Líder do governo na Câmara e relator do Orçamento criticam a Corte e dizem que Judiciário interfere em papéis do Congresso
Por Lauriberto Pompeu
Deputados da base de sustentação do governo de Jair Bolsonaro criticaram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de barrar o orçamento secreto e disseram que a harmonia entre os Poderes está ameaçada. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR), classificou o julgamento como "expressão do ativismo político do Poder Judiciário" e não poupou ataques à Corte.
"Já fui relator do orçamento, sou autor da resolução 1/2016 que regulamenta a tramitação de todas as matérias orçamentárias no Congresso Nacional. A decisão do STF sobre as emendas de relator é mais uma expressão do ativismo político do Poder Judiciário. Harmonia entre os Poderes?", ironizou Barros nas redes sociais.
Nesta terça-feira, 9, o Supremo formou maioria para barrar as emendas de relator (RP9). A modalidade serviu de base para o 'orçamento secreto', usado pelo governo Bolsonaro para transferir recursos a congressistas aliados em troca de apoio no Legislativo. O esquema foi revelado em maio pelo Estadão e chamado também de "tratoraço", por envolver a compra superfaturada de equipamentos agrícolas.
A emenda é incluída pelo relator-geral na Lei Orçamentária Anual (LOA), mas a distribuição das verbas é negociada internamente com deputados e senadores. A informação de qual congressista indicou qual recurso não é pública. Na decisão que suspendeu temporariamente as emendas de relator, a ministra Rosa Weber também determinou que sejam divulgadas as informações sobre o padrinho de cada indicação de repasse feito em 2020 e neste ano. A manutenção do entendimento da ministra corrói o poder do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). Líder do Centrão, Lira e o governo usam as emendas de relator para obter maioria nas votações da Câmara.
O relator-geral do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), não escondeu, por sua vez, que se sente desprestigiado com a mudança no modo como as emendas são liberadas.
"Orçamento quem vota, quem discute, somos nós, parlamentares; nós, deputados, nós, senadores. Ao abrir mão dessa prerrogativa, a cada momento que nós deixamos isso, a cada momento que nós não fazemos o nosso papel, alguém vem e vai substituir", discursou Leal no plenário da Câmara logo após a maioria do STF decidir suspender os repasses do orçamento secreto.
Leal disse, ainda, que os parlamentares não deveriam se "acovardar" diante da decisão do Judiciário. "Não existe espaço vazio dentro do ambiente político. Se nós nos acovardamos e deixamos que isso aconteça, cada vez mais estamos deixando de falar sobre a lei mais importante desse Congresso Nacional, que é o Orçamento", afirmou.
Mesmo assim, o relator observou que a decisão do STF não deve afetar a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios, que adia o pagamento de dívidas reconhecidas pela Justiça e muda a regra do teto de gastos. O Executivo tenta aprovar a proposta em segundo turno sob o argumento de que isso é necessário para tirar do papel o Auxílio Brasil, programa social que reformula o Bolsa Família.
O líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), comemorou o resultado do julgamento do Supremo e disse que "representa uma importantíssima vitória da democracia, da República, da transparência e do bom uso do dinheiro público".
Molon afirmou que a partir do entendimento adotado pelo Supremo, o Executivo terá de demonstrar a importância do texto para que ele seja aprovado pela Câmara. Algo que, segundo ele, não acontecia antes.
"A partir daqui, se o governo quiser aprovar alguma proposta, vai ter de discutir o mérito dela, ou seja, se ela é boa ou ruim para o País, e não o valor das emendas que está disposto a distribuir entre a sua base", observou o deputado.
Como mostrou o Estadão, a cúpula do Congresso avalia uma estratégia para manter o orçamento secreto mesmo com o fim das emendas de relator. A ideia seria manejar os recursos para congressistas aliados do governo por meio das emendas RP8, as de bancada, que também não têm transparência e não deixam público qual parlamentar indicou qual verba.