Defesa quer usar material para tentar anular processos aos quais ex-presidente responde na Justiça. Operação Spoofing prendeu hackers que invadiram celulares de membros da Lava Jato
Com Equipe do BR Político
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta tarde de terça, 9, contra o pedido da força-tarefa da Lava Jato para anular o compartilhamento de mensagens obtidas pela Operação Spoofing com a defesa do ex-presidente de Lula.
Votaram contra: o relator Ricardo Lewandowski, Kassio Marques, Cármen Lúcia. A favor, Edson Fachin. No momento, o ministro Gilmar Mendes encaminha seu voto contra o recurso do Ministério Público Federal.
A Operação Spoofing apreendeu conversas hackeadas por um grupo processado pela invasão dos celulares de diversas autoridades, incluindo o ex-ministro Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa da Lava Jato. A defesa de Moro alega que as mensagens foram obtidas de forma ilícita. Já Lula pretende provar a suspeição do ex-magistrado nos processos da Lava Jato.
Ex-presidente Lula (PT)
Em mensagem trocada em 23 de novembro de 2017, a procuradora Jerusa Viecili, ex-integrante da Lava Jato em Curitiba, diz ao colega Januário Paulo que ‘no CPP de russo, tudo pode’, em uma alusão ao Código de Processo Penal ‘criado’ pelo então juiz Sérgio Moro, afirma a defesa de Lula.
Interferência em acordos de colaboração com Palocci e Léo Pinheiro
Há trechos em que o ex-coordenador da força-tarefa Deltan Dallagnol sugere que o então juiz se envolvia na celebração de acordos de colaboração premiada, incluindo aqueles firmados com o ex-ministro dos governos petistas, Antônio Palocci, e com ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro.
“Após analisarmos Palocci, temos que falar pro Moro, que não vai querer a pena aliviada num caso dele sem justificativa e tem ponte com TRF”, escreve Deltan no dia 3 de maio de 2018. “Segundo a Laura, o Moro quer um acordo com o Palocci pela mesma razão do Leo Pinheiro”, acrescenta.
Em outra mensagem, trocada em 30 de agosto de 3018, a procuradora Jerusa Viecili é questionada, a pedido de Moro, sobre o andamento do acordo com Léo Pinheiro. “Olá, evoluiu o acordo do Leo Pinheiro? PGR esta andando com isso? Russo perguntando”.
Escolha de procuradores em audiência e pedido para apagar mensagens
Em 13 de maio de 2017, Deltan pergunta a um colega, não identificado no documento, se também havia recebido mensagem de Moro sobre uma audiência a ser realizada.
“Não comenta com ninguém e me assegura que teu telegram não tá aberto aí no computador e que outras pessoas não estão vendo por aí, que falo. Você vai entender por que estou pedindo isso”, escreveu o procurador. “Depois, apagamos o conteúdo”, acrescenta.
Ao receber a confirmação do colega, Deltan transfere mensagem atribuída a Moro: “Prezado, a colega Laura Tessler de vocês é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem.”
Em seguida, o então coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba diz: “No do Lula não podemos deixar acontecer.”
Consultas a Moro e sugestões do ex-juiz em processos em tribunais superiores
Em uma série de mensagens, os procuradores afirmam ter conversado com o então juiz da Lava Jato sobre questões estratégicas das investigações – o momento mais oportuno para propor uma denúncia e a viabilidade de pedidos de acesso a informações relacionadas a processos no exterior, por exemplo.
Em 4 de julho de 2018, uma mensagem indica que Moro também palpitava em ações em tramitações em tribunais superiores. “O Russo sugere a operação no início de agosto em virtude da assunção de um novo presidente do STF durante as férias”, diz a mensagem.
“Beleza. Se ele quer assim, não me oponho”, responde a procuradora Laura Tessler.
Trocas com o FBI
Na origem, a defesa do ex-presidente acionou o STF para obter acesso à documentação relacionada ao acordo de leniência da Odebrecht – usada no processo em que o petista é acusado pela Lava Jato de receber R$ 12 milhões em propinas da construtora na compra do terreno em São Paulo para sediar o Instituto Lula. Depois é que os advogados solicitaram o compartilhamento do acervo da Operação Spoofing.
Entre as mensagens periciadas nesta etapa e destacadas pelos advogados do ex-presidente, há conversas que sugerem a existência de documentos envolvendo trocas com a Embaixada dos Estados Unidos, FBI, autoridades da Suíça e outras agências estrangeiras que teriam sido omitidos pela força-tarefa, segundo a defesa de Lula.
O impasse envolvendo o acordo com a construtora se alonga desde 2017, quando os advogados do ex-presidente começaram a entrar com sucessivos pedidos para ler toda a documentação. Desde então, a defesa sustenta que a íntegra não foi disponibilizada e acusa o juiz Luiz Antonio Bonat e os procuradores da Lava Jato de esconderem documentos. As acusações levaram Lewandowski a pedir a abertura de uma apuração na Corregedoria do Ministério Público Federal para saber se os registros estão sendo de fato ‘suprimidos’.