Como é que pode você, como brasileiro, aceitar que o Congresso invista, gaste, mais de R$ 16 bilhões, no tal do orçamento secreto, que não tem nenhuma vinculação com o planejamento, o desenvolvimento do país. Alguma coisa está errada.
Por falar em orçamento secreto, o senhor acha que isso veio para ficar ou vai ser possível tirar, acabar com essas emendas do relator, que receberam esse apelido?
Na próxima legislatura eu vou estar entre aqueles que vai se manifestar pelo fim dessas emendas, porque realmente, elas atrapalham o país. Você não pode ter R$ 16 bilhões sem vinculação com o planejamento estratégico. Na próxima legislatura, vamos trabalhar para acabar com a coligação majoritária, são duas medidas fundamentais.
Ou seja, cada partido vai ter que ter o seu candidato a presidente então?
No segundo turno, apoia. Caso não tenha segundo turno, por causa das eleições municipais, você, com os vereadores eleitos, você negocia governabilidade, o que acontece em qualquer lugar do mundo.
Acha que isso passa?
Eu vou trabalhar pra passar.
E o senhor falou que o PSD vai defender o fim das emendas de relator. O senhor acredita que o futuro presidente vai ter que fazer um pacto com o congresso pela governabilidade, em relação ao Orçamento, depois dessa captura do orçamento pelas presidências da Câmara e do Senado?
Pela lógica, o Congresso, pela sua disposição e por ter um volume de recursos maior do que o próprio Executivo, isso não tem lógica nenhuma. Cada um dos deputados e senadores fazer o que quiser, basta ir lá bater na porta do do presidente da Câmara e falar “olha, quero esse dinheiro para aquele município”. Eu vou trabalhar para nós retomarmos o Orçamento para o Executivo. Se não for bem sucedido, eu vou estar em paz com minha consciência.
Agora o senhor tem ouvido isso de outros presidentes de partido ou vai como um cavaleiro solitário nessa missão?
Infelizmente estou sozinho. Mas acho que vai aparecer muita gente do bem que vai defender. Os próprios parlamentares, que antes de mais nada querem o melhor para o Brasil, vão acabar se convencendo.
Como é que o senhor vê o Centrão atuando? Até hoje, quem está ali mais organizado para concorrer à reeleição é o presidente Jair Bolsonaro, que já tem o PL, o PP, o PTB, PSC, o Republicanos… Não acha que ele chega bem para se fortalecer para um segundo turno?
O coração da candidatura de Bolsonaro é o PP, o PL e o Republicanos. É um coração forte, o Centrão. Eles vêm carregados de recursos com as emendas que são distribuídas aos municípios. Eu não acredito que o presidente Bolsonaro seja carta fora do baralho para o segundo turno.
O PT está trabalhando para ganhar a eleição em um primeiro turno. O senhor acredita nessa possibilidade?
Não acredito, acho muito difícil. Com a animosidade compreensível da pré-campanha que se inicia em abril, terá um desgaste.
Recém-substituído pelo ex-advogado-Geral da União e ex-ministro da Justiça André Mendonça, na 11ª cadeira do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro aposentado Marco Aurélio Mello acaba de reativar a inscrição na seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro. Ele atuará como parecerista, o que significa que continuará atento aos temas relevantes do país.
Jorge Vasconcellos - Correio Braziliense
Nos últimos dias, um assunto que o desagradou foi a promulgação, pelo Congresso, de mudanças na Constituição que autorizam o governo federal a adiar o pagamento de precatórios — dívidas do setor público reconhecidas pela Justiça. Em entrevista ao Correio, Mello diz que esse "não é o exemplo que o Estado deve dar", já que "o cidadão comum tem 24 horas" para pagar suas dívidas, "sob pena de ter bens penhorados".
A ida de Mendonça para o Supremo foi comemorada por Mello, para o qual é importante que o novo magistrado "perceba a grandeza da missão de julgador". Sobre o perfil "terrivelmente evangélico", citado pelo presidente Jair Bolsonaro como requisito para ser indicado a uma vaga na Corte, o jurista classifica como um "arroubo de retórica que acabou criando percalços" para Mendonça — por causa de resistências políticas, ele esperou quase cinco meses para ser sabatinado no Senado.
Sobre a atuação do Supremo na pandemia da covid-19, Mello afirma que o tribunal tem agido no "vácuo deixado pelo Executivo". A seguir, os principais trechos da entrevista:
O STF tem agido para garantir a adoção das medidas adequadas de combate à pandemia da covid-19? Por que esse protagonismo da Corte?
Ele acaba atuando no vácuo. E como não se pode afastar da apreciação do Judiciário a ameaça ou a lesão a direito, ele age, evidentemente, implicando até mesmo, como neste caso do certificado de vacinação, desgaste para o Executivo nacional. O Executivo nacional devia ter adotado as providências, como vários países adotaram.
A atuação do STF para a manutenção do Estado Democrático de Direito é satisfatória?
O Supremo, às vezes, precisa ser contramajoritário e adotar posições que não são do agrado da sociedade em geral. É seu papel. O STF é guarda da Constituição Federal. Ele vem buscando manter a intangibilidade desse documento básico, que é a Carta da República.
O presidente Bolsonaro voltou a dizer que pode jogar fora das quatro linhas da Constituição, em mais uma ameaça ao Supremo. Desde a redemocratização, o senhor já tinha visto algo parecido entre chefes da República e o STF?
O presidente tem uma forma desabrida de atuar e parte para o arroubo de retórica, o que não contribui, realmente, para a perfeição do entendimento. Mas atribuo, e continuo atribuindo, a arroubo de retórica. Ou seja, algo irrealizável, porque a democracia veio para ficar, e ela, passo a passo, está sendo robustecida.
Durante o ápice da crise entre Bolsonaro e STF, o senhor chegou a temer uma possível ruptura institucional?
Não, não temia. Agora mesmo, a mídia veiculou que estaria sendo convocado para prestar serviços (no Tribunal Superior Eleitoral), claro que não de uniforme, um general reformado (Fernando Azevedo e Silva, ex-ministro da Defesa) para evitar um golpe. Ora, se dependermos disso, no Brasil, nós teremos que convocar para servir no Judiciário reservistas e, aí, o Judiciário contrata uma tropa. Não é por aí que se resolve possível descompasso de entendimento entre Poderes.
A Constituição passou por várias alterações desde que foi promulgada. Mudanças importantes, como a reforma da previdência e, agora, a possibilidade de o governo adiar o pagamento de precatórios. Ainda se pode chamar essa Constituição de “cidadã”?
Em primeiro lugar, quando você pensa a Constituição, você imagina um documento estável, um documento editado para viger por prazo indeterminado. O que nós tivemos na nossa Constituição de 1988? Mais de uma centena de emendas constitucionais. Eu até costumo brincar que uma vez um cidadão entrou em uma livraria e tentou adquirir um exemplar da Constituição, e o atendente disse, simplesmente, que aquela livraria não trabalhava com periódicos.
Essa alteração constitucional que permite ao governo federal adiar o pagamento de precatórios é correta?
É possível chegar-se ao ponto de reconhecer a dívida e, simplesmente, programar que se pagará quando se quiser? Não. O que prevê a Constituição Federal? O cidadão comum tem 24 horas, citado para pagar, sob pena de ter bens penhorados. O Estado tem 18 meses — e não paga. Nós tivemos, depois da Constituição de 1988, várias moratórias. Então, se vai empurrando a dívida, que vai crescendo cada vez mais. Aí se diz que não há recursos para satisfazer o pedido — e mediante título judicial, pronunciamento do Judiciário, pressupondo-se que tenha tramitado processo durante alguns anos. Realmente isso não implica o exemplo que o Estado deve dar.
O senhor considera que as mudanças trazidas pela PEC dos Precatórios serão judicializadas?
O Judiciário sempre tem o protocolo aberto àqueles que se sintam prejudicados por um ato do Estado, por um ato do governo. E acaba tudo desaguando no Judiciário, que paga um preço incrível pela atuação — mas, paciência!, é a democracia e o Estado Democrático de Direito. O que não se pode, porque aí haveria transgressão a uma cláusula constitucional, é afastar do crivo do Judiciário lesão a direito ou ameaça de lesão a direito, sendo que essa última cláusula justifica a existência de liminares e de tutelas antecipadas.
A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, no fim de novembro, a admissibilidade da proposta de emenda à Constituição que altera, de 75 para 70 anos, a idade para aposentadoria compulsória de ministros do STF, demais Cortes superiores e Tribunal de Contas da União (TCU). Qual a opinião do senhor?
Estava pronto para me aposentar em 2016, aos 70. Veio a PEC da Bengala e eu saí depois de completar 75. Agora, essa nova proposta peca, primeiro, porque não dá tratamento isonômico ao servidor do Estado, ou seja, deixa de fora os servidores, e cogitou apenas da observância com a redução da expulsória dos 75 para os 70 quanto ao Judiciário. Em segundo lugar, nós precisamos, no Brasil, é, principalmente, de homens públicos que observem as regras existentes. Essas idas e vindas não são salutares para a estabilidade que se almeja, a segurança jurídica. Não vejo com bons olhos essa proposta e o recuo é num espaço de tempo pequeno.
Um dia depois de a Comissão da Câmara aprovar a PEC que reduz a idade para aposentadoria compulsória dos ministros do STF, a Câmara criou uma comissão especial para analisar uma outra PEC — amplia de 65 para 70 anos a idade máxima para indicados ao Supremo. Há rumores de que a ideia seria a de facilitar a indicação de aliados do presidente Bolsonaro. O senhor concorda?
Não acredito que o objetivo seja esse. Acredito que essa majoração decorra do fato de se ter alterado a expulsória dos 70 para os 75. E aí, se for isso, é uma proposta orgânica, uma proposta harmônica com essa majoração que houve quanto à expulsória. Não vejo como direcionar a um certo resultado, um resultado como se praticamente a emenda constitucional tivesse nomes de beneficiários e prejudicados. Não vejo como se partir desse pressuposto, que visa a ensejar ao presidente da República a indicação de outros integrantes. Creio que o presidente está satisfeito com as duas indicações ocorridas. Estive no Supremo para prestigiar a posse do ministro André Mendonça. Foi uma substituição que me deixou contente.
Por falar em André Mendonça, ele é um ministro ‘terrivelmente evangélico’, segundo o presidente Bolsonaro. Esse perfil é condizente com o de um integrante do STF?
Mais um arroubo de retórica do presidente, que acabou criando percalços para o indicado no Senado. Confio que André Mendonça será um grande juiz e que, com a capa sobre os ombros, terá uma atuação como convém. Uma coisa foi André Mendonça como auxiliar do presidente da República, no Ministério da Justiça; outra como advogado da União, e outra será como julgador. Ser juiz é uma missão sublime, e aquele que o é deve perceber a grandeza dessa missão. É o que eu espero do André Mendonça. Tanto que, quebrando até o que costumo fazer normalmente, fui à posse dele para revelar que aposto na atuação dele como julgador.
Sobre o atual estágio da relação entre os Poderes, após um período de grande turbulência, como o senhor analisa?
Veio da Constituição Federal que a República está num tripé. Um tripé constituído pelos três Poderes, que, pela Constituição, são harmônicos e independentes. Com cada qual atuando em sua área, não extravasando os limites estabelecidos na Constituição, teremos um avanço social.
Sucessivas pesquisas refletem baixos índices de aprovação popular ao trabalho do STF. A que o senhor atribui isso?
Se lá estivesse, reexaminaria os meus votos. E foi o que eu falei há pouco: às vezes, o Supremo tem que ser contramajoritário, tem que adotar uma postura que contraria o anseio popular, mas tem o dever maior que é o de preservar a Constituição. O Supremo não pode criar um critério de plantão para atender a um anseio que tenha a população.
Após cinco meses de aposentadoria, como é a vida sem o peso da toga do supremo?
É, realmente, mais leve. Mas, com o ofício judicante, nunca me preocupei de vir para casa e não poder dormir. Estive em colegiado julgador durante 42 anos, e na linha de frente, pegando no pesado. Hoje, tenho todo o tempo do mundo e não me sobra tempo, porque possuo uma atividade como cidadão muito rica, e cuido das minhas leituras, cuido das minhas coisas, cuido da natureza onde moro. Estou vivendo na plenitude dos meus 75 anos muito satisfeito, com muita leveza.
Após a aposentadoria no STF, o senhor continua se dedicando ao direito?
Reativei minha inscrição na seccional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) no Rio de Janeiro. E fiquei contente, porque vou permanecer com o número que eu tinha. Era 21 mil e qualquer coisa, e hoje já está em 60 mil, 70 mil. Advogar para fazer foro não, mas estaria à disposição, se acionado, para pensar no direito e emitir o meu convencimento sobre algum conflito de interesses. Ou seja, para atuar como parecerista.
O cacique da legenda, Carlos Lupi, sustenta que projeto estruturado para o país diferencia o pré-candidato Ciro Gomes
Por Tainá Andrade e Taísa Medeiros
A terceira via da corrida presidencial nas eleições de 2022 ganhará mais um concorrente tarimbado: o ex-governador Ciro Gomes (PDT). Em entrevista ao Correio Braziliense/Diários Associados, Carlos Lupi, presidente do Partido Democrático Trabalhista (PDT), confirmou o anúncio da candidatura na pré-convenção nacional do partido, marcada para 21 de janeiro. Será a terceira tentativa de Ciro se tornar presidente da República. Em 2018, ele chegou ao terceiro lugar no primeiro turno.
Com bagagem política que acumula comandos de prefeitura, governo estadual e ministério, e mandatos de deputado estadual e federal, o presidenciável usará a sua experiência como estratégia de peso contra os adversários. De acordo com a última pesquisa do instituto Datafolha, publicada no último dia 16, Ciro Gomes tem 7% das intenções de voto para presidente, o que o posiciona em quarto lugar na disputa. Lupi é otimista. “Pesquisa é que nem nuvem, cada hora está em um canto”, sustenta.
Quanto às denúncias que envolvem Ciro Gomes e o irmão Cid de suposto desvio de verba nas obras do estádio Arena Castelão, de Fortaleza, investigadas pela Polícia Federal, Lupi assegura que não será empecilho para Ciro crescer na disputa. O presidente do PDT cita a canção entoada por Alcione “Quem fala a verdade não jura, nem tem medo de errar”. Confira a entrevista.
Existe unanimidade no PDT em torno da candidatura de Ciro Gomes?
O partido está unido. Vamos fazer no dia 21 de janeiro uma pré-convenção nacional onde vamos confirmar a candidatura do Ciro. No dia 22 de janeiro, que seria a data na qual Leonel Brizola comemoraria 100 anos, vamos fazer uma série de atos, em comemoração ao centenário. Haverá a inauguração de uma estátua dele na sede do partido, com painel de exposição da sua biografia na Câmara dos Deputados e uma Sessão Solene.
O que o candidato tem a ofererecer como representante do partido?
Em 2016, quando o Ciro se filiou ao PDT, começamos a construir o projeto para salvar o desenvolvimento. Ele foi candidato em 2018 já na construção desse projeto. Durante a campanha, consolidou esse projeto e lançou, em 2020, um livro sobre esse projeto com todas as causas e efeitos, todos os problemas do sistema macroeconômico, das áreas de energia, social, saúde, educacional, meio ambiente. Apresentou a radiografia e as soluções. A candidatura do Ciro representa um projeto nacional de desenvolvimento que começa na década de 30, do Getulio (ex-presidente Getulio Vargas), quando quebrou a hegemonia da política café com leite – Minas Gerais e São Paulo – e começou a criar um projeto para o Brasil. Ciro representa essa modernização do projeto que começou com Getúlio em 1930. Estamos convictos de que esse é o melhor caminho para o Brasil.
Ciro Gomes foi alvo de operação da Polícia Federal, que investiga desv io de dinheiro público. Isso pode atrapalhar a campanha do candidato ao Palácio do Planalto? Ele foi aconselhado a desistir da candidatura?
Ciro não está envolvido em nada. Teve uma investigação da Polícia Federal determinada por um juiz, anos depois do fato para fazer busca e apreensão na sua residência. Primeiro, é muito estranho que oito a 10 anos depois do fato acontecido, da denúncia apresentada, a justiça só apareça agora, às vésperas das eleições, dando claramente uma conotação política eleitoral. Segundo, ele não está envolvido em nada. A denúncia que se apresenta é de um delator. O que o delator é? Ele sempre ganha algum benefício para conseguir entregar alguém. Eles têm que provar. A justiça é clara! Todo mundo é inocente até que se prove o contrário. Qual a prova que eles têm? Qual é o fato? O Ciro não estava no poder, não era secretário, não era assessor, não estava em nenhuma função pública. Você sabe que a música é uma terapia e tem uma que a Alcione canta que fala assim: “Quem fala a verdade não jura, nem tem medo de errar”. Nenhum de nós tem medo da verdade, ela é libertadora.
Numa campanha polarizada e na qual pré-candidatos se apresentam como terceira via, quais são os motivos que levam o PDT a acreditar que a candidatura do Ciro Gomes ganhará musculatura?
Quem escala candidato é a população, não é a pesquisa (de intenção de voto). A pesquisa pode priorizar até a fotografia daquele momento. Pesquisa é que nem nuvem, cada hora está em um canto. O Bolsonaro perdeu 60% dos seus eleitores. Nesses 20, 21, 22, 23% [que ele ainda tem], é óbvio que na hora que você faz uma comparação pela inflação, pelo desemprego, pelo desrespeito à medicina, pela COVID, que matou mais de 600 mil, ele é corresponsável pelas mortes que tivemos, inclusive está sendo denunciado. Quando você faz a comparação leva uma grande vantagem frente a um governo que não fez. Agora, não se pode colocar e resumir a inteligência do povo brasileiro em um ringue entre o passado e presente. Queremos olhar o futuro e o futuro não pode ser ligado nem ao passado, nem ao presente. O futuro é o amanhã e somos o único partido que apresenta consolidado um projeto com começo, meio e fim, com proposta para cada setor e, mais, com a coragem de tocar no sistema financeiro.
No cenário, o ex-juiz Sergio Moro tem sido apontado como ameaça aos adversários. Na opinião do senhor, eles competem pelo menos grupo de eleitores, os críticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do presidente Jair Bolsonaro?
Nisso eu concordo com você. É tipo matriz e filial. O Bolsonaro virou matriz em um segmento da sociedade em que ele é raivoso, homofóbico, racista, e que representa esse percentual que está tendo aí de 20, 21, 22, 23%. E o Moro é uma filial que tenta buscar esse mesmo campo. Nessa briga entre matriz e filial a gente não tem que se meter. Temos que sentar em uma cadeira e ver essa competição. Acho que o Brasil tem que apostar na inteligência do povo. Temos que discutir projeto. Não é sobre liderança mais popular, mais carismática, mais simpática. Temos que buscar quem tem mais experiência, quem já foi testado e aprovado, quem tem uma vida com honra. Isso não é uma escolha de síndico, um chefe de torcida organizada. A Presidência da República no Brasil é a mais alta e importante esfera de poder. Não podemos apostar novamente em um ignorante para a presidência, para fazer essas coisas erradas que o Bolsonaro está fazendo. Por isso, eu acredito que o projeto que o Ciro representa é um programa com todas as áreas apresentadas, é a melhor saída possível para o povo brasileiro e nós vamos trabalhar para isso.
O PDT está articulando para a formação de uma federação? Como estão as conversas nesse sentido?
Federação é apenas uma estratégia de sobrevivência eleitoral. Somos um partido de princípio. Qualquer partido que precisar de ajuda da gente para sobreviver, daremos nossa contribuição. Mas não quebraremos nenhuma regra eleitoral. Estamos confiantes que em 2022 vamos eleger mais 35 deputados federais e alcançando mais de 5% do eleitorado. Conversa sempre existe. O diálogo é aberto a todo mundo que queira participar do projeto de reconstrução do Brasil.
Ex-presidente recebeu a equipe do jornal O TEMPO e rádio Super 91,7 FM em seu escirtório em São Paulo. Na entrevista, ele falou sobre a terceira via, frisou que os integrantes do centrão foram eleitos pelo voto democrático e admitiu não ser possível governar sem maioria no Legislativo
Por MARINA SCHETTINI E RICARDO SAPIA / O Tempo
Foi em escritório amplo, de decoração sóbria e elegante, no sofisticado bairro Itaim Bibi, em São Paulo, que o ex-presidente Michel Temer (MDB) recebeu a equipe do jornal O TEMPO e da rádio Super 91,7 FM. Entusiasmado com sua volta ao cenário político, Temer se disse surpreso com a repercussão, inclusive econômica, de sua intervenção na crise institucional entre Planalto e Supremo. Falou sobre a terceira via e relembrou momentos polêmicos, como o impedimento de Dilma e o vídeo em que supostamente discutia pagamento de propina. O ex-presidente ainda frisou que é preciso respeitar o fato de os integrantes do centrão terem sido eleitos pelo voto democrático e admitiu ser impossível governar sem maioria no Legislativo. Confira abaixo a entrevista:
Presidente, vamos começar falando sobre o retorno do senhor à cena política, como um apaziguador. Ao longo da minha vida, eu sempre preguei a pacificação nacional. O que não significa que não possa haver divergência doutrinária, programática, administrativa e até ideológica, mas não pode haver o que há nos dias atuais, que é uma divergência quase física. Muitas vezes, as pessoas vêm me consultar, trocar ideias. E, quando posso, dou alguns palpites. Mas o interessante, na sexta-feira que antecedeu o 7 de Setembro, foi que recebi muitos pleitos no sentido de dizer, “olha, Temer, você poderia colaborar um pouco por essa distensão no país”. Eu disse “o que eu posso fazer?”. Absolutamente nada, mas veja que interessante como roda o universo. Na quarta-feira, dia 8, às 20h, o presidente me liga gentilmente para perguntar o que eu achei do movimento nas ruas. Eu disse: “o senhor levou muita gente para as ruas, agora seu discurso, se me permite dizer, não foi apropriado para um presidente da República, porque agredir um ministro do Supremo publicamente é muito equivocado, até para o país”. Ele disse que queria paz: “O senhor sabe que eu estou querendo paz, tranquilidade. E o senhor é muito amigo do ministro Alexandre (de Moraes), e eu queria transmitir essa mensagem de pacificação”. Naquela noite, eu converso com o Alexandre e digo: “olha, o presidente me ligou”. E o ministro disse: “você sabe que eu só decido juridicamente, eu não tenho nada contra o presidente, nem contra a família dele, nem contra os amigos”.
O senhor acredita que o recuo de Bolsonaro será duradouro ou foi apenas uma estratégia diante da repercussão ruim dos atos de 7 de Setembro? O que ele falou com Moraes na conversa que o senhor intermediou? Só me lembro de uma primeira parte, e é até aqui que posso contar, sobre uma brincadeira que ele fez com o ministro Alexandre. Ouvi-o (Bolsonaro) dizendo: “o ministro é corintiano, e eu sou palmeirense. É sobre a única coisa que vamos brigar”. Eu senti que a conversa foi cordial e que distensionou. Mas (a repercussão) veio logo, pois quando saí me mostraram já a reação da bolsa com um pico para cima e o dólar caindo. Acho que vai perdurar (a mudança de postura). Dias depois, ele (Bolsonaro) fez uma fala no Planalto sobre a união dos Três Poderes. E eu torço até para que isso perdure.
Por que a terceira via não deslancha? Tem algum nome com viabilidade? Essa história da terceira via, muito mais que homenagem ao eventual candidato, é uma homenagem ao eleitorado. O eleitorado entre dois polos, se ele não quiser um desses dois polos, ele tem opção. E eu percebo é que os pré-candidatos hoje estão se lançando como candidatos. A significar, portanto, que a chamada terceira via vai espalhar muitos votos. O que vai enfatizar a ideia da polarização. Digo e reitero: seria extremamente útil se tivesse outra opção. O povo pode escolher entre um dos polos. Foi eleito, pronto, acabou. Agora, para dizer quais dos nomes, são tantos que eu não sei quem poderia ser bem-sucedido.
O senhor acredita que ainda há tempo para construir uma aliança e apresentá-la ao eleitor para 2022? Tem tempo de sobra. A campanha eleitoral tem 45 dias, significando, portanto, que os candidatos a presidente serão lançados lá pelo fim de agosto, começo de setembro. Estamos a um ano das eleições. E, na política, isso eu aprendi com os mineiros, as coisas podem mudar de um dia para o outro. Você tem muito tempo para escolher um candidato. Volto a dizer: pelo cenário atual, acho difícil a escolha de um único nome. Mas, para ser coerente, eu preciso dizer que nada do que eu digo aqui está definido. Muita coisa está por acontecer.
A pesquisa mais recente do Instituto DataTempo mostra que o brasileiro quer mudanças na forma de conduzir o país. E um terço da população quer a chamada terceira via. Uma possibilidade de uma terceira via é uma vontade do eleitorado. Há alguns meses, eu percebi que partidos estavam conversando sobre pré-candidaturas a fim de ver, mais na frente, quem estaria mais bem colocado. Só que esses nomes já são conhecidos. Eu reitero que seria extremamente útil que tivesse outra opção. São tanto nomes que eu não sei quem poderia ser bem-sucedido. Tem outra coisa também: estamos há um ano da eleição, e isso não deve se concretizar.
O senhor aceitaria ser esse nome da terceira via para 2022? Isso não está no meu horizonte e acho difícil acontecer. Já fui três vezes presidente da Câmara dos Deputados, secretário, vice e presidente da República. Evidentemente, se um dia o Brasil inteiro viesse e dissesse “vamos colocar você lá”, aí muito bem, eu vou para o sacrifício, mas não está no meu horizonte.
Assim como o ex-presidente João Batista Figueiredo, o senhor disse, em outras palavras: “vocês vão sentir a minha falta”, e reapareceu agora, mais uma vez, em um momento difícil economicamente. Quando o senhor assumiu lá atrás, a esquerda chamava o senhor de “golpista”. O que foi mais difícil para o senhor: a prisão ou ser chamado de “golpista” durante o impeachment? Não foi uma prisão, foi um sequestro praticado pelo poder público, sem que houvesse um processo sequer formatado. Foi filmado, um espetáculo. Hoje eu dou risada disso, mas foi muito difícil. Quanto à oposição depois que eu assumi, achei natural. Quem perde o poder fica na oposição. Não há um protesto meu contra os protestos. Meu pensamento era o seguinte: se eu ficar me envolvendo com os acontecimentos (críticas), eles vão se agravar. Eu pensava que tinha pouco tempo para governar e queria trabalhar, e o brasileiro sabe o que eu fiz: teto de gastos públicos, reforma do ensino médio, modernização trabalhista, queda da inflação, queda dos juros. A oposição às vezes te indica até um caminho, ela é importante na democracia.
E o senhor acha que a população agora sente sua falta? Não sei dizer. Tem muita brincadeira, muitos memes, como “volta, Temer”. De fora, gente que acha que posso ser candidato, etc. Eu tomo isso como um reconhecimento ao meu governo. E era um reconhecimento que eu esperava que viesse historicamente, só daqui a dez anos, e que começou logo depois que eu saí do governo.
O senhor tem participado da costura para 2022 dentro do MDB? E como tem visto essa conversa com o ex-presidente Lula depois de tantos ataques relacionados ao impeachment da Dilma? O MDB sempre foi uma federação de líderes, mas não é de hoje, desde o começo foi assim. E há alguns deles que eram adeptos do ex-presidente Lula e que pelo jeito assim continuam. E outros não, outros são inimigos.
Em qual ala do partido o senhor se encaixa: na a favor ou na contra ligações com o ex-presidente Lula? Vocês conversaram depois do impeachment? Nós não conversamos. Eu conversava muito com ele antes, bem antes, mas depois não tivemos oportunidade de nos encontrar nem de conversar. Em nenhum momento. E eu espero que o MDB tenha candidato (à Presidência). E se me perguntarem de qual lado estou, vou responder que estou com o MDB.
O centrão é o maior inimigo do Brasil? Quem está no centrão não chegou lá por uma centelha divina, chegou lá por conta da única autoridade que tem poder no Brasil, que se chama povo. Então quem está no chamado centrão chegou lé por conta do voto popular. Portanto tem que ter respeito pela mensagem popular. Agora, o que se pode dizer é o seguinte: “mas quem está lá não deveria estar”. Se não devia estar, faça-se campanha para modificar. Esta é a fórmula. É a democracia.
Como o senhor enxerga essa forma de operar do centrão, esta troca por cargos em uma negociação quase que por projeto? O senhor acredita que isso traz benefícios para o país? Muita gente diz que o governo não deveria acolher indicações do chamado centrão. Mas no presidencialismo você precisa ter maioria parlamentar, senão você não governa. Você manda projetos de emenda constitucional, você manda projetos de lei, você edita medidas provisórias que têm que ser convertidas em lei. Quem é que faz tudo isso? É o Legislativo. Se você não tiver maioria parlamentar, você não governa. Ora bem, se você disser. E se você disse que esse pessoal do centrão não pode indicar ninguém, nem pode ter nenhum palpite, você, coerentemente, como presidente da República, teria que dizer o seguinte “eu não quero o voto dessa gente, essa gente não serve para nada”. E daí você começa já como presidente da República perdendo 120, 130 votos no Parlamento. Você acha que é possível uma coisa dessas? Não tem jeito, a não ser que você mude o sistema, “democracia não vale nada, só vale para mim. Eu sou autoridade suprema e ponto final”.
Não chegou a hora de o país mudar de rumo e virar um parlamentarismo? Essa é a grande reforma política que o Brasil precisa. Não necessariamente o parlamentarismo puro, nem o presidencialismo puro, eu prego o semipresidencialismo, que significa que a figura do presidente é significativa e que tenha funções relevantes, uma cópia do sistema português, no qual o presidente tem direito de veto e sanção. O governo praticamente se descola para o Parlamento, e a função de governar o país passa a ser do Legislativo. As vantagens são: acabar com os traumas dos impeachments, o Legislativo passar a ser executor e termos só dois partidos: oposição e situação.
O senhor viveu o momento do impeachment da Dilma, em 2016, e ajudou a impedir que isso acontecesse com Bolsonaro há pouco. Em que os dois casos se assemelham e em que eles se diferenciam? Eu não fiz isso, não tentei evitar o pedido de impeachment (de Bolsonaro). Nem estava na minha pauta. Se o Congresso quisesse, teria aberto o processo de impeachment, e eu não poderia mudar isso. Não me arrependi de nada, eu só cumpri a Constituição, que diz o seguinte “se o presidente da República renuncia, falece, qualquer coisa assim, se o cargo fica vago, quem ocupa o cargo é o vice. É que nós aqui, no Brasil, temos um absoluto desprezo pela figura do presidente da República. E a figura do vice é sempre muito desprestigiada, historicamente. E eu não sei se Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade ou não. O julgamento do impeachment é político, de conveniência e de oportunidade. E são coisas diferentes. No caso da senhora ex-presidente, foram pedaladas fiscais, e milhões de pessoas estavam nas ruas. Quem derruba presidente é o povo na rua.
Um dos momentos mais tensos do senhor enquanto presidente da República foi a divulgação do vídeo por Joesley Batista em que o senhor dizia ‘tem que manter isso’ em uma suposta alusão a pagamento de propina. O que o senhor quis dizer com essa frase? O senhor pensou em renunciar? Não pensei nisso um segundo sequer, pois, se tivesse falado ou se pensasse, provaria que eu teria culpa no cartório. Mas você não falou da frase antecedente, que cinco dias depois verificou-se que não existia. A frase era: “estou dando dinheiro para fulano de tal para manter o silêncio dele”. Daí eu disse “mantenha isso, viu”. Mas não era isso. A frase era “eu sou muito amigo de fulano, sabe que eu tenho longa amizade, eu estou de bem com ele”. Eu digo “mantenha isso”, o estar de bem com ele, não dar dinheiro. Isso foi descoberto. Cinco dias depois, quando foi divulgada a gravação. E tem mais uma coisa. A certa altura, a gravação foi desmoralizada pela Justiça. O procurador apresenta uma denúncia de cem páginas, e o juiz de primeiro grau, em oito ou dez páginas, diz que é absolutamente imprestável, não precisa ouvir ninguém. Não precisa ouvir acusado, não precisa ouvir testemunha. Não precisa mais nada. Eu absolvo sumariamente porque não há o que fazer neste caso. E essa decisão já foi até convalidada pelo Tribunal Superior. Isso só serviu para tentar destruir o país naquele momento e, mais, para uma coisa que eles obtiveram, que foi não deixar votar a reforma da Previdência, que eu iria votar em duas semanas. Foi uma coisa montada e até para tentar derrubar meu governo. Mas eu resisti, continuei a governar, continuei evitando a queda da inflação, dos juros. Continuei a ter um PIB positivo. Foi uma barbaridade cívica.
O ex-ministro dos governos Dilma e Temer defendeu a escolha de Rodrigo Pacheco como candidato ao Planalto e fez duras críticas ao governo de Jair Bolsonaro
Por RICARDO CORRÊA E LUCYENNE LANDIM
A redação de O TEMPO Brasília recebeu, para a primeira entrevista na capital federal, o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab. O ex-ministro dos governos Dilma e Temer não escondeu a paixão no sonho de lançar Rodrigo Pacheco ao Palácio do Planalto e disse que ele é o plano A, B e C do partido. Confirmou que Alexandre Kalil será o candidato ao governo de Minas Gerais, que apoiará Geraldo Alckmin em São Paulo e que vê Felipe Santa Cruz como nome no Rio de Janeiro. Sobre Jair Bolsonaro, afirmou que faz um mau governo. Ele ressalta que já defendeu o impeachment do presidente, mas que não se pode banalizar o processo. Economista, Kassab pontua que a manobra do governo federal para furar o teto de gastos e pagar o Auxílio Brasil, novo Bolsa Família, beira a irresponsabilidade fiscal e terá impacto negativo no futuro.
A gente não pode deixar de começar perguntando sobre o projeto presidencial do PSD. O PSD ontem filiou o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que é colocado, o senhor já disse isso várias vezes, como candidato à Presidência da República. Como é esse projeto do PSD, o que esperar desse projeto para Rodrigo Pacheco?
O PSD é um jovem partido. Fez 10 anos nesse ano. Está fazendo 10 anos. Porém, 10 anos já foram suficientes para que nós nos organizássemos em todo o país com bons quadros, com lideranças importantes, algumas um pouco mais experientes, outras com esse sentimento de renovação que os brasileiros tanto aspiram, e amadureceu a ideia do partido lançar uma candidatura à Presidência da República. É uma decisão partidária, nós vamos lançar um candidato a presidente e, algum tempo atrás, nós fizemos esse convite ao presidente Rodrigo Pacheco, para que ele se filiasse ao partido e fosse o nosso candidato a presidente. Evidentemente que é uma decisão muito difícil, primeiro, se filiar a um partido e, depois, disputar um cargo, em especial um cargo de tanta relevância, o principal cargo do país que é o de presidente da República. Felizmente, para a alegria nossa, eu acho que de todo o Brasil, ele já aceitou parte da missão ao se filiar. Eu acho que é uma sinalização importante essa filiação, ele agora vai aprofundar a sua avaliação. Mas com a experiência que eu tenho, mais de 30 anos de vida pública, tenho uma confiança muito grande de que ele vai atender esse chamamento, porque no fundo é um chamamento. Chamamento para uma pessoa muito qualificada, que mostrou já, ao longo da sua vida, que é inteligente, que é bem preparado. O Rodrigo, ainda jovem como advogado, se tornou um dos principais advogados de Minas Gerais e do Brasil. Uma carreira como advogado exemplar e, há sete anos, ele resolve abraçar a vida pública. E nesses sete anos ele teve muito êxito.
Um crescimento rápido...
É, rápido, com qualidade, se elegeu deputado federal. Eu fui deputado federal por duas vezes e sei que é uma eleição muito difícil. A pessoa precisa ter vocação para se relacionar, se comunicar com o eleitor, para apresentar proposta. Ele não apenas se elegeu, mas, chegando à Câmara dos Deputados, se torna presidente da Comissão de Constituição e Justiça, que é a principal comissão da Casa, e vai muito bem, teve um excelente desempenho. Tal foi de qualidade o seu desempenho que ele acabou entendendo estar habilitado para disputar o Senado por Minas Gerais e se elege a um cargo majoritário, um dos cargos mais difíceis do país, o de senador por Minas Gerais. Não apenas se elegeu como foi o mais votado do Estado. E, chegando ao Senado, ele se torna presidente do Senado. Portanto, chefe de Poder, presidente do Congresso Nacional. Todas essas transformações, esses sete anos de muita intensidade na sua vida pública, o credenciam para, inquestionavelmente, ser um bom candidato. Ele tem o que apresentar já, ele mostrou que é da política, ele é conciliador, ele é bem preparado, ele sabe compreender os problemas do país, rapidamente consegue constituir equipe e apresentar soluções. Portanto, eu, e não apenas eu, mas os principais líderes do partido, entendiam, e cada vez entendemos mais, que ele tem tudo para ser um excelente candidato para vencer as eleições e, caso isso aconteça, será um bom presidente da República.
No ato de filiação o senhor foi bem categórico: disse que o Pacheco vai ser o candidato do PSD à Presidência da República e que ele será o presidente. Ele foi mais contido no discurso, não falou diretamente sobre esse assunto. Qual resposta ele tem dado ao PSD, ao senhor mesmo, sobre essa proposta de candidatura à Presidência?
Eu sempre tomo muito cuidado para ser muito respeitoso em relação ao Rodrigo. Você percebe que nas minhas manifestações eu digo que eu entendo que ele será, a minha experiência diz que ele será, e ele diz que está avaliando. Estava avaliando a filiação, agora está avaliando a candidatura, e eu tenho certeza que ele vai avaliar, vai refletir, não é uma decisão tomada. Mas volto a dizer: eu tenho certeza que ele será. Tenho certeza porque tem o perfil que o Brasil precisa. Ele já é experiente, afinal de contas é um advogado bem sucedido, um deputado federal, um presidente da CCJ da Câmara dos Deputados, senador, presidente do Senado, já conhece o Brasil. O Rodrigo Pacheco conhece o Brasil melhor do que qualquer um desses ministros que estão aí. Eu tenho convivido bastante com ele e posso lhe afirmar isso. Eu me considero uma pessoa com bastante experiência na vida pública, eu tenho uma peculiaridade que tenho uma boa formação técnica, meus pais me deram uma boa educação, me formei em engenharia em uma universidade boa, na USP em São Paulo, depois em economia na mesma USP, e logo depois eu ingressei na vida pública fazendo política na maior cidade do país, São Paulo. Então, não é qualquer um falando. A minha intuição eu acredito que seja uma boa intuição. No campo da política eu fui parlamentar, na maior cidade de São Paulo eu fui vereador, no maior Estado São Paulo eu fui deputado estadual, como você lembrou aqui eu fui duas vezes deputado federal, fui duas vezes ministro, já fui duas vezes prefeito de São Paulo. Então, eu posso afirmar a vocês que eu tenho plena convicção que eu não estou errado de que o Rodrigo é o perfil adequado que o Brasil precisa. E com uma vantagem: o PSD não está colocando uma única condição. A única condição que a gente pede a ele é que ele seja um bom presidente da República. Em nenhum momento vamos colocar condição de loteamento de cargos, de fisiologia, de indicação, para que ele tenha condição de chegar ao Palácio do Planalto como presidente eleito e possa constituir a melhor equipe que um presidente já teve no país. Essa é a única condição que a gente coloca.
Para crescer nas pesquisas, obviamente, quando chegar o momento das eleições, pela experiência, pela observação política que o senhor tem, o senhor vê esse espaço em uma desidratação do presidente Jair Bolsonaro, uma desidratação do ex-presidente Lula ou um espaço próprio da terceira via de conseguir juntar esses votos de tanta gente que tem na terceira via hoje, dentro de uma candidatura só?
Hoje, com a eficiência dos meios de comunicação, das redes sociais, é muito fácil a pessoa se apresentar. O Rodrigo não é nem pré-candidato ainda e ele já aparece nas pesquisas. Apareceu em uma pesquisa com 3%. Na maior parte delas está aparecendo com 2%, sem se apresentar como candidato. Em Minas Gerais, o seu Estado, várias pesquisas já estão colocando o seu nome com quase 10% para presidente da República. Eu sinto, em São Paulo, que é o meu Estado - eu tenho procurado acompanhar sempre que possível as suas reuniões -, que ele conquista as pessoas com a maneira com que ele se apresenta, o seu conhecimento. Então, o seu crescimento será orgânico. Não vamos aí sair gastando dinheiro, não. Nós vamos fazer o que a gente está fazendo aqui, falando dele, mostrando as suas qualidades, mostrando que o Brasil precisa dessa transformação. Nós não podemos mais conviver com esse ódio entre as pessoas, onde as pessoas não se respeitam mais, elas odeiam quem pensa diferente. O Rodrigo ele é justamente isso. Ele passa essa certeza de que ele vai promover o fim do ódio, vai acabar com o ódio.
Esse é o foco, a mensagem vai ser essa?
Não apenas essa. Eu acho que essa é uma mensagem importante, mudar mas com tranquilidade, com serenidade. Temos que acabar com essa história de que quem perde a eleição vai torcer para o quanto pior melhor. Imagina! Somos brasileiros, a democracia engloba a eleição. Quem perde a eleição, vamos fiscalizar, mas vamos trabalhar para o Brasil dar certo. E quem ganha a eleição, deixa de lado essa história de querer massacrar os vencidos, vamos chamar para conversar, vamos ter uma boa convivência, vamos respeitar governo e oposição, porque dá para trabalhar junto, mesmo você tendo aqui e uma oposição. Até porque a democracia precisa da oposição para fiscalizar, para ser uma alternativa. Então, a candidatura do Rodrigo Pacheco vai representar tudo isso.
Tem-se comentado também sobre uma possível aliança do PSD com o PT na eleição presidencial, talvez encabeçando o ex-presidente Lula e o PSD entrando na candidatura do vice a presidente. Tem alguma chance de isso acontecer e talvez o Pacheco ir, por exemplo, para o governo de Minas. Há alguma chance de o PSD abrir mão da candidatura ao Palácio do Planalto?
Deixa eu lhe falar: eu posso primeiro falar pelo partido. Modéstia à parte, eu sou fundado do partido, sou presidente do PSD e eu posso lhe afirmar aqui, qualquer um pode me cobrar, o PSD terá candidatura própria à Presidência da República. Isso é irreversível, é uma decisão tomada. Agora, falo por mim, não posso falar pelo Rodrigo. Eu acho que será o Rodrigo, porque só não será se ele não quiser.
Se ele não quiser terá um outro candidato?
O PSD vai ter candidato à Presidência da República. É uma decisão tomada, é importante para a democracia, os partidos têm que ter candidatura. Eu trabalhei muito para aprovar o projeto em 2017 que acabou com a coligação nas eleições proporcionais de vereador, de deputado estadual, deputado federal. Para quem não sabe, são as eleições proporcionais. Felizmente, vencemos e mantivemos a lei. A partir da próxima legislatura eu vou trabalhar também com a coligação nas eleições majoritárias. Não tem nenhum sentido um partido existir para apoiar o candidato de outro partido, ainda mais em uma eleição de dois turnos. Então, para que existir? Então, o PSD terá candidatura. Em Minas Gerais, quem fala por Minas é o diretório estadual, mas eu posso lhe afirmar também meu sentimento: o nosso candidato será o Alexandre Kalil, que fez uma extraordinária gestão, está fazendo à frente da Prefeitura de Belo Horizonte, com aprovação de quase 80%. Ele se elegeu no primeiro turno e tem todas as condições para se apresentar como um bom candidato. Porque um bom prefeito de Belo Horizonte, ele está sendo um bom prefeito, com certeza será um bom governador. Ele não começou a campanha ainda, todos sabem, mas no momento que começar e se definir mesmo publicamente como candidato, ele terá todas as condições de mostrar por que é importante para Minas Gerais tê-lo como governador.
O senhor disse que o Pacheco só não vai ser o candidato do PSD se ele não quiser. Caso ele não queira, o partido tem um plano B para o Palácio do Planalto?
O plano A, B e C do partido é Rodrigo Pacheco.
Falando um pouco das disputas estaduais, o partido está se estruturando para ter candidatos em vários lugares. O senhor inclusive citou em Minas Gerais o nome do Kalil, embora também o senador Carlos Viana, que é do PSD, muitas vezes diz que é interesse ser candidato ao governo...
O senador Carlos Viana, hoje, é um dos senadores mais respeitados do Congresso Nacional. Em pouco tempo ele conquistou a todos por sua cultura, sua seriedade, sua transparência. Ele tem a legítima aspiração de postular uma candidatura a governador, assim como o Alexandre Kalil. Eu tenho plena convicção de que haverá um entendimento maior em Minas Gerais envolvendo o Rodrigo Pacheco, o Carlos Viana, (Antonio) Anastasia, Alexandre Silveira, Alexandre Kalil, que vai levar rumo a Minas Gerais a ter um projeto com muita unidade para o bem de Minas Gerais e para o bem do Brasil.
Uma situação que parece ainda não estar muito clara é a de São Paulo. O PSD fala do apoio ao Geraldo Alckmin, independente dele ir para o PSD ou para o União Brasil, já estão falando que ele pode ir para o União Brasil. Mas a gente vê muitas discussões a respeito das conversas do Alckmin com o próprio Márcio França, que quer ser candidato, com o próprio José Luiz Datena, o próprio PDT do Ciro Gomes, com quem você tem uma boa relação. Como está em São Paulo essa estruturação de uma candidatura do Alckmin em São Paulo? É esse o caminho mesmo do PSD? E com quem se conversa nesse sentido?
O caminho do PSD em São Paulo é apoiar o Geraldo Alckmin. Ele é um quadro da vida pública, dos melhores, muito bem preparado. O Geraldo, na sua vida pública, só fez coisa boa, pessoa admirada e respeitada por todos. O PSD o convidou para se filiar, nós temos uma esperança e um sentimento muito positivo em relação à vinda dele. A decisão será dele, evidentemente, então vamos aguardar. Será o nosso candidato. O Datena tem o nosso compromisso que, se ele quiser ser candidato ao Senado, ele terá a legenda do partido. Tem o compromisso. Temos também o querido amigo Paulo Skaf, que está examinando a possibilidade, também muito qualificado, ambos preparadíssimos para ser candidato a senador e representar São Paulo no Senado. Portanto, nós vamos aguardar um pouco para as definições que devem estar para acontecer, mas a gente caminha sim para ter esses quadros juntos em uma eleição no Estado de São Paulo e em harmonia com o Rodrigo Pacheco, candidato a presidente da República.
E no Rio de Janeiro? Tem o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, e o atual prefeito Eduardo Paes. Como vai ficar o Rio de Janeiro nas eleições do ano que vem?
A condução do processo sucessório no Rio de Janeiro estará aos cuidados, sob a responsabilidade do diretório local presidido pelo prefeito Eduardo Paes. Ele tem manifestado a vontade de que o partido lance o Felipe Santa Cruz, presidente da OAB Nacional, uma pessoa muito respeitada, como candidato a governador. E eu percebi, em um evento com uma dimensão muito grande que aconteceu nos últimos dias no Rio de Janeiro sob o comando do Eduardo Paes, com lideranças do Estado inteiro e muito peso político, uma sinergia muito grande do Felipe Santa Cruz com o eleitor carioca. Eu percebo uma vontade do eleitor carioca muito, mas muito forte de mudar as coisas lá. E a mudança lá é o apoio do Eduardo Paes para o Felipe Santa Cruz. Então, eu acredito que lá no Rio de Janeiro nós queremos sim uma base bastante consolidada sob o comando do Eduardo Paes a favor da candidatura do Felipe Santa Cruz.
Do ponto de vista do cenário nacional, além do Rio, São Paulo e Minas, o partido está imaginando que pode competir com condições de ganhar em quantos estados?
Não há candidato que dispute as eleições pensando em derrota. Então, todos os candidatos que saem para governador... Hoje nós temos bem encaminhado um processo de construção de 14 candidaturas a governador, 14 Estados. Eu acredito que a gente possa chegar até a 20, o que vai mostrar uma presença do partido no cenário nacional importante. Enquanto os outros partidos ficam discutindo dinheiro, tempo de televisão, nós estamos mostrando para o Brasil que a gente está preocupado em ter bons quadros e boas propostas. Porque as campanhas hoje são muito mais baratas e o tempo de televisão continua sendo muito importante, mas as redes sociais têm um custo muito baixo, elas têm uma importante igual hoje.
Voltando um pouco para essa coisa do cenário nacional, o senhor já descolou ali do governo do presidente Jair Bolsonaro...
Posso corrigir? Descolou não. Nunca colamos.
Mas o partido dentro do Congresso Nacional os parlamentares são bem alinhados com o governo federal. Ao menos uma parcela.
Não. Também não. Qual a nossa história com esse governo? O PSD apoiou nas eleições de 2018 a candidatura do Geraldo Alckmin. Apoiamos e fizemos campanha. No segundo turno, o Geraldo Alckmin não foi. No segundo turno o partido liberou. Cada militante, cada filiado, cada parlamentar, ex-parlamentar, dirigente votou de acordo com as suas convicções. Eleito o presidente Bolsonaro, o partido se declarou independente. E é independente até hoje. E como o partido é independente, o parlamentar pode estar mais próximo ou mais distante. O partido é independente. Não vamos colocar camisa de força. O que tem acontecido com nossos parlamentares, sejam os deputados federais, sejam os senadores, é que os projetos que eles acreditam que sejam bons para o Brasil eles estão votando. E eu acho que eles estão corretos. A gente não pode fazer como fazem alguns partidos: torcer e trabalhar pelo quanto pior, melhor. Se a gente acredita que é um projeto bom, se eles acreditam, eles votam a favor. Se eles entendem que não é bom, eles votam contra.
E fazendo uma avaliação geral sobre o governo hoje. O PSD teve um momento de maior tensão com a discussão do impeachment quando houve o evento do 7 de Setembro. De lá para cá, o presidente deu uma diminuída no tom, fez aquela carta e tudo. Como o senhor avalia hoje a situação do governo federal do ponto de vista das chances efetivas que o presidente Jair Bolsonaro pode, a partir desse governo, ter nas eleições de 2022?
Vamos ser claros: é um mau governo. Primeiro, o problema do planeta ao longo dos últimos anos foi essa pandemia, e o presidente não teve uma postura adequada. É o líder maior do país, quem deveria nos conduzir. E (ficou) dando sinalizações erradas, equivocadas, incentivando aglomerações, recusando vacinas. Uma postura negacionista. No início dessa pandemia, a Pfizer, que reconhecidamente era a melhor vacina, ofereceu 100 milhões de doses para que o Brasil pudesse aqui ser um importante avalizador da vacina. O governo recusou. Quantas dessas 605 mil pessoas que morreram não teriam morrido se tivessem tomado essas 100 milhões de doses? Eu lembro de um episódio que o presidente tirou a máscara de uma menina. Há três dias ele associou a vacina à possibilidade de a pessoa ter Aids. Quer dizer, não tem noção das coisas. Postura ruim. Agora, a inflação. A inflação média brasileira é de 10% hoje. mas é média, porque a inflação na alimentação é quase 25%. Dos combustíveis, muito maior. E a grande parte da população, que está nas classes C, D e E, ela tem então uma inflação alta, porque o seu poder aquisitivo é todo concentrado na alimentação e combustível basicamente. Então, a carne, o arroz, o feijão, o combustível, estão com uma taxa de 23%. O que significa isso? Se a pessoa em janeiro ganhava R$ 1.000, ela em dezembro vai estar ganhando o equivalente a R$ 750. Então, o que ela comprava em janeiro ela vai comprar 25% a menos em dezembro. Então, não tem como eu avaliar de uma maneira positiva esse governo. É importante ser apresentada uma alternativa.
Mas o senhor entende isso como uma solução que se dá na eleição. O senhor não é a favor hoje de um processo de impeachment?
No dia 7 de Setembro, as manifestações dele levavam ao impeachment. Eu mesmo publicamente defendi a abertura de um processo. Porque ele disse que iria enfrentar o Judiciário, não ia atender as suas decisões, não é? No momento em que ele se desculpou e disse que não iria acontecer, perdeu a razão. E acho que ele teve um desgaste muito grande, pois gerou uma instabilidade. O voto é um negócio muito sério. Nós temos que conviver com processo de impeachment, É importante que exista na democracia essa alternativa, mas tem que ser adotado numa situação necessária e que se justifique. Nós não podemos banalizar o impeachment, senão você está desvalorizando o voto.
E o trabalho da CPI da Covid no Senado, que citou crimes relacionados ao presidente Jair Bolsonaro, que agora vão ser avaliados pela Procuradoria Geral da República, o que o senhor avaliou desses crimes apontados pelo Renan Calheiros no relatório da CPI da Covid ao presidente Jair Bolsonaro?
Eu vi com muita tristeza, sinceramente. É muito triste, não é? Esses indiciamentos, essas acusações, agora o encaminhamento será feito para que possa ser deflagrado o processo, mas vejo com muita tristeza. Essa CPI nos revelou coisas inimagináveis. Corrupção na compra de vacinas, corrupção no Ministério da Saúde. Eu não imaginava que a atuação, só para ficar no campo da pandemia, fosse tão desastrada.
O senhor falou da questão inflacionária, da dificuldade, do poder de compra das pessoas que vai se enfraquecendo com a inflação em alta. A gente tem vivido um debate muito grande hoje acerca do Auxílio Brasil, de como financiar esse Auxílio Brasil, e aí esse debate sobre fura o teto ou não fura o teto. Como o senhor está vendo esse debate hoje, essa solução que até agora o governo está tentando apresentar, por meio da PEC dos Precatórios, e mudando o reajuste do teto?
Vamos começar pelo final: eu defendo o Auxílio Brasil. Ele é fundamental para atender a necessidade do brasileiro e, em especial, dos menos favorecidos. Ponto. Questão resolvida. Agora, eu também defendo a responsabilidade fiscal. Num Orçamento de trilhões, não é possível que não se separe R$ 25 bilhões, R$ 30 bilhões, R$ 35 bilhões para Auxílio e não consiga resolver o resto do Orçamento dentro do teto de gastos. É inadmissível. Algo impensável. Então, eu defendo esse Auxílio, vou continuar defendendo, como sempre defendi o Bolsa Família, vou continuar defendendo, mas eu sou daqueles que defende a responsabilidade fiscal. Me estranha muito o Ministério da Economia, a essa altura, estar se esquecendo da importância, para qualquer país, da responsabilidade fiscal. Não há investidor que acredite em um país que não tem responsabilidade fiscal. E quando um investidor, seja brasileiro seja o de fora, passa a não acreditar no país, aí você começa a ter um desemprego maior, que já é muito alto. Se eles não acreditam, vão para outro país. Se não investem não há novas empresas. Essa postura do governo, que beira a irresponsabilidade no campo fiscal, ela vai atrapalhar muito o nosso futuro.
O senhor falou sobre inflação, teto de gastos, Auxílio Brasil, o senhor é economista. Como o senhor avalia que a condução da equipe econômica do governo federal em geral vai impactar nas urnas no ano que vem?
Já está impactando, não é? A avaliação do governo é ruim. O presidente vai ter uma dificuldade muito grande na sua reeleição, porque a prioridade, nas discussões, será no campo da economia. E na economia, tendo a inflação como carro-chefe das discussões, vai trazer para o governo um desgaste muito grande e isso vai contribuir para que ele não tenha um bom desempenho nas eleições.
No fim das contas, o senhor considera que esse tema da economia, da inflação, é o grande tema das eleições, o senhor acha que o debate da pandemia vai estar resistindo até as eleições, ou esse debate sobre o Brasil estar unido ou não estar... qual o principal tema que vai ser tratado em 2022?
Essa pandemia mostrou com muita clareza o quanto é importante a gente ter um ensino público de qualidade. O quanto é injusta a situação no Brasil, comparando-se àqueles que têm poder aquisitivo com aqueles que não têm. O quanto foi flagrante essa diferença acompanhando as pessoas nas escolas particulares, que tinham nas suas casas muito mais instrumentos de continuar tendo acesso à educação, com aquelas que estavam no ensino público, que não tinham esses instrumentos. O quanto ficou claro essa defasagem nesse período, e nós precisamos corrigir. Eu fui prefeito de São Paulo durante dois mandatos e dei prioridade absoluta à educação. Então, nós temos que cobrar de todos os candidatos a presidente que tenham e deixem com muita clareza essa prioridade e eu espero que o Rodrigo Pacheco também deixe. E tenho certeza de que deixará. Essa pandemia também deixou clara a importância do SUS. Se não fosse o SUS, com seus problemas, nós não teríamos os resultados que nós viemos tendo agora no campo da vacinação, do tratamento das pessoas. Então nós temos que melhorar, investir mais no SUS. O SUS tirou a dúvida de qualquer brasileiro que questionava a sua existência. Hoje, ele passou a ser uma unanimidade no país. Então, vamos, deixando de lado saúde e educação, que devem ser as absolutas prioridades de qualquer governo, deixar claro que a economia terá um papel fundamental nas discussões e nos debates porque, hoje, no dia a dia dos brasileiros, a inflação é o principal problema. As pessoas, muitas delas, em especial as mais pobres, não comem mais carne, têm dificuldade de comprar arroz, comprar feijão no mesmo volume que compravam. Têm dificuldade de abastecer o carro, seja para trabalhar, seja para passear no fim de semana. E isso tudo vai ter um peso grande. E o governo não está conseguindo dar respostas. Muito pelo contrário. A situação se agrava a cada dia, a cada semana, a cada mês. Portanto, deixando claro que a prioridade deve ser saúde e educação, a principal discussão vai ser no campo da economia, principalmente na inflação, e a ineficiência desse governo para resolver esses problemas.