Processo no Conselho da Câmara julgava ataques do parlamentar ao STF e apologia ao AI-5
Por Agência O Globo
O Conselho de Ética da Câmara aprovou nesta quarta-feira (7) a suspensão do mandato do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) por seis meses. Deputados da oposição de outros conselheiros tentaram aprovar a cassação, mas não conseguiram votos suficientes.
O deputado fluminense pode recorrer à CCJ e, depois, o caso irá ao plenário. Daniel Silveira responde a três processos no conselho e o caso que julgado nesta quarta é o mais grave.
É o que envolve os duros ataques que o parlamentar fez a ministros do STF , até com ameaças físicas, além de defesa do AI-5 , o ato mais duro da ditadura militar implementada no país a partir de 1964.
O próprio governo trabalhou pela suspensão de seis meses para não correr o risco de ver aprovado outro parecer, que pedia cassação do mandato de Silveira.
Esta foi a segunda suspensão de seu mandato aprovada pelo conselho. A primeira, de dois meses, foi aprovada semana passada e envolveu a acusação de ameaças que fez em vídeo aos manifestantes conhecidos como "antifascistas", quando afirmou que podem levar um "tiro na caixa do peito".
O relator do caso dos ataques de Silveira a ministros do STF, Fernando Rodolfo (PL-PE), propôs a suspensão por seis meses. Ele entende que cassação de mandato seria uma punição excessiva.
"Talvez uma suspensão de seis meses seja mesmo pouco. Ideal seria um período maior. Mas entendo que a cassação do mandato é medida extrema. Concordo que o deputado Daniel extrapolou o limite do bom senso, não concordo com sua postura e repudiamos aqui. Mas ele não praticou ato de corrupção, não matou. Perder o mandato pelo o que ele fala é muito grave. Acho que ele já está pagando por seus excessos, está preso. Acaba de voltar para a cadeia. Se o deputado não chegou, já está muito próximo do fundo do poço. Provável que nem volte mais ao mandato nesta legislatura, se as penas de suspensão forem somadas. E o Supremo (STF) pode até suspender seus direitos políticos", disse Fernando Rodolfo.
Até mesmo o advogado Jean Garcia, que atua no conselho na defesa de Silveira, pediu que os deputados votassem pela suspensão de seis meses, para evitar que, em caso de derrota, fosse aprovado um relatório pela cassação do mandato.
"Que sirva de lição para o deputado Daniel Silveira, que foi perseguido por seus pecados por extrapolar por ter falado coisas fora da curva. Mas quem já não falou? Que jogue a primeira pedra. A cassação seria um precedente perigosíssimo. Seria também uma tortura", disse Garcia.
Líder do PSL na Câmara, Vitor Hugo (GO), entende que a suspensão de Silveira é a pena devida, mas é contra a cassação. Ele afirmou ser a melhor solução, ainda que preferisse uma punição menor. Hugo elogiou o relatório de Rodolfo.
O partido orientou seus deputados a votarem pela suspensão para não correr risco de cassação. Isso porque se a suspensão fosse derrotada, um voto em separado da oposição pela cassação seria colocado em votação.
"O deputado já está sendo punido. Ele retornou para a prisão dentro do batalhão, já pagou por tudo que fez. Temos nossas críticas em relação às suas falas, ainda que também tenhamos críticas ao Supremo (STF). Houve exageros por parte dele a serem reprimidos, corrigidos, além da prisão", disse Vitor Hugo.
A Advocacia Geral da União entrou com ação para barrar Lei 14.172 que garante internet a estudants da rede pública
Por Sandy Mendes
O presidente Jair Bolsonaro acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) contra o repasse de recursos da União para garantir acesso à internet a alunos e professores da educação básica da rede pública. A verba, equivalente a R$ 3,5 bilhões, está prevista na Lei 14.172/2021, que institui o pagamento desse montante aos estados e municípios para ações que visem a ampliar a conectividade nas escolas de todo o Brasil.
A lei é de autoria da Câmara dos Deputados e foi aprovada pelo Senado em 24 de fevereiro deste ano, mas recebeu veto do presidente. O Congresso, no entanto, conseguiu derrubar o veto e agora ela está pendente apenas de publicação no Diário Oficial da União. Uma vez publicada, os recursos deverão ser transferidos em até 30 dias para os entes federados.
Ao vetar o texto, Bolsonaro argumentou que o projeto era um empecilho para o cumprimento da meta fiscal do governo. Agora Bolsonaro questiona a norma no STF por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) protocolada via Advocacia-Geral da União. A ação terá como relator no Supremo o ministro Dias Toffoli.
Pela Lei 14.172/2021, a União deve repassar R$ 3,5 bilhões, tendo como fontes de recursos o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e o saldo correspondente a metas não cumpridas dos planos gerais de universalização do serviço telefônico fixo. Esse dinheiro deve ser aplicado para compra de tablets e pacotes de dados móveis por estados e municípios.
A estimativa é de que 14 milhões de estudantes brasileiros e 1,5 milhão de professores dos ensinos fundamental e médio possam ser beneficiados. O texto exige que a família do estudante esteja inscrita no Cadastro Único (CadÚnico) ou que ele esteja matriculado em escolas de comunidades indígenas e quilombolas.
Esses recursos visam a diminuir prejuízos gerados pela dificuldade de acesso à educação em decorrência da pandemia que levou à suspensão das aulas nas escolas públicas. Dados do Instituto de Pesquisas Aplicada (Ipea) divulgados em setembro do ano passado atestaram que ao menos seis milhões de estudantes brasileiros não possuíam acesso à internet em casa, dos quais 5,8 milhões eram estudantes da rede pública.
Partidos contrários à medida, incluindo legendas que apoiam Bolsonaro, trocam os seus representantes e aprovação de relatório favorável à medida vira dúvida
Por Camila Nascimento
A obsessão bolsonarista em aprovar o voto impresso já para as eleições de 2022 subiu no telhado. A articulação de vários partidos políticos para impedir a aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) apresentada pela deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) fez com que virasse o jogo — que era tido como mais favorável aos aliados do presidente Jair Bolsonaro — na comissão especial da Câmara que analisa o tema.
O clima começou a mudar após uma reunião no dia 26 de junho de presidentes de onze partidos, incluindo legendas da base de Bolsonaro, como Ciro Nogueira, do PP (partido do presidente da Câmara, Arthur Lira); Valdemar Costa Neto, do PL; e Marcos Pereira, do Republicanos. Após o encontro, o grupo defendeu que o atual sistema eletrônico é confiável e que mudanças nesse momento poderiam causar inseguranças no processo eleitoral. Quatro dias depois, líderes dessas legendas se reuniram com o ministro Alexandre de Moraes, que será o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) nas eleições de 2022, e reafirmou esse entendimento.
O primeiro revés na comissão especial ocorreu já no dia 28 de junho, quando o relatório favorável à implantação do voto impresso foi apresentado pelo deputado bolsonarista Filipe Barros (PSL-PR), relator da proposta – um pedido de vistas coletivo, no entanto, adiou a votação.
Os partidos também iniciaram uma estratégia de esvaziamento da comissão, substituindo os integrantes favoráveis à PEC por parlamentares que são contra. Cinco legendas trocaram os seus membros: MDB, PSD, PL, Patriota e PV. O Solidariedade, que ainda tinha uma vaga para preencher, indicou Bosco Saraiva (AM) como titular — ele é contra a medida. É esperado que mais partidos que participaram da reunião na semana passada mudem os seus deputados, como PSDB, Republicanos, PSL, Cidadania, PP e Avante. A Rede e o PT já se posicionavam contra o voto impresso.
Por pouco, o tema não foi retirado de pauta na última segunda-feira, 5. Hildo Rocha (MDB-MA) apresentou um requerimento para isso, mas a votação ficou empatada em 15 a 15 – com isso, o relator Filipe Barros decidiu prosseguir com a discussão.
Durante a sessão, a autora da proposta, Bia Kicis – que Bolsonaro chamou de “mãe do voto impresso” –, sentiu o golpe e acusou o STF de interferir na tramitação da medida na Câmara. Segundo ela, a troca de membros da comissão pelos partidos foi uma forma de as legendas atenderem a um pedido da Corte. “Estamos sofrendo campanha e ataque do Judiciário, que está interferindo na missão do Parlamento”, afirmou.
Relatório
Parlamentares criticam o relatório entregue por Barros. O custo estimado de 2 bilhões de reais, os riscos no transporte das cédulas de papel e as dificuldades que eleitores com deficiência visual e analfabetos enfrentariam para verificar o seu voto foram alguns dos motivos de discordância apresentados na comissão.
A nova tentativa de votação do relatório está prevista para a próxima quinta-feira, dia 8. A avaliação hoje é a de que o relatório, como está, dificilmente será aprovado. Diante do cenário desfavorável, deputados a favor do voto impresso tentam deixar a análise para a próxima semana, enquanto buscam novas negociações nesse período.
A queda levou a aprovação para o pior patamar desde o início da atual gestão, em janeiro de 2019
Por Camila Turtelli
Com o avanço das investigações sobre denúncias de irregularidades na compra de vacinas contra a covid-19, a popularidade do presidente Jair Bolsonaro caiu ao seu patamar mais baixo desde o início do governo, aponta pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) em parceria com o Instituto MDA. As entrevistas foram efetuadas entre 1º e 3 de julho.
A avaliação positiva do governo (quando o entrevistado diz considerar a gestão ótima ou boa) caiu de 33%, em fevereiro de 2020, para 27,7% em julho deste ano. A queda levou a aprovação para o pior patamar desde o início da atual gestão, em janeiro de 2019.
A porcentagem de pessoas que responderam à pesquisa dizendo considerar o governo ruim ou péssimo subiu de 35% para 48,3% de fevereiro para julho. Outros 22,7% consideram a administração regular. Nesse quesito, os entrevistados são questionados de que maneira avaliam o governo do presidente Jair Bolsonaro: ótimo, bom, regular ou péssimo.
As entrevistas nas quais se baseia a pesquisa foram realizadas após a revelação de suspeitas de corrupção envolvendo a compra de vacinas. Na sexta-feira, 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a Procuradoria-Geral da República (PGR) a investigar se Bolsonaro prevaricou no caso da compra da vacina indiana Covaxin. A suspeita é de que ele não comunicou aos órgãos de investigação indícios de irregularidades na aquisição do imunizante pelo Ministério da Saúde.
Além disso, cresceram nos últimos meses movimentos de rua pedindo o impeachment de Bolsonaro. Neste sábado, 3, atos foram registrados em todas as capitais com o nome de "3JForaBolsonaro". Os organizadores contabilizaram ações em 347 municípios no Brasil e em 16 países do exterior. Foi a terceira manifestação em um período de dois meses. Os manifestantes pedem o afastamento do presidente, a retomada do auxílio emergencial de R$ 600 e a vacinação em massa da população.
A Câmara também recebeu, na semana passada, o chamado "superpedido" de impeachment de Bolsonaro, assinado por movimentos e partidos de esquerda, siglas de centro, centro-direita e ex-bolsonaristas, com 46 assinaturas e 271 páginas.
Com esse cenário, a aprovação pessoal de Bolsonaro também caiu, indo de 43,5% para 33,8%. Nessa pergunta, o instituto questiona as pessoas consultadas se elas aprovam ou desaprovam o desempenho pessoal do presidente da República. A rejeição subiu de 51,4% para 62,5% no mesmo período. Ou seja, a quantidade de reprovação superou a de aprovação.
Cenário eleitoral
A pesquisa CNT/MDA também questionou os entrevistados em quem eles votariam caso as eleições presidenciais do ano que vem fosse hoje. O ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva lidera as intenções de voto, com 41,3%, enquanto Bolsonaro tem 26,6%.
O ex-candidato à Presidência Ciro Gomes (PDT), por sua vez, registrou 5,9%, o mesmo patamar do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro.
Se Bolsonaro for candidato a presidente no ano que vem, 22,8% disseram que votariam nele com certeza e 11,6% disseram que poderiam votar nele. Por outro lado, 61,8% disseram que não votariam nele para presidente de jeito nenhum e 0,4% disse não conhecê-lo ou saber quem é.
Se Lula confirmar a candidatura a presidente no ano que vem, 35,4% disseram que votariam nele com certeza e 17,1% disseram que poderiam votar nele. Por outro lado, 44,5% disseram que não votariam nele para presidente de jeito nenhum e 0,1% disse não conhecê-lo ou saber quem é.
Se a eleição para presidente fosse hoje, 52,6% votariam em Lula e 33,3% disseram que votariam em Bolsonaro, no caso de uma disputa no segundo turno entre os dois candidatos. Para este cenário, 11,5% votariam branco ou nulo.
Em outra simulação de segundo turno, Ciro aparece com 43,2% contra 33,7% de Bolsonaro. Para este cenário, 18,8% votariam branco ou nulo.
Foram realizadas 2.002 entrevistas presenciais, em 137 municípios de 25 Unidades da Federação. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais para mais ou para menos, com 95% de nível de confiança.
Tentei escapar, mas é quase inevitável falar sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado relativa à pandemia e os fatos que levam a ela. Não gosto de personalizar, e menos ainda, por motivos óbvios, quando se trata do presidente da República. Tratarei de não o fazer, embora seja difícil
Por Ricardo Noblat
O caso parecia banal: uma tentativa de gastar dinheiro público, sem critério. Mas não era. Não só porque há certa irritação no país com relação ao desvio de finalidades no uso do dinheiro dos contribuintes, mas também porque, no caso, se trata de um governo que se jacta de ser cuidadoso nessa matéria (obrigação de qualquer presidente que se preze). E também porque os fatos em tela se dão no âmbito de uma pasta, a da Saúde, diretamente ligada à luta contra a pandemia, a qual torna a vida de cada um de nós arriscada. Portanto, o olhar da opinião pública fica ainda mais atento para tudo o que se passa em seu âmbito e no dos setores do governo a ele ligados.
Não quero dizer que se deva generalizar o que aconteceu, nem deixar de reconhecer o efeito, louvável, de o governo prestar atenção ao que acontece com os fundos públicos. Não deveria agora desviar o olhar. E não se trata somente do presidente, mas do conjunto da administração: o chefe dela paga o preço de erros dos quais nem sequer toma conhecimento. Quem está na chuva se molha, como eu me molhei, mesmo não sendo responsável direto por alguns erros…
Por isso mesmo, pasma ver quanta incompetência e quanto descaso na administração de coisas tão importantes como sucede com recursos do Ministério da Saúde. Pior, chega a assustar o pouco-caso inicial da autoridade máxima com os eventos que se desenrolam naquela pasta. A alegação de desconhecimento pode até ser verdadeira (recordo-me do caso do apagão, quando eu, entusiasmado com a construção de novas hidrelétricas, não me dei conta de outros problemas de distribuição de energia que já atormentavam o povo e terminaram por “balançar o coreto”).