A cerca de três meses da data prevista, as eleições municipais ainda têm futuro incerto. Não há entendimento na Câmara para que a proposta, em votação nesta terça-feira (23) no Senado, seja aprovada. Até o momento, apenas deputados da oposição fecharam acordo em torno da proposta de se adiar para novembro as votações em primeiro e segundo turno devido à pandemia de covid-19. O Centrão, bloco informal de partidos de centro e direita com forte influência na Casa, resiste à mudança no calendário
Por Flávia Said e Edson Sardinha
Na avaliação de líderes ouvidos pelo Congresso em Foco, a proposta pode acabar não prosperando na Câmara, mesmo que o Senado aprove o texto. A Casa é considerada mais suscetível à pressão de vereadores e prefeitos, importantes cabos eleitorais dos deputados. Nesse caso, o adiamento da eleição para 2021 ou até mesmo para 2022, em uma disputa unificada com as eleições gerais, como defendem alguns parlamentares, poderia trazer dividendos eleitorais futuros.
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“Acho que o Senado vai aprovar o adiamento, mas a Câmara, não. Portanto, acho que a data será mantida”, disse o deputado Marcelo Ramos (AM), vice-líder do PL, que reúne 43 deputados. Para o vice-líder da segunda maior bancada da Câmara, deputado Junior Bozzella (PSL-SP), o adiamento das datas do primeiro e do segundo turno não está ecoando de forma unânime na Casa.“Eu particularmente entendo que a manutenção talvez fosse o caminho mais sensato, pois ainda é muito incerto o futuro da pandemia. Não temos como cravar que em novembro teremos mais ou menos casos, são apenas hipóteses, nada de concreto”, afirmou Bozzella.
A PEC será votada nesta terça (23) pelo Plenário do Senado, onde há um consenso mínimo e interlocução forte com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O relator, senador Weverton (PDT-MA), propôs em seu substitutivo que o primeiro e o segundo turno sejam realizados em 15 e 29 de novembro, respectivamente. Um dispositivo do texto permite a realização de um turno suplementar em estados e municípios muito afetados pela pandemia até 27 de dezembro de 2020, conforme adiantou ontem o Congresso em Foco.
A proposta começou a tramitar no Senado porque, naquela Casa, há um entendimento maior em torno da matéria. Na Câmara, há uma fragmentação maior e as próprias bancadas podem acabar não votando em conjunto.
Integrantes do Centrão, Republicanos, PL e PP, por exemplo, defendem que não se adie a eleição. O MDB deve liberar a bancada e no PSL ainda há divisão de posicionamento. Até agora, os partidos de oposição – PT, Psol, PCdoB, PV, PDT e PSB – são os únicos que já fecharam questão pelo adiamento. Na Câmara, para aprovação de uma mudança constitucional, é necessário um quórum elevado de 308 deputados em dois turnos de votação.
O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já se colocou favorável ao adiamento da disputa para novembro. Para ele, não faz sentido que o Congresso esteja liberando dinheiro e votando matérias de enfrentamento à pandemia para, em outubro, desconhecer essa situação de calamidade.
Prorrogação de mandatos
Outro debate que se impõe é o de prorrogação dos mandatos, conforme defendido pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Em sessão de debates no Senado ontem (22), o presidente da CNM, Glademir Aroldi, afirmou que não há como realizar as eleições municipais neste ano.
Aroldi ressaltou que há muitos candidatos em grupo de risco da covid-19 que ficarão expostos ao vírus durante a campanha e concorrerão em condições desiguais com os demais adversários. “Entendemos que o Brasil não reúne as condições sanitárias, econômicas, sociais e jurídicas para a realização de um pleito neste ano”, disse o presidente da CNM, que reúne prefeitos de municípios médios e pequenos.
São contrários a essa tese os presidentes da Câmara, do Senado e do TSE, ministro Luís Roberto Barroso. O presidente da Corte eleitoral defende um adiamento que permita que as eleições se realizem ainda este ano. A interpretação de Barroso é de que a prorrogação daria início a um terceiro mandato, o que é vedado pela Constituição. Prefeitos e vereadores são eleitos por quatro anos e só podem se reeleger uma única vez. Segundo Barroso, cerca de 20% dos prefeitos já estão encerrando o segundo mandato.
O presidente da CNM, porém, alega que não haveria violação de cláusulas pétreas da Constituição. Ele defendeu que a prorrogação excepcional da validade dos atuais mandatos pode preservar a vida de milhões de pessoas.
Para o líder do Podemos, deputado Léo Moraes (RO), a prorrogação de mandatos é um “golpe branco” e um “atentado à democracia”. “Sabemos que existem grupos do Centrão que defendem a unificação das eleições em 2022. Vamos trabalhar para barrar isso”, disse o líder.
O adiamento leva em conta a previsão, feita por epidemiologistas e outros especialistas, de que em agosto e setembro a curva da pandemia começará a descer no Brasil. Adiar por algumas semanas permitiria redução a um nível de segurança.