Segundo o ex-chanceler Ernesto Araújo, que depôs à CPI nesta terça, as decisões relacionadas ao combate à pandemia foram de responsabilidade do Ministério da Saúde
Da Agência Senado
O depoimento do ex-chanceler Ernesto Araújo à CPI da Pandemia nesta terça-feira (18) reforça a suspeita quanto à existência de um comando paralelo no combate à covid-19, em contraste com as orientações do próprio Ministério da Saúde. Essa foi a avaliação do comando da CPI, a qual difere da opinião de senadores governistas, para quem a oposição tentar criar um "crime inexistente".
Para o vice-presidente da comissão, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), as contradições apontadas por Ernesto Araújo comprometem a atuação de então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na crise gerada pela falta de oxigênio e de vacinas e apontam para a importância do depoimento do ex-titular da pasta à comissão nesta quarta (19).
— A situação está difícil para Pazuello, é um movimento de abandono [do ex-ministro da Saúde]. A melhor coisa que ele teria a fazer amanhã é colaborar com a CPI. Se não, todos os elementos apontarão ele como responsável pela morte de centenas de milhares de brasileiros — afirmou.
Para Randolfe Rodrigues, as colaborações de Ernesto Araújo também reforçam a “omissão criminosa” que o governo brasileiro teve durante a crise de oxigênio em Manaus.
— Deixa claro que quem aderiu ao consórcio Covax com 10%, e não 50% da vacina, foi o Ministério da Saúde. A quantidade de oxigênio que socorreu os amazonenses foi doada pelo governo da Venezuela e o governo brasileiro não articulou e nem agradeceu. Está ficando cada vez mais clara a omissão do governo na aquisição de vacinas. A pergunta é ‘quantas vidas de compatriotas poderiam ter sido salvas se pelo menos uma das propostas de vacinas, das tantas rejeitadas, tivesse sido concedida?’ — questionou.
"Gabinete das sombras"
Relator da CPI, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) também concorda com a existência do comando paralelo da pandemia, a quem classificou como “gabinete das sombras”. Ele também afirmou que Pazuello está sendo “entregue aos leões”.
— Era uma espécie de ministério da doença, em contraposição ao Ministério da Saúde, que despachava com o presidente da República, que fazia as reuniões no Palácio do Planalto, estabelecia as políticas públicas, onde deveria ser gasto o dinheiro, da forma como entendesse correta, e até pensava em modificar bula de remédio por decreto presidencial, enquanto o Ministério da Saúde sequer vacina poderia comprar. Pazuello anunciou a compra da vacina Coronavac e o presidente o desautorizou. Pazuello está sendo entregue aos leões. A pergunta é: ‘O senhor foi o único responsável por tudo isso, por essa tragédia?’. A essa altura, o silêncio depõe contra ele — afirmou Renan.
O relator da CPI destacou que Ernesto Araújo respondeu a todas as perguntas dos senadores, nas quais enfatizou que — à exceção da importação de cloroquina e da viagem a Israel, motivada, segundo o ex-chanceler, pela busca de novos medicamentos para o tratamento da covid-19 — todas as iniciativas de política externa aconteceram em função das decisões do Ministério da Saúde.
— Ao dizer isso, ele transfere o ônus da responsabilidade para o Ministério da Saúde e o ex-ministro Pazuello diretamente, sem subterfúgio. O que o Supremo [Tribunal Federal] decidiu é que Pazuello evidentemente não vai dizer nada que possa incriminá-lo, nem era esse o propósito da CPI. Queremos investigar fatos, não pessoas. Queremos que ele, como testemunha principal, como ex-secretário executivo e ex-ministro da Saúde possa colaborar com a CPI na busca da verdade, à medida que o governo vem aqui e transfere a responsabilidade para ele — afirmou Renan.
Questionado sobre a apuração de supostos desvios de recursos da saúde destinados pela União a estados e municípios, Renan disse que a comissão não fará dupla investigação sobre casos já em análise pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.
— Esses fatos não são prioritários na CPI. Nós vamos investigar tudo o que for necessário, mas dentro de um roteiro óbvio e dentro da competência do Senado — afirmou.
"Abuso de poder"
Defensor do governo, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) discorda do entendimento dos senadores da oposição.
— Pazuello vem para falar muitas coisas importantes. O habeas corpus [concedido pelo STF ao ex-ministro da Saúde] é para evitar abuso de poder. Gabinete paralelo? Isso é mais uma narrativa da oposição tentando criar crime — afirmou.
O senador defendeu a apuração imediata dos fatos relacionados à pandemia nas unidades da Federação.
— Parece-me que há uma campanha para fazer blindagem e impedir investigação. O alvo da CPI é o governo do presidente Bolsonaro. Tentam criar a narrativa de que o grande culpado pelo coronavírus é o Bolsonaro. Vamos ouvir os secretários estaduais. Não aceitamos que denúncias de desvios e corrupção que levaram à morte de milhares de brasileiros fiquem sem resposta. Nas próximas semanas, vamos seguir o rumo do dinheiro. Vamos começar com o Amazonas — disse Marcos Rogério.
Fonte: Agência Senado