A proposta, que agora vai ao Senado, estava parada desde 2007, mas ganhou uma versão final nas últimas semanas. O texto cria regras de transparência para profissionais que atuam na "representação de interesses" e define limites para brindes e viagens pagos por empresas para agentes públicos
Com Carta Brasil
O projeto foi alterado de última hora pelo relator, Lafayette Andradada (Republicanos-MG), para retirar punições criticadas por Organizações Não Governamentais (ONGs). As entidades se queixaram de penas previstas a quem "atuar de forma de modo a constranger ou assediar participantes de eventos" ou "prejudicar ou perturbar reunião". Os trechos, que causaram impasse na votação nas últimas semanas, foram retirados do texto.
O projeto que regulamenta o lobby foi apresentado para ampliar a transparência entre órgãos públicos, empresas e entidades da sociedade civil. Pela proposta, por exemplo, toda a reunião ou encontro entre representantes de empresas e entidades com funcionários públicos deve ser conhecida, inclusive com a divulgação do tema da conversa.
O lobby é exercido por grupos de interesse junto a agentes públicos a fim de tentar influenciar a aprovação de projetos ou atender a demandas de um determinado setor. A prática é bastante comum nos órgãos públicos e previsto em países como Estados Unidos e Chile. No Congresso, por exemplo, lobistas costumam circular com facilidade para tratar de temas de seu interesse com os parlamentares, ajudando na elaboração de propostas.
O projeto proíbe "a oferta de bem, serviço ou vantagem indevida por agente privado que tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe", mas define como exceção "brinde ou hospitalidade legítima".
"Brinde é o item de baixo valor econômico distribuído de forma generalizada a título de cortesia, propaganda ou divulgação habitual" e "hospitalidade legítima é a oferta de serviço ou pagamento de despesas com transporte, alimentação, hospedagem, cursos, seminários, congressos, eventos e feiras, no todo ou em parte, por agente privado para agente público", segundo o texto.
Segundo o texto do projeto, as entidades, no caso de infrações, seriam punidas primeiro com advertência e, depois, por uma suspensão da atividade profissional de 30 dias até um ano.
Serão punidas entidades que prometerem ou darem vantagens indevidas, deixarem de apresentar informações ao público, ocultarem "os reais clientes ou interesses representados" e "atuar como intermediário do representado ou de terceiros para realização de ato contrário à lei ou destinado a fraudá-la", entre outras infrações.
Os agentes públicos, por sua vez, sofrerão punições se não forem transparentes em relação a atividades de lobistas, se receberem vantagens indevidas ou se atuarem fora do escopo de suas funções, exercendo atividade "incompatível" com o cargo.
O relator, Lafayette Andrada, rechaça a crítica de que o texto relativiza a punição pelos crimes de corrupção e tráfico de influência. A definição de tráfico de influência é "solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função", semelhante à infração prevista no projeto que é punida apenas com advertência, suspensão ou multa.
— Nas considerações finais, está explícito que nenhuma das penalidades administrativas suprimem as punições do Código Penal (de corrupção e tráfico de influência) e da lei de lavagem de dinheiro.
Dessa forma, portanto, as entidades ou agentes públicos que cometerem infrações previstas no projeto podem também ser processadas criminalmente pelos mesmos fatos.
Apesar das alterações no texto após reclamações das ONGs, entidades procuraram o relator do texto nesta terça-feira para diz que ainda há uma preocupação com punições a organizações da sociedade civil que "representam interesses", como ambientalistas.
"Regulamentar o lobby é desejável, mas o texto aprovado precisa ser corrigido no Senado. Da forma como redigido, abre margem para eventual perseguição política, além de permitir a desconsideração da personalidade jurídica sem decisão judicial", diz Maurício Guetta, assessor jurídico do ISA (Instituto Sócio-Ambiental).
Lafayette diz que entidades como ONGs ambientalistas não estão incluídas no escopo do que o texto quer regulamentar.
— Eles estão com uma ótica de olhar a questão do ativismo. O pessoal de uma ONG que vai fazer uma manifestação, por exemplo. Isso não é lobby. O escopo não é esse. A manifestação de opinião não constitui representação de interesses.
O projeto afeta entidades que atuem na representação de interesse com "caráter profissional". Isso é definido por autodeclaração ou "pelo exercício da atividade pela pessoa natural ou jurídica com habitualidade".
Essa "habitualidade", por sua vez, pode ocorrer se a atividade é praticada "com agentes públicos distintos, mais de uma vez, no período de 15 dias; ou com o mesmo agente público, no período de 30 dias".
O texto inclui também uma ressalva de que não constitui representação de interesses "o comparecimento à sessão pública, à audiência pública, à reunião pública, ou quaisquer eventos abertos ao público em órgãos ou entidades públicas, como exercício do direito de acompanhamento de atividades públicas, de participação social e manifestação política".