Por maioria, os ministros do tribunal eleitoral decidiram não estabelecer tese sobre punição a candidatos que usarem a religião para obter votos
Por Fernanda Vivas, TV Globo — Brasília
O Tribunal Superior Eleitoral decidiu nesta terça-feira (18), por 6 votos a 1, rejeitar a proposta de punição pelo chamado abuso de poder religioso – ou seja, responsabilização de candidatos pelo uso irregular da religião para obter votos.
Os ministros avaliaram a possibilidade de fixar uma tese que permitisse a caracterização deste tipo de abuso. Ele seria parecido com os abusos de poder econômico e político, que já existem e podem levar à cassação de mandatos.
O julgamento do tema começou no dia 25 de junho e teve como base o caso de uma vereadora de Luziânia (GO). Pastora da Assembleia de Deus, Valdirene Tavares dos Santos (Republicanos) foi acusada de usar sua autoridade e posição na estrutura religiosa para promover a candidatura de vereadora. Ela foi reeleita em 2016.
Relator do caso, o ministro Edson Fachin propôs a caracterização dessa "modalidade" de abuso no início do julgamento do tema, em 25 de junho. O ministro negou que a intenção seja estabelecer proibições e discriminações a um grupo particular.
TSE retomou julgamento sobre abuso de poder religioso nesta terça
"Quando se cogita situar as autoridades religiosas dentro de um quadro de responsabilidades e limites, não se pretende inaugurar um campo proibitivo discriminatório e particular. Ao revés: está-se tão somente a reconhecer que a concepção universal sobre a justiça e a liberdade das eleições enseja o afastamento de práticas constritivas e indutoras de desequilíbrio em todo e cada rincão da esfera pública, inclusive no interior dos templos", afirmou.
Mas a maioria dos ministros acompanhou o voto do ministro Alexandre de Moraes – que, além de considerar que não havia provas suficientes para cassar o mandato da vereadora, entendeu que não é possível criar uma espécie de abuso não prevista em lei.
Seguiram o voto de Moraes os ministros Tarcísio Vieira, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão, Sérgio Banhos. Com isso, a tese de Fachin foi derrotada por 6 votos a 1.
“Não me parece ser possível em virtude do princípio da legalidade destacarmos uma espécie não prevista em lei sem que a questão religiosa seja um instrumento para se chegar ao poder político, econômico”, afirmou Moraes.
“Qualquer atitude abusiva que acabe comprometendo ou gerando abuso do poder político e econômico deve ser sancionada pela legislação eleitoral, nem mais nem menos”, completou.
Retomada do julgamento
Na retomada do julgamento, nesta terça-feira (18), os ministros Og Fernandes, Luís Felipe Salomão e Sérgio Banhos apontaram que a liberdade religiosa não é absoluta e encontram limites na Constituição. O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, considerou que o tema já está expresso na legislação eleitoral.
"A impossibilidade de se reconhecer o abuso de poder religioso como ilícito autônomo não implica em passe livre para toda a espécie de conduta, visto que não existe direito absoluto em nosso ordenamento", afirmou o ministro Luís Felipe Salomão.
"Entendo haver na legislação e jurisprudência atuais mecanismos suficientes para coibir e punir eventuais excessos praticados por meio do discurso religioso, de forma a não se admitir um desvirtuamento do ato religioso em ação política eleitoral", ponderou o ministro Og Fernandes.
"Creio que a Justiça Eleitoral não pode avançar para coibir certas práticas religiosas norteadas por discursos litúrgicos, embora isso não signifique que tais condutas não serão punidas nas modalidades de abuso de poder econômico, ou utilização indevida de meios de comunicação", afirmou o ministro Sérgio Banhos.
"Na minha visão, o legislador já contemplou e de maneira expressa a possibilidade de abuso de poder religioso. É essa leitura que faço da Lei das Eleições", afirmou o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso. No entendimento do ministro, a legislação prevê uma vedação expressa de que entidades religiosas façam doações a campanhas eleitorais.
Barroso ressaltou ainda que as circunstâncias do caso concreto não permitem levantar a discussão do poder religioso.
"Não houve doação de entidade religiosa nem propaganda no âmbito de templo. Nem houve conduta que pudesse ser equiparada ao abuso de autoridade", acrescentou.