Ex-governador do Rio de Janeiro se comprometeu a devolver R$ 380 milhões recebidos por meio de propina
Da Redação
O ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu homologar o acordo de colaboração firmado entre o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral com a Polícia Federal. O tratado foi oficializado no Supremo pelo fato de autoridades com foro privilegiado serem citadas.
Cabral se comprometeu, para ter acesso a benefícios, como a redução de pena, a devolver R$ 380 milhões recebidos por meio de propina quando ele ocupava o cargo de governador. No entanto, ao contrário do que faz o Ministério Público, a PF não decidiu, no momento da assinatura, quais benefícios seriam concedidos a Cabral. O acordo segue em segredo de Justiça.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, chegou a se manifestar contra o acordo. Segundo informações de dentro da PF, integrantes do Poder Judiciário também são citados, entre eles ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O ex-governador foi condenado 13 vezes no âmbito da Lava-Jato e suas penas, somadas, chegam a 380 anos de cadeia. Algo que deve mudar agora com a delação homologada.
Sérgio Cabral está preso desde novembro de 2016, por força de um mandado de prisão preventiva.
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Preso há três anos, o ex-governador acumula 13 condenações cujas penas somadas alcançam 282 anos de prisão — responde a, no total, 31 ações penais por corrupção, além de outras duas por outros crimes. Com o selo de colaborador da Justiça, o objetivo da defesa agora é tentar obter sua liberdade.
Há contra o ex-governador quatro ordens de prisão, que terão de ser revertidas uma a uma: duas da Justiça Federal do Rio de Janeiro, uma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e uma do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Homologação pode levar à soltura de Cabral
A expectativa da defesa de Cabral — e temor dos procuradores fluminenses — é de que ao se tornar colaborador, não há mais razão para mantê-lo preso preventivamente, sob risco de interferir na investigação ou permanecer cometendo crimes.
Os 20 anexos que integram a colaboração inicial se referem a pessoas com foro especial. A PF, contudo, pretende colher informações com o ex-governador sobre outros temas que, pelas conversas iniciais, podem chegar a 100 itens. Entre eles, está a investigação sobre o repasse de verbas da Oi para empresa de Jonas Suassuna, sócio de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula. A polícia suspeita que uma das vias usadas para a transferência foi um contrato com o governo do Rio na gestão Cabral (2007-2014).
Cabral passou a confessar desde o início de 2019 os crimes que lhe são atribuídos: corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O objetivo inicial era reduzir as penas, mas também sinalizar o poder das informações que dizia ter.
Assumiu no primeiro semestre ser o dono de cerca de US$ 100 milhões (R$ 407 milhões) devolvidos em 2017 por dois doleiros que se tornaram delatores. Também abriu mão, junto com a mulher Adriana Ancelmo, de bens como apartamentos, carros, lanchas e dinheiro em contas já apreendidos.
Desembargadores
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) afirmou em depoimento ao Ministério Público estadual que dois desembargadores foram nomeados ao cargo no Tribunal de Justiça em troca do arquivamento de investigação contra ele na promotoria.
Segundo Cabral, a nomeação dos ex-membros do MP-RJ Sérgio Azeredo e Marcos André Chut aos cargos de desembargador foi feita para garantir o fim do inquérito sobre a "farra dos guardanapos", viagem que reuniu ex-secretários e empresários.
O arquivamento ocorreu numa tumultuada sessão do Conselho Superior do MP-RJ em novembro de 2013 com uma votação apertada: 6 a 4.
Nem Chut, nem Azeredo integravam o Conselho Superior. Mas o ex-governador afirmou no depoimento - revelado pela GloboNews e confirmado pela reportagem - que o primeiro lhe garantiu dois votos de membros ligados ao seu grupo. Já Azeredo foi nomeado para atender ao então procurador-geral de Justiça Marfan Martins Vieira - o atual desembargador foi seu chefe de gabinete.
Ambos foram indicados ao cargo no TJ-RJ em 2015, quando Cabral não era mais governador. Ele diz, contudo, que o acordo foi fechado junto com o ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB), seu sucessor também preso.
É possível que um dos benefícios concedidos a Cabral seja o serviço de proteção à testemunha, uma vez que entre os citados em sua delação há políticos no exercício do mandato, policiais e membros do judiciário.