Outubro marcou a disparada da carne bovina. Especialistas apontam vendas para China como principal causa e que preços devem cair nos primeiros meses do ano que vem
Por Rikardy Tooge, G1 — São Paulo
As carnes devem continuar com preços altos por mais alguns meses, até a oferta de animais para o abate, principalmente bovinos, voltar a crescer — o que deve acontecer entre janeiro e fevereiro, dizem especialistas.
Desde outubro, o brasileiro viu os valores dispararem. Em São Paulo, o quilo da carne bovina atingiu a média histórica de R$ 16,12 na última quarta-feira (27), de acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da USP (Cepea). Frango, porco e até os ovos também encareceram.
Veja 5 pontos para entender o cenário:
*a China aumentou muito a compra de carnes brasileiras, principalmente a bovina, por causa de uma doença que matou milhões de porcos na Ásia;
*o preço da arroba do boi gordo disparou, em um movimento que junta uma recuperação esperada pelo mercado e a especulação por causa da alta nas exportações;
*a oferta de bezerros não está acompanhando a demanda dos produtores e da indústria, e o preço deles também aumentou;
*com a carne mais cara, a procura por frango, porco e ovos subiu, e o preço dessas proteínas também;
*mesmo com aumento da venda para fora, os frigoríficos descartam risco de desabastecimento no país.
Veja mais sobre cada um desses pontos.
Por que ficou mais caro? Não foi a procura nos açougues brasileiros que fez o preço da carne disparar. Foi a "fome" dos estrangeiros, especialmente chineses, que, segundo frigoríficos, pagam até 15% a mais pela carne.
Entre setembro e outubro as exportações para China (+110%), Rússia (+694%) e Emirados Árabes (+175%) cresceram muito na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo a associação que representa os frigoríficos (Abrafrigo).
O Brasil é o segundo maior produtor de carne bovina e o principal exportador mundial. Em segundo, vem a Austrália, que enfrenta uma grave seca e, consequentemente, teve sua produção de gado afetada. Depois vêm os Estados Unidos, que travam uma guerra comercial com a China, principal consumidora de proteínas animais do planeta.
Além da tensão com os EUA, os chineses também enfrentam a escassez da principal carne consumida no país, a de porco, por conta de um surto de peste suína africana.
A doença matou mais de 7,5 milhões de animais em toda Ásia neste ano. Para dar conta da demanda de bilhões de pessoas, o governo chinês foi em busca de todos os tipos de carne – todos mesmo, inclusive carne de jumento – e encontrou no Brasil um fornecedor importante.
As compras de carne bovina brasileira pela China dispararam de junho para frente (veja abaixo). A procura por frango e porco também subiu.
Para aumentar as vendas, os chineses habilitaram diversos frigoríficos brasileiros no ano. Atualmente 102 indústrias brasileiras estão autorizadas a vender para China, 16 de carne suína, e 48 de carne de frango, 37 de carne bovina e 1 de carne de asinino (jumento).
Outro fator que não pode ser deixado de lado quando se trata de exportação é o dólar, que deixa as vendas para o exterior mais atrativas. Desde o fim de outubro, a cotação da moeda americana vem subindo com força, batendo recorde atrás de recorde.
Variação do dólar em 2019
Diferença entre o dólar turismo e o comercial, considerando valor de fechamento
Reflexo no Brasil
Em outubro, as exportações da carne bovina foram recordes e os consumidores brasileiros começaram a sentir o reflexo disso no bolso.
Mas a alta não aparece só na carne vendida no açougue. Ela está em todo o processo da cadeia.
"O preço da arroba do boi gordo estava crescendo ao longo do ano, mas a peste suína africana na China acelerou o processo de alta desse valor", explica o diretor da Scot Consultoria, Alcides Torres.
O motivo do crescimento ao longo do ano ocorreu por uma estratégia adotada pelo pecuarista no primeiro semestre do ano para diminuir os custos de produção.
Os criadores atrasaram o período de confinamento de animais, onde o gado entra em uma dieta de engorda para o abate, e optaram por mantê-los engordando no pasto, o que acaba adiando a chegada do boi ao frigorífico. Não havia a expectativa de vendas tão aceleradas no período.
Segundo dados do Cepea, a média do preço pago ao pecuarista ficou entre R$ 150 e R$ 160 por arroba (15 kg) durante boa parte do ano. Em novembro, com mais frigoríficos autorizados a exportar para a China e após o recorde de exportações, ela chegou a passar dos R$ 220.