O Congresso articula ampliar ainda mais o poder sobre o Orçamento no próximo ano e mudar as regras para tornar a liberação das chamadas emendas de relator uma obrigatoriedade para o Palácio do Planalto.
Por Thiago Resende
O plano, que tem apoio de líderes do bloco do centrão, foi formulado diante do cenário de favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na corrida presidencial. O petista é crítico desse tipo de emenda, que sustenta as negociações políticas no governo do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O projeto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023, que dá as bases para a formulação do Orçamento, será usado para tentar alterar o tratamento a ser dado pelo Executivo às emendas de relator.
O relatório da LDO foi apresentado neste domingo (26) já com o mecanismo para que as emendas sejam obrigatoriamente executadas. Os cálculos preliminares indicam que, no próximo ano, esses recursos devem somar cerca de R$ 19 bilhões no Orçamento.
Para tentar reduzir esse valor, o chefe do Palácio do Planalto em 2023 também precisaria aprovar um projeto no Congresso. Ou seja, os parlamentares teriam que aceitar perder parte do controle sobre a verba.
O senador Marcos do Val (Podemos-ES), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023 - Roque de Sá/Agência Senado
Emenda parlamentar é a forma que deputados e senadores conseguem destinar dinheiro do Orçamento federal para obras e projetos em suas bases políticas.
As emendas de relator não são consideradas impositivas. Essa característica, que transforma o uso dos recursos em uma exigência, é aplicada atualmente às emendas individuais e de bancada.
Hoje existem quatro tipos de emendas: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região), as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso) e as do relator (que permitem que congressistas mais influentes possam abastecer seus redutos eleitorais).
A primeira vez que o Congresso aprovou o mecanismo de emenda individual impositiva foi durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em meio a embates com o Legislativo.
Isso foi feito via LDO, mas depois a obrigatoriedade de liberação das emendas passou a ser prevista na Constituição –mudança aprovada enquanto Eduardo Cunha, algoz de Dilma, comandava a Câmara.
Em discursos recentes, Lula tem indicado que o modelo atual das emendas de relator não deve permanecer em eventual governo do petista.
A campanha do ex-presidente tem estudado propostas para mudar as regras dessas emendas.
Uma alternativa seria dar mais poder aos ministérios na decisão de liberação da verba para obras e projetos pelo país –petistas, porém, reconhecem que o fim das emendas de relator não seria aprovado pelo Congresso.
A estratégia de líderes do Congresso é garantir que as emendas de relator continuem atreladas aos deputados e senadores.
O relator da LDO de 2023, senador Marcos do Val (Podemos-ES), disse que o objetivo do mecanismo é deixar o Congresso mais independente do futuro governo.
"Essa é a intenção. Eu não sou bolsonarista. Eu sou um aliado [do atual governo], mas não um alienado. Sou um governista. Se no ano que vem a democracia decidir eleger outra pessoa, eu quero trabalhar para ajudar meu país e meu estado", afirmou o relator.
O movimento tem sido patrocinado pelo centrão –grupo de partidos que compõem a base de apoio de Bolsonaro no Congresso. Os maiores expoentes são PL, PP e Republicanos.
Essa trinca partidária está unida na campanha à reeleição de Bolsonaro. Integrantes dessas siglas temem que Lula mude as regras do jogo, que hoje tem dado maior influência política sobre o Orçamento.
Propostas de mudanças no funcionamento das emendas de relator em eventual governo Lula devem enfrentar resistência dos aliados de Bolsonaro, que perderiam os privilégios dados a parlamentares desse grupo pela proximidade com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e com o Palácio do Planalto.
Outra mudança sugerida pelo senador é que essas emendas no próximo ano precisem do aval do relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI), e do presidente da CMO (Comissão Mista de Orçamento), deputado Celso Sabino (União-PA).
Castro defende a eleição de Lula. Sabino é próximo a Lira, que é aliado de Bolsonaro.
A medida, portanto, pode embaralhar a distribuição das emendas de 2023, mas líderes dizem que isso depende do resultado das urnas e dos acordos a serem feitos até o início do próximo ano –como a eleição para presidentes da Câmara e do Senado, em fevereiro.
Do Val afirmou que a mudança tem o objetivo de aumentar o controle sobre essas emendas.
O relator também inclui na LDO um trecho que já abre caminho para reajuste salarial e reestruturação de carreiras de policiais. O setor de segurança pública faz parte da base de apoio dele.
O senador disse que a valorização desses profissionais é essencial para o país. "Dinheiro para segurança pública é investimento para a melhoria da qualidade de vida e de crescimento para o Brasil", afirmou.
A garantia para o reajuste e reestruturação de carreiras, como Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, ainda depende da reserva de verba a ser feita nas discussões do Orçamento, que começam em agosto.