Maia atribui à disputa de Bolsonaro com governadores o adiamento da votação de ajuda aos estados

Posted On Sexta, 10 Abril 2020 17:52
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Maia: não aceitamos ser instrumento de disputa entre governo e estados Maia: não aceitamos ser instrumento de disputa entre governo e estados

Governo diz que projeto é 'pauta-bomba', com impacto de R$ 180 bilhões aos cofres públicos. Para presidente da Câmara, isso é pretexto para não beneficiar governadores de Sul e Sudeste.

 

Por Fernanda Calgaro, Luiz Felipe Barbiéri

 

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), atribuiu nesta quinta-feira (9) o adiamento da votação do novo projeto de ajuda fiscal aos estados à disputa política do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) com governadores do Sudeste e do Sul.

 

Havia previsão de que o texto – que cria um plano emergencial de socorro financeiro aos estados e municípios para reduzir os efeitos da crise do coronavírus – fosse votado nesta quinta, em substituição ao chamado Plano Mansueto, mas acabou ficando para a semana que vem.

 

A equipe econômica do governo se opõe ao projeto sob o argumento de que seria uma “pauta-bomba”, com impacto da ordem de R$ 180 bilhões aos cofres públicos.

 

O presidente da Câmara, no entanto, afirma que esse valor está inflacionado e que, na verdade, o impacto seria em torno de R$ 100 bilhões.

 

Segundo Maia, o governo federal adotou esse discurso como pretexto para inviabilizar a votação do projeto, que irá beneficiar principalmente estados do Sudeste, como São Paulo e Rio de Janeiro, governados, respectivamente, por João Doria (PSDB) e Wilson Witzel (PSC), adversários de Bolsonaro.

 

“Transformar o debate sério que nós sempre fizemos e continuamos fazendo num debate de pauta-bomba porque, na verdade, o governo federal não quer atender os estados do Sudeste, do Rio, São Paulo, e do Sul, Rio Grande do Sul, entre outros... Nesse debate eu não vou entrar. Eu vou entrar no debate técnico”, afirmou Maia.

 

O presidente da Câmara disse ainda não se opor a discutir o texto. “Nós não aceitamos que o governo queira impor com informações falsas a sua posição. Com números verdadeiros, nós topamos discutir”, disse.

 

Segundo ele, o valor divulgado pelo governo é maior do que a estimativa da Câmara porque incluiria também outros itens, como a previsão de arrecadação pelos estados dos recursos liberados para empregos e para renda mínima.

 

“Então, todo programa do governo agora, em que ele colocar dinheiro em alguma obra, vai gerar arrecadação e ele vai incluir isso num atendimento aos governadores? Não faz sentido”, afirmou.

 

O novo projeto
O projeto em discussão determina a suspensão do pagamento das dívidas dos estados e autoriza a União a compensar estados e municípios pela perda de arrecadação de impostos.

 

Estados serão compensados pela queda no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), responsável por parte considerável da arrecadação estadual - em alguns casos, compõe mais de 80% do que entra nos cofres estaduais.

 

No caso dos municípios e do Distrito Federal, a União irá compensar o Imposto Sobre Serviço (ISS), que é um dos principais tributos recolhidos pelas prefeituras.

 

Para Maia, a estratégia do governo foi se concentrar em medidas que vão atender especialmente aos estados da Região Norte e Nordeste, governados por políticos que fazem oposição a Bolsonaro, e não aos estados liderados por partidos do mesmo espectro político do presidente, que poderão disputar o mesmo eleitorado em uma eventual eleição presidencial.

 

Pelo projeto em debate, segundo Maia, seriam beneficiados principalmente os estados do Sudeste, Sul e Centro Oeste, que recolhem mais Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS, estadual) e Imposto Sobre Serviços (ISS, municipal).

 

“Olha que coisa engraçada: o governo foi ágil em dar alguma solução para os estados do Norte e Nordeste, que, ideologicamente, são oposição natural ao governo. Então, esses eles resolveram porque, na política do contraponto, eles querem o PT vivo e querem matar o entorno daqueles de centro-direita. Agora, por que eles não querem uma solução do ICMS? Porque a solução do ICMS resolve com mais força de todos, mas resolve o problema do Sudeste, do Rio, de São Paulo, de Minas, do Rio Grande do Sul, do Centro Oeste”, disse.

 

Plano Mansueto
O presidente da Câmara defendeu a análise do projeto apresentado pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) em substituição ao Plano Mansueto, de socorro a estados em dificuldades financeiras.

 

Segundo Maia, o texto original tratava de socorro aos estados com situação fiscal negativa e, por isso, não contemplava todos os estados e municípios durante a pandemia.

 

“Eles [o governo] querem um debate de médio e longo prazo. Eu acho que não é o momento”, afirmou Maia.

 

“O Plano Mansueto não olhava os 27 estados. Na crise do coronavírus, nós temos uma crise horizontal, todos os estados estão atingidos. Tivemos que procurar uma solução para atender a todos os 27 estados e a todos os municípios”, acrescentou.

 

O presidente da Câmara disse também que não há votos no plenário da Casa para aprovar medidas que não sejam emergenciais.

 

“O que o governo quer é que o parlamento vote temas que têm relação com o médio e longo prazo. Do meu ponto de vista, não há votos", afirmou.

 

Maia argumentou ainda que, caso o Plano Mansueto fosse votado, as emendas apresentadas pelos governadores "poderiam gerar um dano futuro muito maior" do que a proposta alternativa apresentada nesta quarta.

 

Obstrução de partidos

Além da falta de acordo com o governo, líderes partidários também travaram a votação do Plano Mansueto por discordarem de pontos do texto.

 

Maia afirmou que muitos deputados estão pressionados pelas suas bancadas, que querem incluir na proposta trechos que beneficiam seus próprios estados e municípios.

 

"[Alguns deputados], pressionados pelas suas bancadas, pressionados por municípios, prefeitos, querem alguns outros temas incluídos na proposta", afirmou. "Houve uma mobilização de várias bancadas exatamente para conseguir melhor o texto e introduzir outras ideias".

 

Ainda segundo o presidente da Câmara, a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) também enviou proposta para que as grandes cidades sejam atendidas pelo projeto.

 

Alterações no texto

O presidente da Câmara admitiu possíveis alterações no texto e disse que o "debate está aberto" com o governo para a construção de uma nova proposta até a próxima segunda-feira (13), data em que prevê pautar a proposta no plenário.

 

Pelo texto apresentado nesta semana, o limite para estados e Distrito Federal contratarem operações de crédito com garantia da União seria equivalente a 8% da receita corrente líquida do exercício de 2019.

 

Maia admite flexibilizar este percentual para 4%, por exemplo. Fala ainda em vincular esses recursos a uma futura retomada de obras para ajudar na geração de investimento e recuperação econômica.

 

"Nós estamos abertos a uma proposta. O governo prefere, em vez de três meses [de compensação com arrecadação de impostos], quatro meses? E reduzir ainda mais o espaço de endividamento para que a gente não comprometa o futuro com os empréstimos, como eles dizem? É uma alternativa", disse.

 

"Estamos abertos ao debate. O que nós não estamos abertos é para criar uma zona cinzenta onde nós vamos prejudicar a população de vários estados."Ainda segundo Maia, não se pode "misturar teses" neste momento.

 

"O que queremos é construir, ouvindo a todos, ouvindo líderes, ouvindo governadores, prefeitos, uma solução para que todos possam continuar trabalhando", afirmou.