O Senado aprovou, ontem terça-feira (28), o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 16/2022, originário da Medida Provisória 1.104/2022, que permite o uso de Fundos Garantidores Solidários (FGS) para toda operação financeira vinculada à atividade empresarial rural, incluídas aquelas resultantes de consolidação de dívidas e aquelas realizadas no âmbito dos mercados de capitais. A matéria será encaminhada à sanção presidencial.
Com Agência Senado
O texto aperfeiçoa as regras do financiamento privado do agronegócio nacional. Com a medida, não será mais necessário que os credores tenham cota na formação do FGS, que passará a contar apenas com cotas de responsabilidade dos devedores e, se houver, do garantidor (uma seguradora, por exemplo). Já as Cédulas de Produto Rural (CPR) poderão ser assinadas eletronicamente, com níveis de segurança simples, avançado e qualificado.
A mudança na exigência de segurança das assinaturas ajudará pequenos produtores e suas cooperativas, que têm até 1º de janeiro de 2023 para obrigatoriamente registrar CPR com valor superior a R$ 50 mil. Atualmente, as CPRs precisam ser registradas em depósitos centralizados para controlar sua negociação no mercado secundário, girando em torno de R$ 200 bilhões. O texto aprovado também permite o uso da assinatura eletrônica para a emissão de penhor rural, de Certificado de Depósito Agropecuário (CDA) e do Warrant Agropecuário (WA).
A MP foi aprovada na Câmara em 21 de junho com modificações feitas pelo relator, deputado Pedro Lupion (PP-PR), e encaminhada ao Senado, onde foi relatada pelo senador Acir Gurgacz (PDT-RO), que manteve o texto aprovado pelos deputados. O relator rejeitou cinco emendas apresentadas no Plenário do Senado à proposição, por entender que as alterações não guardavam relação com o texto ou comprometiam o teor da proposição.
Crédito rural
Acir Gurgacz destacou que a aprovação da matéria terá consequências positivas, dada a proximidade do anúncio do Plano Safra 2022/2023.
— Os produtores rurais estão passando por um momento difícil. Ano passado, a taxa de juros básica estava em 4,25%. Hoje, está em 13,25%, com perspectiva de alta. O aumento do custo tem efeito negativo na economia e nos investimentos do setor agrícola. O país vem sofrendo choques negativos desde 2015, problemas nas cadeias produtivas em todo o mundo, choques de custos, elevação do preço dos insumos fragilizou acentuadamente o setor e preocupa os produtores rurais. Os financiamentos da futura safra estão começando e é preciso aprovar essa medida que ajudará o produtor rural brasileiro, permitindo que possam encontrar alternativa de financiamento mais barata devido as garantias que estão envolvidas nessa modalidade de financiamento. O país de crédito mais barato e em maior quantidade aos produtores rurais, especialmente os médios e pequenos, de forma célere — afirmou.
O relator destacou ainda que a MP busca facilitar o registro das CPR, permite maior liberdade às partes contratantes e desburocratiza os empréstimos futuros.
— A MP amplia o escopo de utilização do fundo garantidor solidário, que oferece mecanismos de garantia para operações de crédito de produtores rurais. O fundo agora poderá garantir qualquer operação financeira vinculada à atividade empresarial rural. Os aperfeiçoamentos da MP são ainda mais urgentes em virtude de fenômenos climáticos que reduziram a produção. Com esses ajustes, possibilita-se instrumento de solução para o endividamento criado pela chuva, no Nordeste, e pela seca, no Sul — afirmou.
Cotistas e emissores
A MP retirou a exigência de percentual mínimo dos cotistas, calculado sobre o saldo devedor a garantir de cada participante. Até então, os cotistas primários precisavam depositar no FGS o equivalente a 4% desse saldo; e os credores, 2%. O texto aprovado amplia o universo de agentes autorizados a emitir a Cédula de Produto Rural, bem como o rol de produtos passíveis de serem objeto de emissão de CPR.
A CPR é um título de comercialização antecipada da safra emitido pelos agricultores. Por meio desse mecanismo, o produtor recebe dinheiro do investidor e, em troca, promete entregar-lhe a produção (CPR física) ou dinheiro (CPR financeira).
Segundo o texto, além de produtores agrícolas e pecuários, passarão a emitir CPRs quem exercer atividades de recuperação de florestas nativas e de áreas degradadas, ou prestação de serviços ambientais na propriedade rural; industrialização desses produtos e de outros já previstos, como agrícolas, pecuários, de pesca e aquicultura; produção ou comercialização de insumos agrícolas, de máquinas e implementos agrícolas e de equipamentos de armazenagem.
Nos dois últimos casos, poderá ser emitida apenas a CPR financeira, e esse tipo de cédula poderá garantir dívida futura vinculada a outras CPRs ou usada para fixar limite de crédito.
Haverá também incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e de Imposto de Renda sobre os CPRs emitidos por aqueles que fazem a primeira industrialização dos produtos rurais; que atuam em atividades de conservação, recuperação e manejo de florestas nativas; que industrializam produtos agrícolas pecuários e extrativistas; e por produtores e comercializadores de insumos agrícolas, máquinas e implementos agrícolas e equipamentos de armazenagem.
O texto aprovado ainda permite que as CPRs sejam usadas como lastro para quaisquer instrumentos de securitização do agronegócio, mantidas a incidência de IOF e do Imposto de Renda.
A MP passa de 10 dias úteis para 30 dias úteis o prazo para registrar ou depositar a CPR em entidade autorizada pelo Banco Central a exercer a atividade de registro ou de depósito centralizado de ativos financeiros ou de valores mobiliários.
Outros títulos
Outra mudança na legislação sobre títulos rurais permite a vinculação do Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), da Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e do Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) às CPRs, prevendo, no entanto, a cobrança de IOF e do Imposto de Renda sobre esses títulos quando vinculados a cédulas em que tais tributos incidem.
Atualmente, a CRA conta com isenção de Imposto de Renda nos rendimentos obtidos pelo investidor.
Penhor rural e Fiagro
Quanto ao penhor rural, o texto aprovado dispensa o registro ou a averbação do segundo penhor em relação ao primeiro e dispensa termo aditivo ou assinatura dos emitentes para as prorrogações de vencimento de cédulas de crédito rural.
Para compor as carteiras dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), o texto permite o uso de ativos financeiros emitidos por pessoas físicas e jurídicas que integrem a cadeia produtiva do agronegócio e títulos de securitização emitidos com lastro nesses ativos, inclusive CPRs físicas e financeiras.
Afetação de imóvel rural
No instituto da afetação de imóvel rural, que ocorre quando o proprietário pode dar todo o imóvel ou parte dele como garantia em operações de crédito, o texto aprovado da MP 1104/22 dispensa o registro na matrícula do imóvel dessa garantia e exige apenas a averbação a partir de memorial descritivo da área com coordenadas dos limites, dispensados os custos para imóveis com área de até 4 módulos fiscais.
Caso o credor executar a dívida e precisar registrar em seu nome a propriedade definitiva do imóvel ou parte dele dado em garantia, o oficial do cartório de imóveis deverá averbar o parcelamento definitivo para o qual será necessária a apresentação da certificação do georreferenciamento da área em questão.
Desapropriação
Em processos de desapropriação de imóveis por interesse público, a transferência da propriedade àquele que desapropria não dependerá da concordância do proprietário se, ao contestar o procedimento, ele não questionar a validade do decreto de expropriação.
Atualmente, a lei prevê a necessidade de anuência do expropriado para a transferência de propriedade na contestação do preço de avaliação imposto, geralmente pela administração pública mas também por concessionárias de serviços públicos.
Produtores de trigo
Para produtores de farinha de trigo, o texto permite o aproveitamento de crédito presumido de PIS e Cofins para compensar débitos de outros tributos solicitar ressarcimento em dinheiro se não for possível utilizar esses créditos para diminuir o valor a pagar desses tributos ao fim de cada trimestre. A regra valerá também para o saldo acumulado antes da vigência da futura lei.