Debates sobre novos caminhos climáticos marcam início da COP29

Posted On Terça, 12 Novembro 2024 14:14
Avalie este item
(0 votos)

No primeiro dia de um evento esvaziado de líderes mundiais, debates sobre financiamento e mercados de carbono dominaram a COP29

 

 

Por Paloma Oliveto

 

 

Com a difícil missão de chegar a um acordo sobre o novo mecanismo de financiamento climático, representantes de 197 países mais a União Europeia começaram, no dia 10 de novembro, as discussões da COP29, em Baku. "Estamos nos encaminhando para a ruína. E não se trata de problemas futuros. A mudança climática já está aqui", disse, na cerimônia de abertura, o presidente da conferência, Mukhtar Babaiev, ministro da Ecologia do Azerbaijão. "Chegou o momento da verdade." Uma das primeiras medidas foi a aprovação das regras dos mercados de carbono, transação acusada pela sociedade civil de falta de transparência.

Esvaziada de líderes mundiais, como Luiz Inácio Lula da Silva, Joe Biden, Emmanuel Macron e Olaf Scholz, a reunião anual da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) acontece em um momento chave, quando o mundo bate mais um recorde de calor — segundo o Instituto Copérnico, da UE, 2024 será o ano mais quente já registrado. Soma-se aos alertas da ciência a eleição de Donald Trump à presidência norte-americano. O republicano nega que o aquecimento global seja consequência da queima de combustível fóssil, e deve retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris e da própria UNFCCC.

 

"Quero dizer-lhes que, embora o governo federal dos Estados Unidos, sob Donald Trump, possa colocar a ação climática em segundo plano, o trabalho continuará, com paixão e compromisso", discursou John Podesta, atual enviado especial para o clima do governo Joe Biden. "Os Estados Unidos são uma democracia que escolheu um presidente cuja relação com as mudanças climáticas é dominada pelas palavras 'fraude' e 'combustíveis fósseis'", acrescentou.

 

Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC, destacou, no discurso, que a "COP29 deve demonstrar que a cooperação mundial não está em ponto morto". O entendimento de especialistas é de que o governo Trump não poderá abandonar a agenda do clima, especialmente com as estimativas de perdas econômicas desencadeadas por extremos climáticos, como secas, enchentes e furacões. "Cada vez mais, temos impactos na agricultura, na segurança hídrica, essencial aos processos industriais. E os Estados Unidos não estão fora dessa equação", comenta Karen, diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy (TNC) Brasil.

 

Dinheiro

Na chamada "COP do financiamento", países e blocos econômicos tentam definir o Objetivo Coletivo Quantificado para o Financiamento Climático (NCQG), mecanismo de financiamento que substituirá o fundo anterior. Em Paris, há quase uma década, foi decidido que os países desenvolvidos destinariam US$ 100 bilhões anuais a ações de mitigação e adaptação das nações em desenvolvimento. O valor, considerado simbólico — para passar a ideia da importância que os signatários do acordo davam ao tema —, mostrou-se irreal.

 

O desafio, agora, é encontrar cifras factíveis e, principalmente, definir os critérios de distribuição do dinheiro, algo que o fundo anterior não trazia. Os blocos econômicos têm entendimentos diferentes sobre a composição do NCQG, e os Estados Unidos querem que a China contribua também (veja quadro).

 

O dinheiro é essencial para que os países consigam elevar o nível de ambição de suas contribuições determinadas nacionalmente (NDCs), os planos que cada um tem para garantir que o planeta não chegue ao fim do século 1,5ºC mais quente do que nos tempos pré-industriais. Essa meta já é considerada impossível, mas há uma expectativa de, ao menos, evitar um aquecimento maior de que 2ºC, o que já causaria catástrofes ambientais.

 

Irreversíveis

O Grupo de Consultoria sobre a Crise Climática (CCAG) divulgou, hoje, um relatório sobre os princípios orientadores para elaborar as NDCs. O documento ressalta que as contribuições existentes eliminam a possibilidade de se atingir o 1,5ºC e colocam o mundo no caminho de um aquecimento maior que de 3ºC até 2100. "As NDCs de Alta Ambição devem refletir cotas justas, com os países desenvolvidos assumindo maior responsabilidade por meio de cortes mais profundos e um aumento no apoio a nações em desenvolvimento", disse, em nota, Mercedes Bustamante, membro do CCAG e professora da Universidade de Brasília (UnB). " Estamos à beira de mudanças irreversíveis, mas também diante de uma oportunidade sem precedentes para redefinir nossa abordagem à ação climática".

 

O Brasil se antecipou e, na sexta-feira, divulgou, três meses antes da data limite, suas novas NDCs: reduzir as emissões líquidas de gases de efeito estufa de 59% a 67% em 2035, comparado aos níveis de 2005. Para Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, o compromisso não vai ao encontro da meta do 1,5ºC, pois, em números absolutos, significa emitir 984 milhões e 792 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente. "Também estão desalinhados com os compromissos já adotados pelo governo e com a promessa do presidente da República de zerar o desmatamento no país — em conjunto, essas políticas levariam a uma emissão líquida menor do que 650 milhões de toneladas em 2035."