Advogada tenta anular fim da ADPF 518, pedido pelo PT, em ação contra regras contra líderes de facções da era Moro
Por: Ricardo Brandt
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar se mantém a ação contra regras de endurecimento das penas nos presídios federais, com fim das visitas íntimas para lideranças de facções, como o PCC e o Comando Vermelho, adotadas pelo governo federal, entre 2017 e 2019.
A advogada Flávia Pinheiro Fróes tenta salvar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 518, apresentada ao STF por ela em nome de duas entidades em 2018, que passou a ter o PT como parte autora em 2019.
A ação seria julgada no dia 9 de março pelo STF, mas na semana anterior, o PT e o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediram ao ministro relator, Edson Fachin, que o caso fosse extinto sem julgamento. O documento do partido é de 2 de março, assinado pelo advogado Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça.
A ADPF 518 é o pano de fundo da troca de acusações entre Lula e o senador Sérgio Moro (União-PR), sobre o plano do PCC de sequestros e ataques, alvo da Operação Sequaz, da Polícia Federal, deflagrada na 4ª feira (22.mar).
Presídio federal tem zero registro de fugas | Depen/Divulgação
Entenda a ADPF 518 e a briga Lula e Moro
Em 2017, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, edita a Portaria 718/2017, regra que acaba com as visitas íntimas nos presídios federais, no governo Michel Temer (MDB), após o impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Em 2018, com a escalada da violência contra autoridades em São Paulo e outros estados, o promotor Lincoln Gakyia, do Gaeco de São Paulo, pede o isolamento das lideranças do PCC.
Em 2018, a ONG Anjos da Liberdade e a Abracrim entram com a ADPF 518 no STF e pedem a nulidade da portaria editada em 2017, que acabava com as visitas íntimas nos presídios federais.
Em 2019, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, editou a Portaria 157/2019, que implantou as regras previstas de endurecimento contra lideranças do PCC e outras facções nos presídios federais. Avião da FAB desembarcou em Brasília com 20 membros da facção, entre eles, Marcola.
O PT passou a integrar a ação como autor em 2019, junto com as entidades ligadas a advogada Flávia Fróes, do Rio, que atua na defesa de presos.
Em fevereiro de 2023, a PF inicia inquérito no Paraná em que investiga um plano do PCC contra o senador Sérgio Moro (União-PR), ex-ministro da Justiça.
Em março de 2023, dias antes da data marcada para julgamento da ADPF no STF, 9 de março, a AGU e o PT pediram no processo a extinção do caso antes mesmo do julgamento.
Em 7 de março de 2023, Fachin julgou extinto o processo da ADPF 518, por perda de objeto. A advogada Flávia Fróes recorreu.
O recurso da advogada que busca dar sobrevida a ADPF 518 começou a ser julgado virtualmente pelos ministros do STF, no Plenário Virtual, na 6ª feira (31.mar) e segue até o dia 12 de abril.
No recurso, a advogada argumentou que o pedido do PT não pode anular a ação. Em publicações em suas redes sociais, Flávia Fróes afirma que o partido e o governo Lula enviaram emissários ao STF para argumentar com Fachin sobre a necessidade de não julgamento do caso.
O Instituto Anjos da Liberdade se manifestou pela ausência de perda de objeto, eis que a legislação nova mantém ou agrava os efeitos concretos da legislação anterior, sendo que da cadeia normativa persiste o mesmo vício de inconstitucionalidade.
Risco político
Quando Lula levantou dúvidas sobre o plano do PCC contra Moro, em visita ao Rio, e falou em "armação", era esse o pano de fundo que o presidente tinha conhecimento. De que o papel do PT na defesa do direito dos presos, ao encampar a ADPF 518, seria usado politicamente para atacar o governo e, ainda, reforçar o discurso de oposição, que tenta sem provas associar petistas ao crime organizado, em especial ao PCC, em São Paulo, e ao Comando Vermelho, no Rio.
O PT usou a Lei Anticrime (13.964/2019) para argumentar que a causa perdeu objeto. Ela previu a adoção do parlatório ou da visita por meio virtual nas penitenciárias federais. Atualmente existem cinco presídios federais: Catanduvas (PR), Mossoró (RN), Porto Velho (RO), Campo Grande (MS) e Brasília (DF).
PT
Pedido do PT ao STF para não julgar ADPF 518 | Reprodução
"A presente arguição de descumprimento de preceito fundamental foi proposta com o objetivo de promover a defesa dos direitos das pessoas privadas de liberdade e a correta adequação das normas de execução penal à luz da Constituição Federal, a cumprir a missão do Partido dos Trabalhadores e em consonância com a iniciativa de entidades da sociedade civil atuantes na temática."
A AGU e a Procuradoria Geral da República (PGR) concordaram com a tese da "perda superveniente de objeto" da ADPF 518. "Posteriormente ao ajuizamento da presente ADPF foi promulgada a Lei 13.964/209, denominada Pacote Anticrime, que promoveu nova regulamentação ao regime de visitas de pessoas que cumprem pena tanto no âmbito do regime disciplinar diferenciado quando no sistema penitenciário federal."
No Plenário Virtual, em que os ministros votam um processo pela internet, Fachin, que é relator, já publicou seu voto, em que nega o pedido de revisão de seu julgamento, e mantém extinta a ADPF 518.
Incômodo
Em publicações em redes sociais e em manifestações recentes, Flávia Fróes afirmou que a ADPF 518 "virou um incômodo para o PT".
"O Instituto e demais partes entraram com agravo regimental para que o STF aprecie o tema, estando marcado para amanhã o julgamento da ação que se tornou um incômodo para o PT."
A advogada citou uma missiva do governo ao STF, registrada na agenda oficial do ministro Fachin. "O PT entrou com petição alegando perda de objeto tentando impedir o julgamento do mérito. No dia 6 de março, 3 dias antes do julgamento público e presencial pelo Supremo, enviou um batalhão de choque ao gabinete do ministro Fachin", informa a advogada.
Flávia Fróes foi candidata a deputada federal em 2022, pelo União Brasil do Rio, e apoiou Lula. A organização não-governamental Anjos da Liberdade foi fundada e é presidida por ela, que defende direitos dos presos. Ela também assina pela Cobap, no processo.
A advogada atua na área criminal para lideranças do tráfico no Rio há duas décadas. Na semana passada foi divulgada investigação da Polícia Federal contra Flávia Fróes, por suposto pedido de recursos para sua campanha de duas lideranças do tráfico no Rio, ligadas ao Comando Vermelho, durante visita no presídio federal de Catanduvas (PR).
A advogada reagiu e afirmou que defende os direitos humanos e a garantia de que mulheres, crianças e familiares vejam e tenham contato com os encarcerados. Também negou qualquer irregularidade nos pedidos feitos aos detentos em Catanduvas (PR).
Em 2010, ela também foi alvo de operação da PF, acusada de repassar informações dos traficantes Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Elias Maluco, para fora do presídio federal. Na ocasião foi expedida ordem de prisão também contra a namorada do criminoso, Beatriz da Costa de Souza, e outro advogado.