Da Coluna Notas & Informações / Estadão
Durante a reunião semanal com os líderes dos partidos, ocorrida no dia 16 passado, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que poderá dar andamento ao que já está sendo chamado pelos corredores da Casa de “pacote da vingança”. Nessa sacola de maldades, digamos assim, estaria a instalação de nada menos que cinco das oito Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) requeridas à Mesa Diretora, além de outras medidas legislativas. O alvo principal da desforra é o Poder Judiciário, particularmente o Supremo Tribunal Federal (STF), mas não é improvável que o Palácio do Planalto também seja colhido pela sanha revanchista do sr. Lira. Seja como for, a grande vítima dessa bagunça institucional que parece ter tomado conta do País, como sói acontecer, será a sociedade.
É preciso ter claro que tudo isso faz parte de uma estratégia do presidente da Câmara para dar vazão a seu desejo incontido de influenciar a escolha de seu sucessor e, desse modo, manter algum tipo de protagonismo político mesmo após “descer à planície” – como se diz em Brasília dos presidentes da Câmara que, terminado o mandato, voltam a ser apenas mais um entre os 513 deputados. Comportando-se dessa forma, Lira revela que não vê problema algum em submeter o interesse público a seus caprichos.
A bem da verdade, não é a primeira vez que o sr. Lira coloca o País sob seu tacão, mas decerto será uma das últimas. Afinal, está cada dia mais próximo o fim de seu mandato à frente da Câmara, razão pela qual todo cuidado é pouco. Na condição de influente líder político que vê seu poder escorrer pelas mãos sob a pressão do tempo, não são triviais os danos que o deputado alagoano pode causar ao País se, imbuído desse espírito revanchista, usar o poder que lhe resta para levar a cabo sua vendeta contra o STF e, de quebra, fustigar o governo Lula da Silva.
Tudo leva a crer que assim será. O que se discute na Câmara neste momento é apenas a ordem de instalação das CPIs. Umas das primeiras, se não a primeira, será a CPI para investigar a suposta “violação de direitos e garantias fundamentais”, além da “prática de condutas arbitrárias” e “abuso de autoridade” por parte de ministros do Supremo e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As outras CPIs que estão em vias de serem instaladas atendem direta ou indiretamente aos interesses da oposição – a forma nada sutil que Lira encontrou para “dar recados” ao governo em meio às suas rusgas particulares com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, entre outros motivos inconfessáveis.
Convém registrar que, a rigor, a instalação dessas CPIs – como quaisquer outros atos legislativos – não é algo essencialmente errado caso estejam presentes os requisitos constitucionais e regimentais para isso, como de resto parecem estar. O problema são os fins a que se prestariam essas ações do presidente da Câmara. Parece claro que, antes do interesse de investigar o que quer que seja, está o interesse de Lira de, a um só tempo, turvar o debate público em pleno ano eleitoral e travar o andamento da pauta legislativa, incluindo projetos de interesse do governo por seus supostos desdobramentos na seara econômica. Ora, se é isso o que normalmente acontece quando há apenas uma CPI em andamento, que dirá com cinco CPIs simultâneas e potencialmente tumultuadas, haja vista seus possíveis reflexos em outros Poderes e na opinião pública.
O País poderia estar apenas assistindo ao jogo jogado da política, o que de resto seria rigorosamente legítimo. Só não é porque, como dissemos, as intenções subjacentes a essa articulação conduzida pelo presidente da Câmara em fim de mandato passam muito longe do melhor interesse público. Ao fim e ao cabo, pode ser que Lira não consiga realizar o que deseja. É lícito inferir que tudo não passe mesmo de “recados”, uma encenação de poder sem uma correspondente materialização de atos hostis. O busílis é que essa “guerra fria” entre os Poderes não gera nada de bom para o País.