Costuma-se chamar de “defunto sem choro”, aquelas pessoas que, quando morrem, têm seus velórios vazios, quase sem presentes para se despedir, numa revelação tardia de que aquele que “passou desta para melhor”, na verdade, não tinha muitos amigos, muitos compadres.
Por Por Edson Rodrigues
Apesar de ter sido mantido em uma espécie de “bolha”, longe das vozes das ruas, Mauro Carlesse, sem sombra de dúvidas, descobriu um veio político que neutralizava seus adversários, principalmente os que mantinham o foco em seus interesses pessoais acima dos interesses coletivos. Então deputado do baixo clero, Carlesse conseguiu a simpatia política de um “grão mestre” do grupo político dos Miranda e, na disputa pela presidência da Assembleia Legislativa, que tinha, de um lado, o sério, leal, correto e companheiro do governador Marcelo Miranda, deputado Osires Damaso.
Deputado Osires Damaso abandonado no altar pelo Palácio Araguaia
Sabiamente, o desconhecido deputado Mauro Carlesse conseguiu dividir o grupo político dos Miranda, conseguindo o apoio decisivo de parte dos componentes, impondo uma derrota ao “mestre dos mestres”, Dr. Brito Miranda, até então coordenador e “primeiro-ministro” do governo de Marcelo Miranda.
Mauro Carlesse em sua posse como governador
Ao chegar à presidência do Poder Legislativo, Mauro Carlesse mostrou saber retribuir o apoio e dividiu o poder com os deputados do baixo clero que o apoiaram massivamente, dando-lhes acesso aos cargos de direção, liberdade para contratar seus companheiros e, durante seu mandato, todos os membros do grupo que o elegeu, sem exceções, foram prestigiados, receberam tudo o que lhes foi prometido em termos de apoio e atenção, e até um pouco mais.
A BOLHA
Tanto que, quando Marcelo Miranda e Cláudia Lelis tiveram que deixar o governo por determinação da Justiça Federal, houve uma eleição indireta para eleger o governador interino, para o mandato tampão.
Com o apoio da maioria dos deputados estaduais, os mesmos que o apoiaram na eleição indireta e com os quais dividiu, igualitariamente, o poder – e mais alguns –, Carlesse não teve dificuldades em vencer os candidatos oposicionistas ao seu governo, para, logo em seguida, agora com o voto popular e uma eleição direta, reeleger-se governador do Tocantins, desta vez para um mandato de quatro anos, tornando-se um fenômeno. Um, até então, desconhecido deputado do baixo clero que, de uma tacada só, vence três eleições seguidas, em um mesmo ano, com o mesmo grupo político e com prestígio entre todos os seus companheiros.
Durante seu último mandato, independente das acusações que ora enfrenta por parte da Justiça Federal, Carlesse se tornou um grande político, assessorado por uma equipe de bons técnicos, como Sandro Henrique Armando, que reorganizou a economia e as finanças do Estado, e governou com o apoio da maioria dos deputados estaduais, inclusive de partidos de oposição, o que permitiu a aprovação das matérias que reequilibraram as finanças estaduais, recolocaram os pagamentos dos servidores, fornecedores e prestadores de serviço em dia, manteve uma boa condução durante o pico da pandemia de Covid-19 e articulou com a bancada federal uma maneira de deixar os caixas governamentais sempre com crédito, a ponto de executar obras de Estado, como os hospitais regionais de Gurupi e de Araguaína, a nova ponte sobre o Rio Tocantins em Porto Nacional e recuperação e pavimentação de rodovias em todo o Estado.
Com isso, Carlesse tornou-se um “governador Hllywood”, forte e poderoso, a quem seus adversários temiam e a quem seus companheiros jamais ousavam pensar em trair.
VELÓRIO VAZIO
Pois bem. Esta análise se faz necessária para alertarmos aos governantes que ao chegar ao poder se deixam envolver e seduzir por uma “bolha”, composta por um grupo de assessores que o cercam apenas com “boas notícias” na ponta da língua, com rapapés e tapetes vermelhos. Esses assessores são os chamados e conhecidos baba ovos, papagaios de pirata e amigos do poder, e não gostam que outras pessoas se aproximem ou se tornem íntimos do seu “assessorado”.
Posse de Wanderlei Barsosa como governador interino
Esse alerta vale tanto para quem pleiteia um cargo nas próximas eleições quanto para o governador em exercício, Wanderlei Barbosa.
Envolto nessa “bolha”, o poderoso governante não cria laços com as lideranças políticas mais populares, com os vereadores, com os prefeitos, com as lideranças classistas, sindicais e com o povo em geral, e passa a ser visto como uma espécie de “entidade” inatingível, um semideus.
Deputada Vanda Monteiro PSL
E é, justamente essa bolha, que impede o governante de identificar os negócios espúrios feitos nos gabinetes adjacentes ao seu, a formação de verdadeiras quadrilhas no seio do seu governo, as células contaminadas pela falta de ética, de caráter e de comprometimento de certos servidores, que acabam por contaminar toda a máquina administrativa, enquanto, de dentro da bolha, o governador, que a tudo desconhece, cego pelos salamaleques dos “amigos da onça”, vira uma espécie de robô humano, e é pego de surpresa quando a Justiça age.
Assim como nos relacionamentos matrimoniais, o amor é construído pela convivência, pelo carinho, pelo cuidado, pelo afeto e, quem está “preso” dentro de uma bolha, inatingível, não tem nem como demonstrar nem receber amor de ninguém.
É por isso que, hoje, Mauro Carlesse está afastado do governo há mais de 15 dias e não se viu nenhum ser humano que seja se manifestar achando que isso foi negativo para o Tocantins – e é negativo em diversos aspectos! – desde a Capital até o menor município.
Mauro Carlesse e a prefeita eleita de Gurupi Josi Nunes
Nem Cinthia Ribeiro, nem Josi Nunes, eleita em Gurupi graças ao apoio de Carlesse, assim como a deputada Vanda Monteiro (PSL), ninguém veio a público em solidariedade ao governador afastado. Nenhum deputado estadual nem federal, nem a ex-presidente do PSL, que estendeu tapete vermelho e lhe deu o comando da legenda no Tocantins. Podemos afirmar que Mauro Carlesse está sendo tratado pelos seus companheiros, que governaram o Estado com ele e lhe juravam lealdade, justamente, como um “defunto sem choro”, jogado ás traças, antes mesmo que se prove, juridicamente, a sua “morte”.
Se, por ventura a Justiça decidir pela volta de Mauro Carlesse ao poder, seja por liminar, seja ao fim dos 180 dias – e essa é uma hipótese muito plausível –, muita gente vai chorar a oportunidade perdida de ter demonstrado um resquício que fosse de solidariedade, e serão essas pessoas que irão se transformar em “defuntos sem choro”, mas em um velório coletivo.
APRENDER COM O EXEMPLO
Mesmo Carlesse tendo conseguido organizar as finanças do Tocantins, tocado obras importantes, distribuído cestas básicas e kits de higiene às centenas de milhares, parece que tudo isso teve efeito zero junto à população, inclusive em Porto Nacional, onde está sendo resgatado um sonho antigo do povo, que é a construção da nova ponte sobre o Rio Tocantins e a pavimentação das rodovias que ligam a cidade a Brejinho de Nazaré e Monte do Carmo, e a rejeição à Carlesse chega à casa dos 90%.
Caso consiga retornar ao governo, o que é uma possibilidade mais real que muitos imaginam, Mauro Carlesse precisa aprender com o exemplo, evitar a formação de uma nova “bolha” em que esteve preso por quase cinco anos, longe do povo, dos líderes políticos, empresariais e classistas, entidades representativas, que são os verdadeiros pilares de qualquer governo.
Bons ou ruins, os dois principais líderes políticos deste Brasil sofrido, Jair Messias Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, jamais foram defuntos sem choro, pois, ao invés de bolhas, enquanto governo, os dois se mantiveram junto ao povo e às lideranças partidárias indo, sempre que puderam, ás ruas, fazer um corpo a corpo com o povão.
E é esse povão, uns de verde e amarelo, outros de vermelho, que vai sempre às ruas quando seus líderes são atacados.
Fica o exemplo!