Gilmar Mendes quer parecer da Procuradoria sobre inquérito de Katia Abreu em investigação com base na delação da Odebrecht
Por Edson Rodrigues
Que Kátia Abreu é um expoente da política tocantinense, ninguém tem dúvida. De deputada á senadora, de ruralista à Ministra da Agricultura, a tocantinense quebrou barreiras e se sobressaiu na política nacional como jamais um político tocantinense havia sequer imaginado.
Pois, justamente essa ascensão meteórica, pode trazer problemas não só para Kátia, como para seu filho, Irajá Abreu, que deve sofrer o desgaste dos respingos de toda e qualquer ação que atinja a senadora, principalmente em plena campanha política para eleições gerais.
Prefeito de Araguaína Ronaldo Dimas e Kátia Abreu , padrinhos e avalistas da candidatura de Irajá Abreu
A entrada na disputa presidencial da mãe do deputado federal Irajá Abreu, parece que abriu o “baú” para que as idiossincrasias da carreira de Kátia venham à tona.
Nem mesmo a faceta de “representante do setor agropecuário” está sendo respeitada.
INQUÉRITO
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu nesta sexta-feira (31) que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste num prazo de cinco dias sobre o pedido de arquivamento de inquérito apresentado pela defesa da senadora Kátia Abreu (PDT-TO), vice na chapa do candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PDT).
A senadora é investigada por ter supostamente recebido para sua campanha ao Senado em 2014 vantagem indevida da Odebrecht, como narram os colaboradores da empreiteira. Segundo eles, a campanha recebeu o valor de R$ 500 mil dividido em dois repasses, ocorridos em setembro e outubro daquele ano.
Gilmar pediu que a PGR responda com urgência, ante “o excesso de prazo na tramitação deste inquérito”. Depois do parecer da procuradoria, o ministro pode decidir sobre o pedido de arquivamento sozinho ou levar o caso para a Segunda Turma da Corte, que compõe junto de Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Edson Fachin.
CARREIRA
Em 2010, a então senadora do DEM pelo Tocantins chegou a ser cotada para integrar, como vice, a chapa de José Serra (PSDB) à Presidência.
Desde então, mudou três vezes de partido: do DEM para o PSD e para o PMDB (hoje MDB), do qual foi expulsa em novembro por ataques à sigla e ao presidente Michel Temer.
Filiou-se ao PDT em abril para disputar o governo do Tocantins numa eleição tampão dois meses depois.
Ficou em quarto lugar, derrota atribuída por muitos à carta de apoio que ela recebeu do ex-presidente Lula, da prisão, durante a campanha.
Mas foi mesmo a posição de Kátia contra o impeachment de Dilma que levou o setor ruralista a romper com ela. Ministra da Agricultura no segundo mandato da petista, ela ficou ao lado da amiga quando a CNA apoiou sua saída.
“O setor não a reconhece mais como liderança. Ela perdeu a oportunidade de ter continuado como uma líder muito importante, não sei a troco de que”, diz Antonio Galvan, presidente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso.
Segundo ele, se Ciro achou que atrairia votos do setor com Kátia como vice, a estratégia não funcionou. “Se ele tinha algum voto, acabou perdendo.”
O vice-presidente da CNA no Mato Grosso, Normando Corral, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do estado (Famato), concorda que, especialmente por ter ficado ao lado de Dilma, Kátia “não tem mais trânsito no setor”.
“Ela entrou num turbilhão em que é difícil voltar às suas origens”, afirma o deputado Marcos Montes (PSD-MG), líder da bancada ruralista no Congresso quando Kátia se tornou ministra de Dilma.
Montes destaca que o problema não foi Kátia ter virado ministra de Dilma, já que, segundo ele, a senadora justificou ter aceito o convite para ser uma ponte entre o setor ruralista e o governo. “Era um argumento até forte”, diz. O que não deu para aceitar, diz, foi ela continuar ao lado da presidente em meio à crise. “Ela aderiu à amizade em detrimento do que o setor precisava.”
Correligionário de Kátia, o deputado Dagoberto Nogueira (PDT-MS), membro da bancada ruralista, foi o único consultado pela reportagem a dizer que a senadora ainda é “muito respeitada no agronegócio”.
A própria Kátia diz hoje que não pretende “ser amada ou idolatrada por nenhum setor”.
“Não preciso de autorização ou documento para defender um setor que é tão importante para o país”, disse à Folha. “Naquela hora, eles [ruralistas] queriam que eu tivesse uma atitude ideológica, que eu abandonasse a Dilma mesmo sem ela merecer."
Para antigos desafetos, como os ambientalistas do Greenpeace, é difícil, no entanto, acreditar que Kátia mudou.
“Ela nunca retirou os projetos de lei dela, nunca deu uma declaração pública dizendo que muda de opinião com relação a agrotóxicos ou à lista do trabalho escravo, por exemplo”, diz Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace.
Um irmão de Kátia, Luiz Alfredo de Abreu, chegou a integrar a lista suja do trabalho escravo do Ministério do Trabalho. O nome foi retirado em outubro, por ordem judicial liminar da Justiça do Trabalho.
A senadora diz que a inclusão de Luiz na lista foi injusta. “Não havia salário atrasado, ninguém declarou que não recebia e ninguém declarou que era escravidão”, afirma.
Psicóloga de formação, Kátia ficou viúva aos 25, quando estava grávida do terceiro filho. Assumiu a fazenda da família em Tocantins e criou sozinha os filhos, Irajá, candidato atual ao Senado, Iratã e Iana, todos nomes indígenas —o que é, inclusive, um de seus argumentos para defender que nunca teve nada contra índios.
Nas redes sociais, mescla fotos dos filhos e netos com ataques a opositores: hoje, preferencialmente, Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, comprometendo a imagem de Irajá diretamente com a sua.
É o capitão reformado que tem hoje grande parte da simpatia dos ruralistas que Kátia perdeu.