Apesar de demonstrar resistência à entrada de Jair Bolsonaro no PP, o presidente da Câmara, Arthur Lira, disse a pessoas próximas que não vai atuar para barrar a entrada do mandatário no partido.
POR JULIA CHAIB E CAMILA MATTOSO
Líder do centrão e deputado pelo PP de Alagoas, ele afirmou a aliados que, hoje, cerca de 90% do partido quer o presidente da República na sigla e, por isso, não será ele quem vai impedir a filiação.
Bolsonaro está cada vez mais próximo de fechar a aliança com o PP. Como condição, pediu para escolher os candidatos que disputarão uma vaga no Senado pela legenda em 2022.
O presidente do PP, Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil, comprometeu-se a dar influência ao mandatário na sigla. Isso significa que Bolsonaro poderá escolher quem se candidatará a senador pelo menos nos estados considerados chave para ele, como é o caso do Rio de Janeiro e do Distrito Federal.
Como mostrou o Painel, as conversas para que o presidente da República se filie ao PP evoluíram na última semana, depois que Ciro começou a consultar oficialmente representantes do partido nos estados a respeito do tema.
Hoje, segundo dirigentes ouvidos pela reportagem, a maioria absoluta é favorável à migração de Bolsonaro. Os mais resistentes ao mandatário estão concentrados no Nordeste: Bahia, Paraíba e Pernambuco.
A razão para a contrariedade é o fato de os filiados avaliarem que Bolsonaro está mal nas pesquisas de intenção de voto, com menos chances de ser reeleito. Por isso, os resistentes preferem se aliar ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) localmente.
A mais recente pesquisa Datafolha mostrou que a corrida presidencial está estagnada, com Lula mantendo larga vantagem sobre Bolsonaro.
Comparado ao último levantamento, Lula oscilou de 46% para 44% e Bolsonaro, de 25% para 26%, numa hipótese em que o candidato tucano é João Doria (SP), que passou de 5% para 4%. Nesse cenário, Ciro Gomes (PDT) segue em terceiro (de 8% para 9%), tudo dentro da margem de erro.
O petista foi de 46% para 42%, e Bolsonaro se manteve em 25%, na simulação em que o nome do PSDB é Eduardo Leite (RS) --que oscilou de 3% para 4%. A diferença no cenário com o gaúcho é que Ciro Gomes (PDT) pulou de 9% para 12%.
O presidente da Câmara dos Deputados não queria Bolsonaro na legenda porque teme prejuízo à tentativa de se reeleger no comando da Casa em 2023.
O cálculo de Lira é que, se Bolsonaro perder e estiver no seu partido, será muito difícil superar as resistências ao presidente e evitar contaminação de sua campanha.
Neste ano, o deputado foi eleito com a pecha de bolsonarista por ter contado com o apoio do governo, que mobilizou cargos e cedeu emendas para a eleição dele.
Ainda assim, Lira teve o apoio, mesmo que não oficial, de congressistas de siglas de oposição sob o argumento de que seria independente à frente da Câmara.
Se Bolsonaro estiver filiado a seu partido, ficará mais difícil enfrentar esses entraves, avalia o deputado. De todo modo, no último fim de semana, ele afirmou a aliados que não vai agir para barrar Bolsonaro.
A aposta no PP é que a sigla vai conseguir aumentar substancialmente as bancadas na Câmara, no Senado e eleger governadores com Bolsonaro e outros puxadores de voto do segmento ideológico que entrariam na legenda.
Eleito pelo PSL, até 2018 um partido nanico, o presidente da República se aproximou ainda mais do centrão em um momento de fragilidade, quando se viu ameaçado por mais de cem pedidos de impeachment e pelo avanço da CPI da Covid.
A expectativa é que a filiação ao PP ocorra em breve. Em julho, o presidente afirmou que procurava um partido para "chamar de seu".
"Tentei e estou tentando um partido que eu possa chamar de meu e possa, realmente, se for disputar a Presidência, ter o domínio do partido. Está difícil, quase impossível", disse em entrevista à Rádio Grande FM, de Mato Grosso do Sul.
Apesar da declaração, Bolsonaro não conseguiu impor no PP condições que tentou colocar a outros partidos, entre eles o Patriota, ao qual o senador Flávio Bolsonaro chegou a se filiar.
Em negociação com o Patriota, Bolsonaro pediu para filtrar as candidaturas ao Congresso e as filiações. Sem citar nomes, o presidente disse que queria evitar traições após a eleição, como ocorreu no PSL.
Durante a eleição de 2018, o grupo de Bolsonaro tinha a presidência do partido, com o combinado de que, após as eleições, Luciano Bivar (PE) retomaria ao poder.
No primeiro ano de mandato de Bolsonaro, porém, o mandatário resistiu a devolver o comando do PSL, o que gerou uma cisão interna.
Hoje, dos 53 deputados do PSL, cerca de metade é aliada do presidente da República e deve acompanhá-lo para o partido que ele escolher para disputar a reeleição.
Por causa do histórico e de resistências ideológicas, Bolsonaro enfrentou divisões também no Patriota.
Os aliados do presidente queriam incluir no DNA do Patriota valores cristãos e uma posição contrária à legalização do aborto para tentar reconquistar votos de evangélicos na eleição de 2022.
A ala da sigla mais ligada ao antigo PRP (Partido Republicano Progressista), que se fundiu ao Patriota em 2018, rejeita embarcar na proposta de transformá-lo em um símbolo da agenda bolsonarista.
A intenção de Flávio Bolsonaro era a de controlar a sigla com seu pai.
Adilson Barroso, então presidente da legenda com quem ele negociava as condições, foi tirado do posto e teve seus atos anulados após ter afastado dirigentes do Patriota para obter maioria no diretório nacional, mudar o estatuto e abrir espaço para que Jair Bolsonaro e seus aliados tivessem o comando da legenda.
Com o fracasso no acordo, Flávio e Bolsonaro passaram a reavaliar a estratégia.
Após sair do PSL, Bolsonaro se mobilizou a partir de 2019 para criar um partido próprio, a Aliança Pelo Brasil. O projeto, porém, acabou deixado de lado para 2022 diante da dificuldade de coletar as assinaturas necessárias para viabilizá-lo.