Grupos indígenas completaram neste domingo (19) uma semana nas ruas do Equador, com passeatas, bloqueios de estradas e episódios de violência em protestos contra políticas do governo do presidente conservador, Guillermo Lasso, e o aumento do preço dos combustíveis.
Com Estadão
Neste fim de semana, um avião cargueiro cedido pelo governo da Colômbia, com capacidade para 2,5 toneladas, realizou os dois primeiros voos para transportar comida e remédios da capital até Cuenca, a 620 quilômetros ao sul, de modo a furar os bloqueios das rodovias que atendem a região.
"Não vamos parar. Demos início à ponte aérea para manter o abastecimento de medicamentos e alimentos nas principais cidades do país. Continuaremos fazendo quantos voos sejam necessários", disse o ministro da Produção, Júlio José Prado, pelo Twitter.
Nesta segunda-feira (20), a Assembleia Nacional vai analisar o decreto de emergência anunciado por Lasso para as províncias de Pichincha, onde fica a capital, Ibabura e Cotopaxi, as mais afetadas pelas manifestações. A medida, que habilita Lasso a mobilizar as Forças Armadas para manter a ordem interna, suspender direitos dos cidadãos e decretar toque de recolher, vale, a princípio, por 30 dias.
O decreto, que inclui toque de recolher noturno na capital, não teve efeitos práticos, e indígenas mantiveram protestos em pelo menos 14 das 24 províncias do país no fim de semana.
Mesmo assim, o prefeito de Quito, Santiago Guarderas, se dirigiu em carta à Assembleia Nacional para pedir que o Parlamento não revogue o decreto presidencial. "Responsabilizo os parlamentares que votarem a favor da revogação do estado de exceção pelas consequências que podem trazer para a paz e a segurança da cidade. A capital não pode ficar indefesa", escreveu.
O temor do governo e de analistas é que haja um novo "outubro de 2019", quando protestos contra o corte de subsídios dos combustíveis deixaram 11 mortos, 1.507 feridos e 1.330 presos.
A Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie) lidera os protestos pela redução dos preços dos combustíveis após o aumento de 90% do valor do galão do diesel, que chegou a US$ 1,90 (R$ 9,79), e de 46% da gasolina comum (agora a US$ 2,55, ou R$ 13,14) entre maio de 2020 e outubro de 2021. Desde o ano passado, a entidade propõe que os preços sejam reduzidos a US$ 1,50 e US$ 2,10, respectivamente.
Além dos preços da gasolina, os manifestantes protestam pela renegociação de dívidas dos trabalhadores rurais com bancos e contra o desemprego e a concessão de licenças de mineração em terras indígenas.
No sábado (18), o presidente da Conaie, Leonidas Iza, afirmou que o grupo permaneceria nas ruas. "Confirmamos a luta em nível nacional, em caráter indeterminado", disse. A Conaie participou de protestos que depuseram três chefes de Estado entre 1997 e 2005 e liderou as manifestações de 2019.
Os protestos também têm impactado a exportação de flores, atividade econômica importante do país. Segundo a Expoflores, que reúne empresas do setor, cada dia de paralisação tem provocado perdas na faixa dos US$ 2,5 milhões (R$ 12,8 milhões).
Pressionado, Lasso, que está no poder há um ano, também anunciou na sexta-feira o aumento de US$ 50 (R$ 257) para US$ 55 (R$ 283) no auxílio econômico a famílias de baixa renda. Além disso, o Executivo ordenou o perdão de empréstimos vencidos de até US$ 3.000 (R$ 15,5 mil) concedidos pelo banco estadual de desenvolvimento produtivo e deve subsidiar em até 50% o preço da ureia agrícola, fertilizante usado no campo, para pequenos e médios produtores.
Pelas redes sociais, Iza afirmou que a Conaie comemora "os pontos em que há avanços. Embora sejam irrisórios, vão ajudar em alguma coisa", disse. Segundo a entidade, ele teve seu carro baleado no sábado. "Ele [Iza] está bem. Alertamos com isto para o estado de emergência e a atitude beligerante do governo", afirmou o grupo no Twitter. As autoridades não comentaram o assunto.
Em 2021, a pobreza no Equador chegou a 27,7% da população, e a extrema pobreza, a 10,5%. As zonas rurais são as mais vulneráveis.