O país viveu a última semana como os espectadores de uma partida de tênis, olhando de um lado para o outro, acompanhando a bolinha. Só que a “bolinha” eram as declarações ora de Carlos Bolsonaro, filho do presidente da república e vereador na cidade do Rio de Janeiro, ora de Gustavo Bebianno, principal articulador da campanha que elegeu Bolsonaro, nomeado Ministro da Secretaria-Geral da Presidência.
A essência do “jogo de tênis” foi a denúncia de que Bebianno havia usado candidatos-laranja para utilização de verba de campanha. A partir daí, Carlos Bolsonaro chamou Bebianno de mentiroso, Bebianno se defendeu como pôde, mas, ao que parece, o episódio apenas serviu como pretexto para a “família” Bolsonaro excluir o ex-aliado do governo.
Armou-se, então, uma guerra com mais pacificadores que combatentes, mas que parece já ter um desfecho programado para esta segunda-feira (18), assim que for publicado o Diário Oficial da União, onde deve constar a exoneração de Bebianno.
“CAIR ATIRANDO”
Caso se confirme a saída de Bebianno do governo, ele promete “cair atirando” e já usou algumas entrevistas para disparar contra a família Bolsonaro.
Bebianno disse no último sábado que, “quando acabar” sua participação no governo, “se sentir vontade”, vai “dar satisfações”. Bebianno não recebeu visitas ao longo do dia, mas, em conversas com pessoas próximas, deixou claras a frustração e a mágoa com Carlos Bolsonaro.
O filho do presidente chamou Bebianno de “mentiroso” logo após o ministro ter concedido entrevista ao jornal O Globo, na terça-feira, dizendo que não estava isolado no Palácio do Planalto depois da denúncia, publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, de que teria patrocinado candidaturas laranjas do PSL em 2018, para desviar recursos do Fundo Eleitoral. À época, Bebianno presidia o PSL.
Na tentativa de mostrar que não havia crise, o ministro afirmou a O Globo que, no dia anterior, falara três vezes com o presidente, então internado no Hospital Albert Einstein, recuperando-se de cirurgia para reconstrução do trânsito intestinal. Carlos Bolsonaro desmentiu essas conversas no Twitter e o presidente endossou a atitude do filho, horas depois, em entrevista à TV Record.
Mais tarde, no entanto, Bolsonaro também mandou Bebianno cancelar viagem para o Pará, com outros ministros, porque não gostou de saber que ele havia convidado um veículo de comunicação para acompanhar a comitiva. A partir daí, o ministro da Secretaria Geral da Presidência teria mostrado a amigos arquivos de áudio com a voz de Bolsonaro ordenando que ele suspendesse a viagem, além de outras conversas. O ministro nega o vazamento.
O ministro desabafou que considerou uma covardia o fato de Jair Bolsonaro não ter tido coragem para demiti-lo. Bolsonaro sinalizou que quer exonerar o ministro e ofereceu a ele um cargo na diretoria de Itaipu Binacional, embora a possibilidade seja vedada pela Lei das Estatais. A oferta foi prontamente recusada por Bebianno. Ele considerou inaceitável assumir um cargo em Itaipu, apesar do salário três vezes maior – pouco mais de R$ 1 milhão por ano. A amigos, disse que não veio para o governo para ganhar dinheiro e que será leal até o último minuto em que permanecer ministro.
Nos últimos dias, políticos e militares tentaram interceder a favor de Bebianno. Preocupados com a alta temperatura da crise, auxiliares do presidente observam, por sua vez, que Bebianno ainda pode criar muitos problemas para o governo, se a demissão não for revertida, porque seria o que se chama no jargão político de “homem bomba”.
Nas conversas, Bebianno tem avisado que não cai sozinho, pois tanto a ala política, quanto a ala militar do governo, estão decididas a afastar Carlos Bolsonaro da Presidência. Nos últimos dias, o vereador tem sido mais comedidos nas redes sociais, compartilhando mensagens institucionais do governo e assuntos do Rio, como a venda da bebida em blocos de carnaval.
“PLANO CONTRA BOLSONARO”
Alguns analistas políticos já chegam a afirmar que Bebianno teria um plano contra Bolsonaro. Se Bebiano não tivesse sido desmascarado na questão da suposta candidatura-laranja que ele, Bebiano e sabe-se lá quem mais arrumaram nas vésperas da eleição, para aparentemente desviar R$ 400.000,00, hoje o problema estaria grudado no Presidente da República, e certamente existiria de fato uma crise grave no Governo.
A mídia inteira a partir de agora estaria começando a falar de “crime eleitoral” pelo Presidente, de desvio de dinheiro de campanha (nos moldes de PC Farias/Collor), e a arapuca estaria montada para inviabilizar o governo.
Mas Carlos Bolsonaro desmontou a trama. Ao ter capacidade de perceber o perigo que se armava no horizonte para o governo do pai, desmentiu praticamente EM TEMPO REAL a notícia veiculada na mídia tradicional (e replicada instanteamente pelo prestigiado site ‘O Antagonista’) da (inexistente) conversa de Bebiano com Bolsonaro para tratar do assunto da “candidatura-laranja”.
E além de desmentir Bebiano e a mídia, Carlos Bolsonaro ainda divulgou o áudio do pai para provar que não houve qualquer conversa com Bebiano, deixando claro que o problema não seria assunto do Governo e da Presidência da República.
Carlos Bolsonaro, com essa atitude, gerou ódio dos muitos que esperam de fato um enfraquecimento do Governo Bolsonaro, com o aparecimento de crises e o surgimento de motivos para se tentar derrubar o presidente.
E, incrivelmente, a mídia que tem um pé atrás em relação a Jair Bolsonador, incluindo-se o próprio ‘O Antagonista’, passou a defender a permanência de Bebbiano no governo e condenando a atitude de Carlos Bolsonaro.
Com efeito, se ela tivesse bom-senso deveria ter feito justamente o inverso: teria apoiado o afastamento de Bebiano e aplaudido a atitude de um Presidente que, ao menor sinal de algo errado por parte de alguém de sua equipe, o isola do Goveno e o demite (o que tudo leva a crer que será feito).
“HOMEM BOMBA"
Na última sexta-feira (16), ao deixar o hotel onde mora, em Brasília, Bebianno afirmou que está com a consciência tranquila e que ainda tem “carinho” pelo presidente Jair Bolsonaro. Mas essa opinião parece ter mudado, de acordo com o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo.
Segundo Jardim, o ministro afirmou a um interlocutor que “o problema não é o pimpolho”, em referência a Carlos Bolsonaro, filho do presidente e vereador na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. “O Jair [Bolsonaro] é o problema. Ele usa o Carlos como instrumento. É assustador.”
A decepção de Bebianno não parou por aí. De acordo com o colunista, Bebianno teria afirmado ao mesmo interlocutor que “perdeu a confiança” no presidente. “Tenho vergonha de ter acreditado nele. É uma pessoa louca, um perigo para o Brasil.”
Se houver “sujeira embaixo do tapete” e se Bebianno realmente “cair atirando”, temos tudo para ver acontecer, de novo, algo semelhante com o que aconteceu com o governo Collor.
Tomara que não.
Só o tempo tem essa resposta.
Clã Bolsonaro negocia deixar PSL e migrar para nova UDN
Com informações do site Terra
Com o PSL em crise e sob suspeita de desviar verba pública por meio de candidaturas "laranjas" nas eleições de 2018, os filhos do presidente Jair Bolsonaro (PSL) negociam migrar para um novo partido, que está em fase final de criação. Trata-se da reedição da antiga UDN (União Democrática Nacional).
Segundo três fontes ouvidas pela reportagem em caráter reservado, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) se reuniu na semana passada em Brasília com dirigentes da sigla para tratar do assunto. Ele tem urgência em levar adiante o projeto. Eleito com 1,8 milhão de votos, Eduardo teria o apoio de seu irmão, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). Com esse movimento, a família Bolsonaro buscaria preservar seu capital eleitoral diante do desgaste do partido.
Enquanto ainda estava internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, Jair Bolsonaro acionou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, para que determinasse investigações sobre o caso.
As suspeitas atingiram o presidente da legenda, deputado federal Luciano Bivar (PSL-PE), e foram pano de fundo da crise envolvendo o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno, que foi chamado de mentiroso por Carlos Bolsonaro depois de afirmar que tratara com o pai sobre o tema. Após cinco dias de crise, Bebianno deve ser exonerado do cargo nesta segunda-feira, 18, por Bolsonaro.
Além de afastar a família dos problemas do PSL, a nova sigla realizaria o projeto político de aglutinar lideranças da direita nacional identificadas com o liberalismo econômico e com a pauta nacionalista e conservadora, defendida pelo clã Bolsonaro.
No começo do mês, Eduardo foi ungido por Steve Bannon, ex-assessor do presidente americano Donald Trump, como o representante na América do Sul do The Movement, grupo que reúne lideranças nacionalistas antiglobalização.
O projeto do novo partido é tratado com discrição no entorno do presidente. Em 2018, a UDN foi um dos partidos - embora ainda em formação e sem registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) - sondados por interlocutores do presidente para que ele disputasse a eleição, mas a articulação não avançou. Depois de anunciar a adesão ao Patriota, Jair Bolsonaro acabou escolhendo o PSL.
Assinaturas
A nova UDN é um dos 75 partidos em fase de criação, conforme o TSE. Segundo seu dirigente, o capixaba Marcus Alves de Souza, apoiadores já reuniram 380 mil assinaturas - são necessárias 497 mil para a homologação da legenda. O partido já tem CNPJ e diretórios em nove Estados, como exige a legislação eleitoral para a homologação. Ela tem em Brasília um de seus principais articuladores, o advogado Marco Vicenzo, que lidera o Movimento Direita Unida e coordena contatos com parlamentares interessados em aderir ao novo partido. A articulação envolveria ainda o senador Major Olímpio (PSL-SP), que nega.
Souza prefere não comentar as tratativas do partido que estão em curso. Ele, porém, admitiu que a intenção é criar o maior partido de direita do País. Como se trata de uma sigla nova, a legislação permite a migração de políticos sem que eles corram o risco de perder seus mandatos. "O único partido que tem o DNA da direita é a UDN. A gente não pode ter medo de crescer, mas com responsabilidade", afirmou.
Souza deixou o Espírito Santo, onde atuou na Secretaria da Casa Civil do ex-governador Paulo Hartung, e mudou-se para São Paulo para concluir a criação da nova UDN, que adotou o mesmo mote de sua versão antiga: "O preço da liberdade é a eterna vigilância". "Nosso sonho é que a UDN renasça grande e se torne o maior partido do Congresso", afirmou seu presidente. Ele disse ainda que a legenda pretende apoiar o governo Bolsonaro e está aberta "para receber pessoas sérias do PSL e de qualquer partido".
Palácio
Procurada pelo Estado, a assessoria do Palácio do Planalto informou que não ia se manifestar sobre o assunto. A reportagem procurou ainda as assessorias do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), do deputado Eduardo Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro, mas nenhuma delas se manifestou.
Em processo de homologação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a UDN, sigla que pode abrigar o clã Bolsonaro, foi inspirada no partido que nasceu em 1945 para aglutinar as forças que se opunham à ditadura de Getúlio Vargas.
Com o discurso de moralização da política e contra corrupção, a frente unia originalmente desde a Esquerda Democrática - que romperia um ano depois com a sigla e fundaria o Partido Socialista Brasileiro - a antigos aliados de Vargas, como o general Juarez Távora e o ex-governador gaúcho Flores da Cunha, rompidos com o ditador.
Em 1960, o partido apoiou a eleição de Jânio Quadros, eleito presidente, e, em 1964 , a deposição do governo de João Goulart. "O PSL é um partido de aluguel, já a UDN tem um apelo histórico e popular. Os Bolsonaros podem usar isso", disse o historiado Daniel Aarão Reis, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Líderes
Ele lembra que a antiga UDN, embora "muito ideologizada", tinha um perfil heterogêneo. O mesmo pode acontecer com a nova versão do partido. Enquanto a versão original da UDN tinha líderes como o brigadeiro Eduardo Gomes, o jurista Afonso Arinos e os ex-governadores Carlos Lacerda (Guanabara), Juracy Magalhães (Bahia) e Magalhães Pinto (Minas), a nova legenda tem potencial para atrair lideranças do DEM ao PSDB, passando pelo MBL.
Entre os políticos que são vistos como "sonho de consumo" da UDN em 2019 está o governador de São Paulo, João Doria, que descarta a ideia de deixar o PSDB.