Sérgio Roberto de Carvalho foi detido na Hungria utilizando documentos falsos
Com Agências
A polícia da Hungria prendeu, nessa terça-feira (21), o ex-major da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul, Sérgio Roberto de Carvalho, de 63 anos, considerado um dos maiores traficantes de drogas do mundo em atividade. Major Carvalho, conhecido como "Pablo Escobar Brasileiro", é apontado como o chefe de operações internacionais que utilizam vários portos do Brasil, incluindo o de Natal. Segundo informações da Polícia Federal, Major Carvalho estava em Budapeste, capital húngara, com um passaporte falso.
Em novembro do ano passado, a TRIBUNA DO NORTE publicou uma reportagem sobre a participação do RN em um esquema internacional de tráfico de drogas, que contava com a participação do Major Carvalho. As apreensões de cocaína que passaram pelo Porto de Natal totalizaram 17 toneladas, em quatro anos (de 2017 a 2021). Desse quantitativo, 6.190 kg foram apreendidos ainda em Natal, enquanto o restante na Holanda, Bélgica e Espanha, após alertas emitidos às aduanas dos países. Em 2021, essas apreensões geraram um prejuízo de pelo menos R$ 178 milhões ao tráfico internacional. Ao todo, foram apreendidos 815 quilos da droga saindo do Porto em direção à Roterdã, na Holanda.
O principal método utilizado no esquema era o Rip On/Rip Off, que consiste na quebra do lacre do contêiner, inserção da droga (Rip On) e colocação de outro lacre, sem conhecimento do exportador/importador da carga lícita. Na descarga no destino, há o movimento inverso e o contêiner é reaberto para retirada da droga (Rip Off).
Além deste, outras técnicas eram utilizadas para driblar a Receita e a Polícia Federal, com mudanças na metodologia à medida que as drogas eram apreendidas, o que obrigava as autoridades a buscar identificar as novas formas de contaminação de cargas. Na reportagem de novembro, a Receita Federal explicou, por exemplo que, a droga costumava entrar no Porto através dos caminhões dos contêineres, isto é, a carga já contaminada. Em alguns casos, a droga era embalada a vácuo e misturada com mostarda, para enganar cães farejadores.
Como o Porto de Natal exporta apenas frutas e pescados, a droga era ocultada nas cargas refrigeradas. As investigações apontavam que, nesses casos era necessário o aluguel de galpões para esconder a droga e preparar a ocultação no contêiner. O aluguel desses galpões e barracões (com compartimentos ocultos e subterrâneos) era feito mediante documentos falsos. O esquema, portanto, precisaria da participação do exportador ou da empresa estufadora e do caminhoneiro que levava o contêiner.
A reportagem informa, ainda, que isso aconteceu em pelo menos duas situações no Rio Grande do Norte. Em novembro de 2018, a Polícia Federal apreendeu 1.400 kg de cocaína no subterrâneo de um galpão em Parnamirim. A droga seria escoada pelo Porto em direção à Europa.
Em outro caso, em Emaús, a PF apreendeu uma carga de 283 quilos de cocaína, escondida na carroceria de um caminhão que estava no Porto de Natal para pegar um contêiner vazio. O caminhão foi seguido por policiais federais de um galpão localizado em Emaús, na Grande Natal, até o terminal na Ribeira.
Quatro pessoas sem relação com o Porto foram presas em flagrante. Os policiais federais encontraram lacres de contêineres com esses suspeitos presos. O esquema, que colocou Natal na rota do tráfico internacional de drogas, era chefiado, em quase toda sua totalidade, pelo Major Carvalho.
O prejuízo ao crime organizado aumenta para R$ 440 milhões quando se somam apreensões de 1.198 quilos na Holanda e na Bélgica, mas que passaram por Natal, ao longo do ano passado, após alertas emitidos pela Receita Federal à aduana europeia. A Receita Federal aponta que a localização do Porto e a proximidade de Natal com a Europa são fatores que explicam a capital estar na rota do tráfico. Além disso, até outubro de 2020, o Porto de Natal operava sem scanner de contêiners.
O esquema
No esquema específico comandado pelo ex-major da Polícia Militar, o crime se organizava em três grandes grupos: “Márcio Cristo” e “Zoio”, com ações em Paranaguá (PR) e “Logístico”, em São Paulo. A capital potiguar faria parte de um subgrupo vinculado ao “Logístico”, intitulado “Barcos Natal” e “Frutas Nordeste”, que incluía, ainda, cidades como Juazeiro (BA) e Petrolina (PE).
No caso do “Logístico”, o papel do grupo seria receber, armazenar e transportar para quem atuava diretamente na exportação da cocaína, como o Grupo Barcos Natal, “especializado na reforma de embarcação para ocultação de grandes carregamentos de cocaína em viagens transoceânicas”, segundo a Justiça Federal. Esse grupo seria chefiado por Lenildo Marcos da Silva, o “Cabeça”, sendo diretamente ligado ao Major Carvalho.
A Justiça afirma que três embarcações foram reformadas na Rua Chile, na Ribeira, zona Leste de Natal, para o esquema. Entre elas estaria a “Wood”, embarcação que foi apreendida em águas internacionais com 1.100 kg de cocaína nas proximidades de Cabo Verde em maio de 2019. O pesqueiro foi encontrado a aproximadamente 280 milhas náuticas da Cidade da Praia, em Cabo Verde. Seis dos sete tripulantes eram do Rio Grande do Norte. Eles partiram de Jaboatão dos Guararapes (PE) e o barco era inscrito na Capitania dos Portos do RN.
Neste caso específico, a técnica utilizada pelo grupo é a “Pescaria”, que consiste no transporte da droga em lanchas ou içamento para navios. No processo, a PF cita que o carregamento da droga foi transportado por um helicóptero branco e azul “que lançou a carga ao mar a cerca de 50 milhas náuticas de Pernambuco já acondicionada nos sacos”.
Prisão foi realizada ontem em Budapeste, na Hungria
Sérgio Roberto de Carvalho foi preso na terça-feira (21), em Budapeste, capital da Hungria. Segundo informações da Polícia Federal, Major Carvalho estava com um passaporte mexicano (falso) e não resistiu à prisão. Ainda não há a confirmação se ele ficará preso na Europa ou se será extraditado para o Brasil. Carvalho estava foragido desde 2018.
Investigações da PF apontam que o Major Carvalho comandava uma grande organização criminosa responsável pelo envio de 45 toneladas de cocaína para a Europa, avaliada em R$ 2,25 bilhões, a partir de 2017. No Brasil, o narcotraficante foi condenado, em 2019, a 15 anos e três meses de prisão por usar laranjas em empresas de fachada para movimentar R$ 60 milhões.
O ex-major da PM do Mato Grosso do Sul foi para a reserva da corporação em 1997 e foi condenado um ano depois, a mais de 15 anos de prisão por tráfico de cocaína. Ele também sofreu um processo para a perda do posto e da patente e foi demitido da PM em 2018. Na Europa, o ex-major fingia ser um empresário do Suriname, chamado Paul Wouter.